São Paulo, quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

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Ciclo mostra a força plural do cinema brasileiro

Cinemateca e CCBB exibem raridades nacionais, como filmes de José Agrippino de Paula e Alberto Cavalcanti

Também são mostrados longas de cineastas mais conhecidos, como "Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia", de Hector Babenco

Acervo Cinemateca Brasileira
Cena de "Simão, o Caolho', de Alberto Cavalcanti, que passará hoje e em mais duas sessões


JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Os cinéfilos têm pelo menos um bom motivo para não abandonar a Paulicéia nesta virada de ano: a mostra Clássicos e Raros do Nosso Cinema, que vai de hoje a 20 de janeiro na Sala Cinemateca e no Centro Cultural Banco do Brasil.
Entre os 24 filmes programados há clássicos que sempre vale a pena rever, como "O Grande Momento" (Roberto Santos, 1958), "Os Cafajestes" (Ruy Guerra, 1962) e "O Bandido da Luz Vermelha" (Rogério Sganzerla, 1968), mas também preciosidades mais raras, como "Simão, o Caolho" (Alberto Cavalcanti, 1952), "Bang Bang" (Andrea Tonacci, 1971) e "Hitler 3º Mundo" (José Agrippino de Paula, 1968).
O filme de Cavalcanti, o primeiro que ele fazia no Brasil depois de participar das vanguardas francesa e inglesa, é uma delirante comédia social, que se passa quase totalmente dentro de um sonho.
O caolho Simão do título é um corretor de investimentos acossado por credores, amigos turbulentos e uma esposa chata. Um dia ele consegue um olho postiço que tem o condão de torná-lo invisível.
"Bang Bang", experiência cinematográfica radical de Tonacci, tem uma narrativa impossível de resumir.
Em torno de um bárbaro urbano (Paulo César Pereio), movido pela lei do desejo, sucedem-se as trapalhadas de uma quadrilha absurda, que inclui um bandido cego, surdo e mudo e outro que é mãe de todos do inusual grupo.
A iconografia dos quadrinhos, do policial americano e dos "road movies" é retrabalhada com um notável frescor juvenil por um cineasta singular, que acaba de voltar à ativa com o extraordinário "Serras da Desordem".

"Udigrúdi"
Outro marco do "underground" brasileiro -também chamado de "udigrúdi"- é "Hitler 3º Mundo", único longa-metragem do escritor José Agrippino de Paula, que influenciou Caetano Veloso e meio mundo com o livro "Panamérica", de 1967.
No filme, rodado clandestinamente e de forma fragmentária no auge da ditadura militar, um samurai erra por uma caótica São Paulo dominada pelos nazistas. No elenco heterogêneo, Jô Soares, Eugênio Kusnet e Ruth Escobar.
Há ainda exemplares do "terrir" de Ivan Cardoso ("As Sete Vampiras", de 1986, que o próprio diretor define como "chanchada hitchcockiana") e do experimentalismo erudito-popular de Julio Bressane ("Memórias de um Estrangulador de Louras", 1971).
Outras atrações, para quem gosta de cinema de invenção e risco, são "A Herança" (1970), adaptação de "Hamlet" pelo marginal dos marginais Ozualdo Candeias, e "Jardim de Guerra" (1968), filme de estréia de Neville d" Almeida, em que um jovem (Joel Barcellos) vive concentradamente todas as experiências amorosas, políticas e existenciais de uma época em convulsão.
No extremo oposto, de uma narrativa mais clássica e de grande impacto junto ao público, há "Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia" (1976), primeiro sucesso de bilheteria de Hector Babenco.
Sobrou espaço para destacar "Ladrões de Cinema" (1977), comédia "sui generis" de Fernando Coni Campos, na qual uma quadrilha de malandros rouba durante o Carnaval carioca o equipamento de filmagem de documentaristas norte-americanos e resolve fazer com ele um filme histórico.
Enfim, tem de tudo e é tudo (ou quase) muito bom.

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