São Paulo, terça-feira, 27 de janeiro de 2004

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DANÇA

Formação sólida abre espaço para espírito inovador

INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA

Em meio às comemorações de 450 anos de São Paulo, é impossível não lembrar do histórico Balé do IV Centenário, que fomentou criadores até hoje em atuação. Para 2004, não foi encomendada obra nova, mas o Sesc Vila Mariana sediou um pequeno festival com três grandes companhias. O Ballet Stagium, o Balé da Cidade de São Paulo e o Cisne Negro dividiram a noite com criadores independentes -Gícia Amorim, Cristian Duarte, Deborah Furquim e Ângela Nolf, Jorge Garcia e Marcelo Bucoff.
Sexta passada foi o momento de rever coreografias que marcaram época: "Kuarup" e "Batucada". Desde 1971, o Stagium pratica formas de engajamento com a sociedade através da dança, seja nos trabalhos da companhia, seja em projetos comunitários. A dupla atividade continua viva: o grupo comemorou os 450 anos da cidade à frente também do 5º Encontro de Dança de Rua, que ocorreu domingo na Febem Tatuapé, com a participação de 200 adolescentes de 13 unidades.
"Kuarup, ou a Questão do Índio" (1977) foi resultado de uma visita do grupo ao Xingu. No início, bailarinos de macacões verdes e amarelos, descalços, dançam movimentos simples e ritmados. Alusões ao Kuarup (a cerimônia dos mortos) enriquecem os figurinos - com os macacões substituídos por roupas indígenas - e ganham dimensão dramática no encerramento do culto à vida: a morte, um por um, dos índios que avançam em grupo para a frente fechando o ciclo inicial.
"Batucada" (1977) marca o trânsito de linguagens: do samba no pé, passa pelos maiores virtuosismos da técnica clássica, ao lado de requebros e molejos, também vista no 5º Encontro de Dança de Rua. Só quem já viu uma apresentação dessas tem noção do papel que a dança pode ter quando a crença na vida está por um fio. A noite de sexta se iniciou com "Fios de Marionete", de Amorim. Uma dança articulada, sensual e suave, que dialoga com a luz de André Boll, rica de sombras.
Formação sólida, a serviço da inovação pessoal, num horizonte brasileiro: algo bem no espírito do Stagium, que serviu tacitamente de lição para abrir a temporada de dança -tão pouco reconhecida nos festejos oficiais da cidade.


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