São Paulo, terça-feira, 27 de abril de 2010

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Crítica/ "Utopia e Barbárie"

Ritmo frenético prejudica documentário

Divulgação
Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir em cena do filme

ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O desalento que Silvio Tendler sentiu depois das eleições de 1989, em que Fernando Collor saiu vencedor, foi o ponto de partida para "Utopia e Barbárie". O documentário repassa os fatos políticos e econômicos mais marcantes desde a Segunda Guerra Mundial, sempre à luz da oposição utopia/barbárie.
Um projeto muito ambicioso para duas horas de filme. Durante 19 anos, Tendler foi a 15 países e gravou mais de 400 horas de entrevistas com dezenas de intelectuais, testemunhas e protagonistas desses acontecimentos emblemáticos.
Dentre eles estão Susan Sontag, Eduardo Galeano, Augusto Boal, Ferreira Gullar, Denys Arcand, Amos Gitai, Jacob Gorender, Gillo Pontecorvo, Franklin Martins e o general Vo Nguyen Giap (herói da Guerra do Vietnã). Os fatos são apresentados por imagens de arquivo, entrevistas e vozes narradoras em que o cineasta apresenta suas ideias.
Sucedem-se o Holocausto, as bombas atômicas lançadas sobre o Japão, a Guerra do Vietnã, a Revolução Cubana, o golpe de 1964, a luta dos negros americanos, o vendaval de protestos de 1968, a queda de Salvador Allende, a repressão à guerrilha no Brasil, a campanha das Diretas-Já, o advento do neoliberalismo nos EUA e na Europa, o massacre da praça da Paz Celestial, a queda do Muro de Berlim, a ascensão e a derrocada de Collor, a eleição de Lula, os movimentos antiglobalização, a atual crise econômica, a eleição de Obama. A lista é incompleta.
O maior problema não é o tom às vezes panfletário da apresentação deste ou daquele tema nem a narração em primeira pessoa, que confere um tom demasiado pessoal a tudo: o ponto fraco é a rapidez com que os fatos são apresentados.
Esboça-se uma visão panorâmica das últimas seis décadas, mas nada é aprofundado. A questão da utopia e da barbárie mereceria muito mais atenção. A melhor ideia sobre o tema é lançada por Jacob Gorender: "A utopia pode levar a desastres", ou seja, à barbárie.
Outros bons momentos são algumas reflexões lúcidas de Ferreira Gullar, Susan Sontag e Eduardo Galeano. Gullar lembra do papel das divisões das esquerdas na queda de Allende.
Sontag diz que os militares americanos não perceberam o poder das imagens da Guerra do Vietnã e demoraram a restringir o trabalho dos fotógrafos. Galeano alerta para a diferença entre a temporalidade da história e a do ser humano: a história tem seu próprio ritmo, alheio ao de nossas vidas. A atual crise das utopias também é abordada de raspão.
Tendler aponta que a utopia de hoje é "salvar o planeta". Utopia ou consenso? Afinal, o termo sustentabilidade virou uma espécie de mantra, está no discurso dos críticos do sistema e no de seus arautos, que perceberam o lucrativo potencial do respeito à natureza.


UTOPIA E BARBÁRIE

Direção: Silvio Tendler
Produção: Brasil, 2009
Onde: Cine Bombril e Espaço Unibanco
Classificação: livre
Avaliação: regular




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