São Paulo, quarta-feira, 28 de outubro de 2009

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Crítica/ "Till, a Saga de um Herói Torto"

Peça consagra a arte de narrar de Luiz Alberto de Abreu

Texto do dramaturgo marca reencontro do grupo Galpão com sua melhor fase

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

As grandes narrativas não morrem e o dramaturgo ainda é quem funda o teatro. Pelo menos quando se evoque uma lenda de 700 anos e se trate de um autor com a bagagem de Luiz Alberto de Abreu. É sobre esses pilares, e com o carisma do grupo Galpão, que se ergue a peça "Till, a Saga de um Herói Torto".
O espetáculo foi projetado para apresentações ao ar livre, em grandes espaços públicos. Não é exatamente uma dinâmica de "teatro de rua", já que se arma uma relação frontal entre um palco maquinado com alçapões e recursos de luz e uma plateia acomodada. Mas isso não diminui em nada o brilho desse retorno do Galpão à comédia popular.
O primeiro e mais decisivo trunfo é a dramaturgia de Abreu. Próximo de completar 30 anos de trabalho continuado, com dezenas de peças escritas e alguns roteiros para cinema e televisão, ele se destaca solitário como o mais prolífico e encenado dos autores de sua geração.
No caso de "Till, a Saga de um Herói Torto", foi escrita em 1999, como uma das partes de trilogia em torno do folclore da cultura europeia. Till é uma figura lendária que surge no início do século 14, na atual Alemanha, e se firma no velho continente através de uma coleção de pequenos episódios sobre as suas estripulias e genialidade na arte de enganar os outros.
Abreu se apropria do mito reforçando o seu caráter de agente intermediário entre mundo medieval e período renascentista. Assim, a tríade de cegos que faz as cenas de contraponto às aventuras de Till debate se o mundo será sempre como é ou se poderá mudar. Esse tratamento cristalino de questões complexas aproxima o dramaturgo de Brecht, mas não trai o próprio espírito das moralidades medievais.
Diante dessa, ao mesmo tempo, sofisticada e popularíssima estrutura dramática, o Galpão se reencontra com a melhor fase de sua produção, em que se combinavam um tratamento despojado da cena com uma técnica refinada de interpretação. Os atores parecem à vontade nos tipos marcados que constroem e, na tradição do teatro épico, atuam como narradores e agentes da saga.
Um destaque inevitável é Inês Peixoto, que desempenha com desenvoltura o personagem central, imprimindo-lhe uma leveza e graça femininas, mas sem prejuízo das facetas demoníaca e escatológica. O cenário e figurinos de Márcio Medina também colaboram na combinação vitoriosa de simplicidade e intensidade. É um espetáculo para todos os públicos e que consagra um autor apaixonado pela arte de narrar.


TILL, A SAGA DE UM HERÓI TORTO

Quando: sábado (31/10) e domingo (1º/11), às 20h
Onde: Parque da Independência (av. Nazareth, s/nº)
Quanto: entrada franca
Classificação: 16 anos
Avaliação: ótimo




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