São Paulo, sábado, 29 de agosto de 2009

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Crítica/teatro/"A Falecida Vapt-Vupt"

Antunes Filho arrisca com linguagem veloz

Montagem de Nelson Rodrigues sublinha música do texto

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Bruna Anauate faz Zulmira; Lee Thalor
interpreta Tuninho


LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

"A Falecida Vapt-Vupt" do CPT de Antunes Filho quer dialogar com a superposição de planos e a simultaneidade de registros operada pela videoarte. Essa disposição ao risco valoriza o projeto, mas não garante o seu êxito.
Quando Antunes enfrentou a primeira vez "A Falecida", de Nelson Rodrigues, seu diálogo era com o encenador japonês Tadashi Suzuki. Em "Paraíso Zona Norte", os atores, descalços, oscilavam como pêndulos entre a leveza e a gravidade dos corpos. O texto de Nelson Rodrigues, ali, aparecia subtraído pela encenação.
Vinte anos depois, ironicamente, as falas dos personagens rodrigueanos ressaltam sobre a cena como verdadeiros poemas dramáticos, a evocar a grandeza de um Shakespeare brasileiro. O milagre se opera graças à opção do encenador de criar um pano de fundo ruidoso, com a ambiência de um boteco e de seus habituais frequentadores em constante burburinho, em que sobressaem os personagens da peça e suas vozes avolumadas por um timbre agudizado.
A estratégia tem o dom de provocar, inicialmente, um estranhamento e um incômodo com aquele embaralhar de sons e imagens. Logo, compreende-se que a ação da peça e seus protagonistas correrão por entre aquelas mesas e aqueles personagens paisagem, estáticos em seus movimentos naturais.
Entrando-se no jogo proposto, chega a haver o encantamento com as características musicais que a textualidade de Nelson Rodrigues sublinhada pode alcançar.
Mas logo se torna claro que esse estado excepcional obtido permanecerá inalterado e seu efeito tende a se esgotar como fogo de artifício.
Há que reconhecer que a experiência proposta só se torna possível por conta da qualidade do trabalho vocal dos atores que Antunes prepara, bem como pelo ritmo que o elenco obtém na velocidade com que tudo é realizado. O destaque é para a Zulmira criada por Bruna Anauate, que além do registro de voz tonificado encarna com brilho o patético da morta autoproclamada. Lee Thalor, como Tuninho, o marido vascaíno, revela maturidade e técnica e Marcos Andrade, como o agente funerário Timbira, cumpre uma interpretação inventiva.
O desejo de sintonizar as velozes relações humanas e seus sucedâneos nas linguagens eletrônicas da vida contemporânea esbarrou na economia de fôlego transgressivo.
Se o pano de fundo não fosse apenas um ruído estático com que o espectador se familiariza e de quem, ao final, se esquece, e implicasse em um jogo dinâmico de justaposição com a trama da peça e os desempenhos que a conduzem, talvez, além de um Nelson musical, Antunes tivesse encontrado um teatro com ares de videoarte.


A FALECIDA VAPT-VUPT

Quando: sex., às 21h, e sáb., às 19h e 21h; até 12/12
Onde: Sesc Consolação (r. Dr. Vila Nova, 245, tel. 3234-3000)
Quanto: de R$ 2,50 a R$ 10
Classificação: não recomendado para menores de 12 anos
Avaliação: bom




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