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ENTREVISTA / DAVID SAMUELS
Voto a congressistas não aumenta com aprovação de emendas
Estudioso afirma que há "correlação grande" entre sucesso de fazer emendas e conquista de doações
FERNANDO BARROS DE MELO
DA REDAÇÃO
O cientista político David Samuels, da Universidade de Minnesota, diz que, ao contrário do que pensam os parlamentares, não há uma correlação direta entre emendas ao Orçamento e o número de votos -uma crença alimentada pelo Executivo para barganhar apoio.
Samuels observa, porém, que
as emendas aumentam as doações de campanha -fato constatado igualmente por economistas e cientistas políticos
brasileiros.
Mas, segundo ele, o aumento na
arrecadação dos políticos que
fazem emendas não é, por si só,
um problema. "O problema não
é mais a questão do caixa 1 no
Brasil. É o crescente caixa 2."
Especialista em eleições no
Brasil, Samuels destaca o encarecimento das campanhas brasileiras, não apenas para cargos
do Executivo: "Os deputados
gastam com o quê nas campanhas? Transporte, diárias para
pessoas trabalhando, pagamento de papel impresso,
showmício etc. Mas as eleições
são tão custosas no Brasil porque há muita competição".
Samuels publicou "From Socialism to Social Democracy?
The Evolution of the Workers"
Party in Brazil" (do socialismo
à social-democracia? A evolução da festa dos trabalhadores
no Brasil, 2004) e Ambition,
Federalism, and Legislative Politics in Brazil (ambição, federalismo e políticas legislativas
no Brasil, 2003), entre outros.
Leia a seguir trechos da entrevista, feita por telefone:
FOLHA - O senhor faz pesquisas
discutindo a relação entre emendas
parlamentares e eleições no Brasil.
Que relação é essa?
DAVID SAMUELS - Eu discordo
que exista uma relação entre
conseguir uma execução de
emenda e a probabilidade de
ser eleito. Acho que existe uma
crença entre os deputados e senadores que, se você pelo menos não tentar colocar emendas no Orçamento, você vai sofrer nas eleições seguintes.
FOLHA - Os deputados sabem que
a emenda não influencia no voto?
SAMUELS - Certa vez, um parlamentar me disse: "O que vai
afetar a vida do meu eleitorado
é construir uma ponte, hospitais e escolas. Mas o que posso
fazer com R$ 1 milhão?"
As emendas são pequenas,
ajudam a furar um poço, a
construir um posto de saúde.
Isso vale, claro, mas vale na
margem. Mas o deputado quer
concretizar projetos maiores e
precisa trabalhar com outros
deputados, prefeitos, governadores e ministros. A gente presta atenção nas emendas, mas
são poucas emendas que realmente vão ter efeito.
FOLHA - E as emendas coletivas?
SAMUELS - Os valores das
emendas coletivas são muito
maiores. Mas o dado político
importante é que um deputado
ou até um senador não consegue dizer: "Fui eu que consegui
essa emenda coletiva". Ele tem
que dizer "somos nós, a gente
conseguiu".
Ele precisa se ajeitar, ter um
time, um grupo, que nem precisa ser o partido. Isso é o jeito
brasileiro, trabalhar juntamente com prefeitos, governadores.
Minha conclusão é que as
emendas individuais não têm
grande efeito político. Têm algum efeito.
FOLHA - Por que há tanta briga por
emendas?
SAMUELS - Quem não corre
atrás acha que vai sofrer. E
também existem incentivos do
Executivo: "Se você não quer
brincar com a gente, a gente fecha a torneira". É mais fácil dizer que ele conseguiu a emenda
individual. As emendas coletivas têm mais valor para o político que tem mais visão de longo
prazo e consegue trabalhar
com prefeitos.
Eu acho que o deputado chega em Brasília e tem 500 outros
deputados. Ele pensa que não
vai conseguir nada ali. "Não vou
mudar o mundo", pensa. E por
isso tenta voltar ao Executivo.
É o Executivo no Brasil que tem
a grande influência na política
orçamentária e muda as políticas públicas.
FOLHA - É preciso acabar com
emendas individuais?
SAMUELS - Isso poderia diminuir um pouco a corrupção,
mas você acha escândalos em
cada parte dos governos. Nos
Estados Unidos, há um pouco
de emenda individual, mas o
problema aqui é a falta de controle no Executivo. Há diferenças em cada país.
No Brasil, com partidos fracos e desorganizados, o partido
não leva recursos para o eleitorado, é o político individual e há
casos de corrupção nas emendas. Isso é um desperdício óbvio de dinheiro, mas comparativamente não tão grande. O
problema é que é difícil reformular o conceito de representação política no Brasil. É tradicional que seja personalizado
no deputado.
FOLHA - Há relação entre emendas
e doações?
SAMUELS - Eu achei uma correlação grande entre sucesso de
fazer emendas e doação, principalmente das empreiteiras.
Mas não existe uma questão de
troca de favores diretos. Pode
até existir, mas não estou alegando isso. Um deputado que
mostra serviço vai conseguir
doações, e isso é legal.
Se existe transparência, se os
eleitores podem julgar os doadores, não acho realmente um
problema.
O problema não é mais a
questão do caixa 1 no Brasil. É o
crescente caixa 2. O problema
está na facilidade das empresas
de não colocar na prestação de
contas. Isso ocorre em todo o
mundo e não é somente um
problema no mundo político.
FOLHA - Por que as campanhas são
tão caras no Brasil?
SAMUELS - Os deputados gastam em quê? Transporte, diárias para pessoas trabalhando,
pagando papel impresso, um
showmício, impressão de camisetas. As eleições são tão custosas no Brasil porque tem muita
competição. E por que tem tanta competição? Porque existem
muitos candidatos em cada Estado. O problema é que no Brasil tem a ver com a questão da
reforma política. Precisava diminuir o tamanho dos distritos.
Em São Paulo, há centenas
de candidatos para deputado
federal. O eleitor fica confuso.
As eleições são caras mesmo no
Brasil. E são caras porque existe muita competição e os partidos são fracos.
O que vale é a figura individual. Partido com imagem forte
não precisa de tanto dinheiro.
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