São Paulo, quinta-feira, 01 de abril de 2004

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Líderes políticos a favor do golpe de 64 ganharam, mas não levaram

PLÍNIO FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Os governadores Adhemar de Barros (PSP-SP), Carlos Lacerda (UDN-Guanabara) e José Magalhães Pinto (UDN-MG)- principais lideranças políticas em defesa do golpe militar que derrubou João Goulart- amanheceram o 1º de abril de 1964 vencedores. Mas acabaram derrotados pelo regime instalado a partir dali.
A melhor definição do que ocorreu nas horas próximas ao golpe, 40 anos atrás, talvez tenha sido do general Osvaldo Cordeiro de Farias (1901-1981):
"O Exército dormiu janguista no dia 31 e acordou revolucionário no dia 1º", afirmou ele aos sociólogos Aspásia Camargo e Walder de Góes, no livro "Meio Século de Combate - Diálogo com Cordeiro de Farias" (Nova Fronteira, 1981). A frase foi redescoberta por Elio Gaspari, em seu "A Ditadura Envergonhada" (Companhia das Letras, 2002).
Se da noite para o dia revelou-se a não-existência do "dispositivo militar" de Jango, os políticos que apoiaram os militares começaram a ter certeza de sua própria derrota 112 dias depois do golpe, primeiro com o adiamento da eleição presidencial direta de 1965 e, 19 meses depois, com sua transformação em pleito indireto, na edição do Ato Institucional nº 2.
"Iniciado um processo de intervenção militar, o poder civil passa a ser tributário do núcleo duro militar, que sempre tem a hegemonia dos radicais", diz Aspásia Camargo, doutora em sociologia pela Universidade de Paris.
Conspiradores, Barros e Lacerda já haviam sido lançados candidatos a presidente, na eleição programada para outubro de 1965, e Magalhães Pinto havia tentado se viabilizar como tal. O principal adversário de todos era Juscelino Kubitschek (PSD). Pesquisa à época colocava JK como favorito, com 37% das intenções de voto, contra 25% de Lacerda.
Adhemar de Barros (1901-1969), ao ver o comício da Central do Brasil em que Jango defendeu as reformas de base, organizou a reação com a Marcha da Família com Deus pela Liberdade: "O que está aí será derrubado", disse.
Sete meses antes do golpe, Lacerda (1914-1977) afirmava, em entrevista, que os militares discutiam, a respeito de Jango, como "tutelá-lo, patrociná-lo, colocá-lo sob controle até o fim do mandato ou destituí-lo agora mesmo".
Magalhães Pinto (1909-1996) articulou e estimulou o levante das tropas de Minas que precipitou o golpe e colocou os 25 mil homens na Polícia Militar do Estado "em defesa da Revolução".
A derrota das lideranças civis pró-golpe fica clara com a cassação de Adhemar de Barros, Lacerda e JK e a frustração dos planos de Magalhães Pinto, que chegou a ser ministro das Relações Exteriores, mas teve de abortar o projeto de se tornar presidente.
As raízes do golpe contra Jango estão centradas na área política. "O empresariado apoiou o movimento de 64 não por causa da política econômica em vigor, mas em razão da crise de confiança provocada pelas forças políticas de Jango", analisa Maria Celina D'Araújo, doutora em ciência política e coordenadora do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da Fundação Getúlio Vargas.
Jango começa a cair, na opinião de Aspásia Camargo, quando se inicia um processo em que perde peças civis e militares do centro político que JK havia montado.
"A ação militar foi o último elo da cadeia de desesperança. Foi uma reação a um projeto que não tinha consistência real. Faltava um projeto econômico claro e havia o temor de o projeto político ser uma alternativa como a peronista, com a concentração de poder no presidente", diz Aspásia.
Na visão de quem esteve dentro do golpe, a intervenção militar deveria ter sido curta, e o poder, transferido às lideranças civis rapidamente. "O resultado foi que a revolução militar foi colocada para fora com um pé na bunda", afirma hoje o general reformado Newton Cruz.


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