São Paulo, sexta-feira, 01 de julho de 2005

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"Eleição não custa menos de R$ 1 mi"

DO ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Logo no início de seu depoimento à CPI dos Correios, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) procurou mudar o foco da discussão sobre irregularidades nos Correios e o pagamento do suposto "mensalão" para o financiamento de campanhas por meio de caixa dois. Ele classificou todas as contas de campanhas do país de "mentirosas", incluindo a sua. Comparou ainda o tesoureiro do PT e o publicitário Marcos Valério a PC Farias.
Em um estilo teatral e intimidatório, Jefferson apontava, ao citar as campanhas milionárias, uma pasta vermelha trazida por ele, na qual estavam as prestações de contas eleitorais de deputados e senadores. "As declarações da Justiça Eleitoral não traduzem a realidade. Nem a minha, porque é igual a dos senhores."
Apontado como operador de esquema de corrupção em estatais na fita que deflagrou o caso dos Correios, Jefferson, com o rosto inchado depois de sofrer um acidente doméstico, se defendeu com acusações contra a Abin (Agência Brasileira de Inteligência). O depoimento, que começou às 16h30, não havia terminado até o fechamento desta edição.
Repetiu as denúncias publicadas ontem pela Folha de que haveria uma esquema de desvio de R$ 3 milhões mensais em Furnas.

 

CONTAS DE CAMPANHA - Jefferson chamou de "mentira" todas as prestações de contas de campanha eleitoral e disse ter trazido as contas dos integrantes da CPI à sessão. "Eu trouxe aqui, que peguei na Justiça Eleitoral, todas as prestações de contas, minha e dos senhores. É aí o princípio da mentira que a gente vive aqui. Não há, povo do Brasil, cidadãos do Brasil, eleição de deputado federal que custe menos de R$ 1 milhão ou de R$ 1,5 milhão. Mas a média, aqui na CPI e na Câmara, na prestação de contas é de R$ 100 mil. Não há eleição de senador que custe menos que R$ 2 milhões ou R$ 3 milhões, mas a prestação de contas, na média, é R$ 250 mil. Este processo começa na mentira e deságua no PC Farias, nos outros tesoureiros, e agora no senhor Delúbio e no senhor Valério."
PT- Jefferson insinuou que o PT, especificamente na derrota de José Genoino para o governo de São Paulo, tinha campanhas milionárias, que não eram representadas nas contas eleitorais. Citou a sua própria prestação de contas. "É de deixar a gente perplexo. Ou alguém tem dúvida que a campanha mais rica de 2002 foi a campanha do PT? A mais milionária, a mais poderosa de todo o Brasil, do Oiapoque ao Chuí? E as declarações da Justiça Eleitoral não traduzem a realidade. Nem a minha, porque é igual a dos senhores."
OPERAÇÃO ABAFA - Jefferson diz que o governo faz o mesmo que a tropa de choque do governo Fernando Collor de Melo. "Nessa inversão de papel que vivo hoje, vejo que muitos dos que ontem exorcizavam os fantasmas, agora se abraçam com eles. Só que agora não são mais os fantasmas do PC, são os fantasmas do Delúbio e do Marcos Valério."
ABIN - Jefferson fez fortes ironias sobre a suposta incompetência da Abin, pelo envolvimento de um ex-agente, Jairo Martins, na gravação dos Correios. "A competência é tão grande que a Abin conseguiu que seus agentes filmassem um petequeiro, um leviano, apanhando R$ 3 mil num movimento de contratos de milhões (...) A Abin é apenas uma polícia política usada para constranger aquele que se opõe a certas figuras do governo."
TEATRO- Depois de sua performance no Conselho de Ética na Câmara dos Deputados ter sido comparada a de um ator, Jefferson refutou ontem essa análise. "Apesar de estarmos em um teatro de luta, de idéias, um teatro político, não vim aqui desempenhar papel de artista."
SAQUES NO BANCO RURAL- Jefferson afirmou que assessores dos deputados que recebiam o suposto "mensalão" faziam os saques diretamente da agência do Banco Rural em um shopping de Brasília. "A Abin foi incapaz de dizer (...) que o senhor Marcos Valério, versão moderna e macaqueada do senhor PC Farias, sacava R$ 1 milhão por dia nas contas do Banco Rural. Ou sacava em Minas Gerais ou no prédio do banco no Brasília Shopping, no 9º andar, onde muitos assessores dos que recebem "mensalão", que estão registrados na portaria, subiam até o escritório do banco para receber R$ 30 mil, 40 mil, às vezes 20 mil ou até R$ 60 mil."
Depois, Jefferson disse ter informações que esse esquema aconteceria "até há pouco tempo". Esse esquema teria substituído as malas de dinheiro que têm sido citadas por Jefferson. "Desde que as malas de dinheiro pararam de circular, as pessoas começaram a fazer os saques no Banco Rural, na agência do nono andar do Brasília Shopping", disse ele. A informação contraria o que o próprio Jefferson havia dito anteriormente, que o pagamento do "mensalão" havia parado quando ele informou o presidente Lula.
BANCO DO BRASIL - Além dos saques feitos pelo publicitário Marcos Valério no Banco Rural, já identificados, Jefferson diz ser preciso verificar a movimentação realizada no Banco do Brasil. "Tem que procurar o Banco do Brasil também, porque recordo que dos recursos que recebi do PT, 60% eram notas com etiquetas do Banco do Brasil."
PC FARIAS - O deputado comparou diversas vezes o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, a Paulo César Farias, tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992). Fez um trocadilho com o nome do tesoureiro de Collor: "Se PC Farias, e fez, hoje Delúbio e Marcos Valério fazem."
REFORMA POLÍTICA - O petebista criticou a proposta de financiamento público de campanha, o troca-troca partidário e até a suplência de senador. "São sugestões que o PTB traz porque essa comissão não vai ficar em coisa pequena, em um petequeiro leviano que ficou com R$ 3.000."
FURNAS - Sobre um suposto esquema de desvio de dinheiro a partir de Furnas Centrais Elétricas, ele reafirmou o que disse anteontem à Folha, que ouviu que todos os meses há uma sobra de caixa de cerca de R$ 3 milhões, montante que beneficiaria o PT nacional, o diretório mineiro do partido, a diretoria da estatal e deputados que trocaram o PSDB por legendas da base aliada.
MENSALÃO - Para Jefferson, o atual sistema político cria condições para o pagamento de mesada a deputados para que votem com o governo. "Na raiz do mensalão está o troca-troca de partido. Até luvas de R$ 1 milhão e financiamento de R$ 30 mil de taxa de manutenção nós já temos."
CORREIOS- Jefferson afirmou que o ex-diretor de Administração dos Correios Antônio Osório pedia dinheiro a empresários para o PTB. "Eu pedi a ele que se possível na relação com qualquer empresário privado ele pudesse no final ajudar o caixa oficial do partido."
4 MILHÕES - Ao ser questionado pelos parlamentares, Jefferson se recusou a dizer como teria distribuído os R$ 4 milhões repassados pelo PT ao PTB nas eleições municipais do ano passado. Alegando que o presidente do PT, José Genoino, não emitiu o recibo prometido, o deputado afirmou que preferia arcar com a responsabilidade pelo recebimento do dinheiro, isentando o partido.
"Não admito que o partido pegou, morre comigo a informação. Não vou prejudicar inocentes, recebo na pessoa física, por omissão do presidente do PT e por erro meu", disse ele.

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