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LIGAÇÕES PERIGOSAS
Empréstimo a coordenador de Ciro veio de arrecadação pró-Collor
Martinez recebeu dinheiro de "fantasmas" de PC Farias
MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO
Ao contrário do que o candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PPS) e o seu coordenador-geral de campanha, José Carlos Martinez (PTB-PR), vêm dizendo há quase duas semanas, o
"empréstimo" de Paulo César Farias ao deputado paranaense em
1991 não foi um "negócio privado" dentro da lei.
Tratou-se de transferência de
recursos feita quase toda em nome de correntistas "fantasmas",
expediente introduzido por PC
Farias em suas operações no segundo semestre de 1990.
Os "fantasmas" eram nomes inventados por PC para abrir contas
bancárias cuja titularidade de fato
era dele. Com os "fantasmas", o
ex-caixa de campanha de Fernando Collor tinha alta movimentação financeira sem aparecer. Burlava a Receita Federal e outros órgãos fiscalizadores.
Em 1991, ano do empréstimo
conforme declaração de renda de
Martinez, cuja cópia foi distribuída por ele na segunda-feira, PC
não tinha como emprestar o que
Martinez diz ter recebido.
Os rendimentos de PC tributáveis em 1991 foram de Cr$ 68 milhões (a moeda da época era o
cruzeiro). Os rendimentos não-tributáveis, de Cr$ 650 milhões.
No total, Cr$ 718 milhões.
Martinez deu a entender que o
empréstimo foi em julho de 1991.
O valor: Cr$ 4.384.122.689,00, o
que equivaleria a R$ 28 milhões
em maio de 2002, segundo uma
das numerosas tabelas de conversão, a de atualização de débitos da
Justiça de São Paulo.
A soma dos rendimentos de PC
em 1991 representou 16,4% do total que Martinez afirmou ter tomado de empréstimo. PC não tinha patrimônio legal que lhe permitisse dispor da quantia recebida pelo atual coordenador-geral
da campanha de Ciro Gomes.
Em julho de 1992, três auditores
da Receita Federal iniciaram uma
fiscalização sobre PC como pessoa física. Confirmaram e descobriram diversas irregularidades,
entre elas o repasse a Martinez e
seu grupo empresarial, que resultaram num auto de infração.
A multa foi de R$ 60 milhões.
Ao ser assassinado, em junho de
1996, PC devia R$ 85 milhões à
Receita.
"Negócio privado"
O "negócio privado" foi investigado pela CPI do PC, cujo resultado determinou o impeachment
de Collor.
A CPI destrinchou a operação
na qual PC deu o aporte financeiro para a Rede OM (empresa da
família Martinez, hoje CNT) comprar a TV Corcovado, do Rio. Os
pagamentos, conforme a CPI descobriu com a quebra de sigilos
bancários e fiscais:
1) o "fantasma" Manoel Dantas
Araújo amortizou dívida do SBT
(que vendeu a TV Corcovado)
com a Caixa Econômica Federal.
No verso do cheque ele informava
que a quantia, equivalente no dia
a US$ 3,2 milhões, se referia a parte do valor pago pela emissora carioca. O mesmo "fantasma" pagou US$ 85,2 mil à Rede OM e
US$ 30 mil à José Augusto Martinez de Souza, primo do coordenador de Ciro e então diretor da
Rede OM;
2) o "fantasma" Flávio Maurício
Ramos, na mesma operação de
aquisição da TV Corcovado,
transferiu o equivalente a US$ 4,5
milhões para José Carlos Martinez e US$ 45 mil para a CEF;
3) o "fantasma" Jurandir de
Castro Menezes depositou US$
193 mil para José Augusto Martinez de Souza;
4) o doleiro Jorge Luiz Conceição, no mesmo negócio, deu US$
328 mil a José Carlos Martinez.
Ao todo, US$ 8,4 milhões foram
entregues ao grupo Martinez,
quase tudo por "fantasmas" do
Esquema PC. Exame grafotécnico
comprovou que quem assinava os
cheques do tal Flávio Maurício
Ramos era Rosinete Melanias, secretária de PC.
Em 1999, José Carlos Martinez
devia ainda R$ 3 milhões (então
US$ 1,6 milhão) à família de PC,
conforme a Folha publicou, com
a confirmação de ambas as partes,
em 23 de setembro de 1999.
No último dia 21, a Folha revelou que a dívida continua sendo
paga, o que mantém os vínculos
financeiros entre o coordenador
de Ciro e o núcleo familiar de PC.
Martinez e do deputado Augusto Farias (PPB-AL), irmão do ex-tesoureiro de Collor, confirmaram o parcelamento da dívida
não saldada. Depois, Martinez se
contradisse e não reafirmou que
ainda paga os Farias.
Os dados fundamentais sobre a
conexão PC-Martinez no negócio
de TV podem ser conhecidos em
processos judiciais arquivados no
Distrito Federal e em Alagoas ou,
em síntese, com a mera leitura do
relatório da CPI do PC.
Ao depor no processo criminal
em que era acusado de sonegação
fiscal, PC Farias disse em Maceió
que o dinheiro dos "fantasmas"
era de sobra dos fundos da campanha de Collor em 1989. Por silogismo, o que foi transferido a
Martinez para pagar cerca da metade do valor da TV Corcovado
era arrecadação pró-Collor.
Os auditores fiscais suspeitaram
que não houve "empréstimo" de
fato ao grupo Martinez, mas repasse de um sócio oculto a outro.
Não obtiveram documentos que
comprovassem a suspeita.
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