São Paulo, domingo, 01 de setembro de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO / BORIS CASOY

Efeito Ricupero

Seria redundante dizer que a televisão faz e desfaz políticos. Para reduzir a influência do poder econômico nas eleições, o regime militar, quem diria, criou o horário eleitoral na televisão e no rádio. Destinava-se a levar a palavra dos candidatos, sem despesas para estes, diretamente ao eleitor. Os programas eram ao vivo. Hoje quem está na tela não é o candidato. É o marqueteiro que se incorpora ao candidato; é uma espécie de encosto de aluguel. Muitos dos postulantes apenas emprestam o corpo. Fala o marqueteiro. Falanges de redatores preparam textos que supostamente o momento demanda. Eles são interpretados com cuidado teatral em teleprompters, sob luz estudada e muita maquiagem.
Mas esse mundo televisivo é composto por homens e máquinas; ambos sujeitos à crueldade do acaso eletrônico. Foi um desses acasos que catapultou o sr. Ciro Gomes do Ceará para o Ministério. Itamar presidente, campanha de Fernando Henrique. O todo poderoso ministro da Fazenda Rubens Ricupero preparava-se para uma entrevista de fim de noite na Rede Globo. Descontraído, aguardava o momento de ser entrevistado. Mal sabia ele que, embora a entrevista não tivesse começado, sua imagem e voz ecoavam no ar, através de um traiçoeiro satélite. Voyeurs não faltavam. Muitos com seus gravadores preparados, como se adivinhassem a iminente tempestade. E Ricupero desandou a falar como num confessionário. Dito tudo, um diligente funcionário da emissora avisou: estava no ar, mas apenas no satélite. Ricupero começava a cair.
Melhor sorte teve a candidata a vice-presidente Íris Resende, casada com um homônimo, o ex-ministro Íris Resende. Ela aguardava o início de uma entrevista a ser gravada pelo SBT; ela em Brasília, o entrevistador em São Paulo. Os técnicos pedem que ele fale alguma coisa para regular o som. Dona Íris teve uma súbita regressão. Com o satélite no ar, caprichou singular "atirei um pau no gato-to-to, mas o gato-to-to, não morreu."... Foram cerca de cinco minutos de cantoria que fariam a felicidade de qualquer adversário. Com um satélite mais discreto, só foi vista pelo pessoal do SBT em São Paulo. Atendendo o apelo da candidata, o entrevistador prometeu não colocar a gravação no ar. E segundo ele, para não prejudicar o processo eleitoral, mandou apagá-la.


Boris Casoy, 61, âncora e editor-chefe do "Jornal da Record", escreve aos domingos nesta coluna

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