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São Paulo, segunda-feira, 01 de dezembro de 2003

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OPERAÇÃO ANACONDA

Subprocurador-geral da República Antônio Cesar foi alvo de sindicância em caso que envolvia o juiz Rocha Mattos

Suspeito já havia sido investigado em 89

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O subprocurador-geral da República Antônio Augusto Cesar foi alvo de sindicância interna no Ministério Público Federal, em 1989, por sua atuação no caso Cobrasma, controvertido inquérito em que o juiz João Carlos da Rocha Mattos rejeitou denúncia contra o então presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Luis Eulalio de Bueno Vidigal Filho, vice-presidente daquela empresa.
Vidigal havia sido denunciado por crime contra o sistema financeiro nacional (a lei 7.492/86, mais conhecida como Lei do Colarinho Branco). Cesar perdeu o prazo para oferecer recurso contra a sentença de Rocha Mattos.
O caso sobreviveu durante 12 anos sem julgamento, no Tribunal Regional Federal, até que Rocha Mattos jogou uma pá de cal, arquivando o inquérito em 1999.
Quatorze anos depois, Cesar está no centro de nova apuração interna envolvendo Rocha Mattos. Agora, ele é investigado pela Procuradoria Geral da República sobre eventuais relações com membros da suposta quadrilha cujo mentor, segundo o Ministério Público Federal, é o mesmo juiz.
O subprocurador mora em Brasília, exerce advocacia privada (permitida, no seu caso) e sublocava em São Paulo sala do advogado Affonso Passarelli Filho, preso na Operação Anaconda.
Em 1987, a Folha revelou que a Cobrasma causara fortes prejuízos a investidores ao colocar no mercado 25,5 bilhões de ações, no total de R$ 108,1 milhões, em valores atuais. A emissão foi estimulada por projeções irreais de lucro.
Segundo a denúncia, "a Cobrasma efetuara a venda de ações no momento em que o mercado desconhecia a possibilidade de prejuízo, já prevista, omitindo-se, assim, no dever de informar".
Perderam com a operação os três bancos coordenadores, Bradesco, Crefisul e BCN, 124 instituições financeiras e milhares de pequenos e médios investidores.
O então diretor do Bradesco Alcides Tápias disse nos autos que a Cobrasma "não informou os coordenadores da real situação nem reviu os números da projeção, esperando por uma recuperação". Segundo Emílio Otranto Neto, gerente do Crefisul, "a Cobrasma teve conhecimento desse prejuízo bem antes do registro de emissão pela Comissão de Valores Mobiliários".
Embora não haja dependência entre a esfera administrativa e a judicial, Rocha Mattos cita na sentença que o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional derrubou as multas no total de R$ 18,1 milhões aplicadas pela CVM.
Rocha Mattos rejeitou a denúncia contra Vidigal e três diretores da Cobrasma (Marcos Vidigal Xavier da Silveira, Eduardo Luiz Pinto e Silva e Ércio Pinto Tavares). Como Cesar perdeu o prazo para recorrer dessa decisão, a Procuradoria da República em São Paulo instaurou sindicância, cujo resultado é desconhecido. Em outro caso, ele foi suspenso, acusado de advocacia administrativa (patrocinar interesse privado contra a administração pública).

Denúncia inepta
Rocha Mattos considerou a denúncia inepta, porque não alcançava os diretores dos bancos. Entendeu que não houve dolo e que o fato descrito na denúncia "não configura o crime tipificado".
A denúncia fora oferecida em junho de 1989 pelo então procurador Antônio Carlos Ramozzi. Ao sair de férias, Ramozzi foi substituído por Cesar. O recurso, com data de 10 de outubro, foi protocolado no dia 11, um dia depois do prazo. Nessa mesma data, Rocha Mattos negou seguimento ao recurso, "por ser ele manifestamente intempestivo". Para o juiz, o prazo se esgotara no dia anterior.
No dia seguinte, o procurador Cesar apresentou "carta testemunhável" (recurso secundário), requerendo o processamento regular do recurso. Alegou que não era atribuição sua acompanhar a remessa da petição ao juiz. E que naquele dia fora ao tribunal.
Em 27 de outubro de 1989, o advogado Joaquim Mendes Santana apresentou a contestação da Cobrasma. "Embora tenha afirmado que o dia de início de seu prazo recursal era o dia 10 de outubro de 1989, circunstância que estenderia seu prazo até o dia 14 de outubro, o ilustre procurador, muito estranhamente, entregou sua petição de recurso ao seu secretário para que este providenciasse o protocolo por volta de 13h do próprio dia 10", sustentou Santana.
"Se seu prazo estendia-se até 14 de outubro, por que teria datado e mandado protocolar o recurso no dia 10, às 13h? Por que a urgência? A resposta é única e não admite controvérsia: é que tinha a certeza de que seu prazo encerrava-se no dia 10 e não depois", sustentou.
Em 7 de dezembro de 1989, Rocha Mattos julgou a "carta testemunhável": manteve a sua posição e enviou os autos ao TRF.
No dia 12 daquele mês, os dirigentes da Cobrasma enviaram ofício à então procuradora-chefe da Procuradoria da República, Cleide Previtalli Cais, consultando se a sindicância aberta para apurar a perda de prazo processual havia sido concluída.
Doze anos depois de perambular nas gavetas e gabinetes do TRF, o recurso ainda não havia sido julgado. Em 6 de dezembro de 1999, Rocha Mattos mandou arquivar o inquérito policial.



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