São Paulo, sexta, 2 de maio de 1997.

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Continuação

12. A quarta ilegalidade é, dentre todas, a mais constrangedora e põe a nu o caráter gravemente lesivo ao patrimônio público e até mesmo atentatório contra interesses básicos da nação brasileira, permitindo qualificar a venda da CVRD como conduta antipatriótica, adversa às conveniências do país.
Vista a questão do ponto de vista estritamente jurídico, patenteia-se o vício mencionado no art. 2º, letra "d", da lei de ação popular, ou seja de "inexistência dos motivos", figura esta que o parágrafo único e correspondente letra tipifica da seguinte forma: "a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito em que se fundamentou o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido".
Com efeito, a Cia. Vale do Rio Doce é empresa rentável. Não causa ônus alguns à União, que, desde 1990, nada lhe aporta de capital (item 7.4. do edital). Pelo contrário, proporciona-lhe dividendos, tudo conforme inicialmente apontado e conforme resulta do edital publicado pelo BNDES (item 7.5. do edital). Sua atividade gera receita suficiente para os investimentos requeridos. Ademais, como possui capacidade empresarial e nível de eficiência mundialmente reconhecidos e opera em setor estratégico, o da exploração de recursos dos quais o mundo tem incontornável precisão (os EUA e a União Européia dependem em 90% de recursos minerais externos e o Japão em 100%), sempre que conveniente pode obter aporte de recursos externos coligando-se com outras empresas, como de resto tem feito. Assim, não será pelo ângulo econômico que se poderia justificar a venda do controle acionário da Vale do Rio Doce.
13. Acresce que, por este ângulo, a venda pretendida apresenta-se, mesmo a um primeiro súbito de vista, como incongruente e até mesmo ruinosa, despertando as mais naturais suspeitas de que se trata de um negócio incompreensível e, sem exagero algum, simplesmente inexplicável.
Veja-se: a empresa, para fins de venda de suas ações, foi avaliada em cerca de 10 bilhões e quatrocentos milhões de reais (valor este que, diga-se de passagem, mesmo leigos, podem perceber que é irrisório em se considerando o patrimônio minerário apontado, os equipamentos da empresa, as ferrovias e correlatas concessões e o 580 mil hectares de florestas comerciais replantadas).
A União possui 50,8% do patrimônio em ações da CVRD. Se vender, no dia 29, como está previsto, 45% de suas ações ordinárias -o que representa 28,8% do capital acionário da empresa- irá obter, pelo preço que considerou suficiente (preço mínimo), ao redor de 3 bilhões de reais (28,8% de 10 bilhões e quatrocentos milhões). Mesmo com a conclusão das fases ulteriores da venda (2¦ e 3¦ etapas), a União, nestas mesmas condições, apurará pouco mais de cinco bilhões de reais.
Ora, desfazer-se da CVRD -cujo relevo estratégico é imenso, como logo se dirá- para captar importâncias desta grandeza, é nada menos que um absurdo, dada a pouca significação de ingressos desta ordem, se comparados com os montantes mobilizados para outros fins. Basta lembrar que o governo federal reputou poder entregar aos bancos (Proer) -e ser perfeitamente cabível e justificável fazê-lo, como o fez- mais de 20 bilhões de reais.
A demonstração de que é o próprio governo quem reputa muito pouco expressivos valores da ordem dos que pretende auferir com a venda da CVRD tem-se, ainda, no fato de que, ante um desequilíbrio na balança de pagamentos equivalente a cerca de 10 bilhões de dólares, autoridades governamentais de alto escalão se pronunciaram tranquilizadoramente, fazendo ver ao público que nada de preocupante em valores de tão comedido montante.
Outrossim, o que a União obterá com a venda da CVRD é absolutamente inexpressivo para fins de enfrentar nossa dívida externa, que ultrapassa a casa dos 130 bilhões de dólares (não de reais supervalorizados artificialmente). Assim, também não se pode considerar que a alienação de um patrimônio nacional do porte e da significação de tal empresa represente algo importante para melhoria da dívida externa. O mesmo e pelas mesmas razões se pode dizer quanto ao perfil da dívida pública interna, já que esta excedia o montante de 240,8 bilhões (em janeiro/97). Note-se que o produto da venda da Vale pouco incorpora ao esforço nacional para melhoria da situação econômica. Basta lembrar que no ano passado, só de juros, das dívidas externa e interna, o Brasil pagou o equivalente a 24 bilhões de dólares.
14. Mas, por último, nesta ordem de considerações puramente relacionadas com valores econômicos, o mais espantoso -na verdade o mais escandaloso- é que em sendo vendidas as ações da União pelo preço que ela própria (através dos avaliadores estrangeiros) definiu como aceitável, o que se apurará equivale ao lucro líquido que a CVRD produz em menos de cinco anos (projetado o lucro líquido de 1996 para os próximos cinco anos, ainda que se saiba que recentes e valiosíssimas descobertas de recursos minerais ensejam crescimento dele)!
Provavelmente, mais não seria preciso para exibir a completa falta de motivos prestantes para a operação projetada e a natureza lesiva de que se reveste.
15. Sem embargo, outras considerações, de relevo ainda muito maior, exibem com luminosa clareza, o caráter gravoso e, inclusive, antinacional de que se reveste a venda da Cia. Vale do Rio Doce.
É sabido e ressabido que a grande riqueza do país, quiçá sua maior riqueza, não reside no solo, mas no subsolo. Foi isto que levou à cautela de qualificar os recursos minerais como de propriedade da União e de estabelecer que a sua exploração só poderia ser feita por brasileiros, conforme consagração normativa de há muito fixada e que perdurou até o atual governo (quando este conseguiu retirar da Constituição tal cautela, como seu primeiro ato de reforma da Lei Magna 5).
Em contraste com o Brasil, países que ora desfrutam da condição de desenvolvidos e que exercem a liderança econômica e política mundial, são inteira ou quase completamente dependentes de recursos minerais externos, os quais, por uma felicidade nossa, encontram-se abundantemente em nosso território, ainda que estejamos longe de ter uma noção exata de todo o fantástico acervo com que a natureza nos aquinhoou. Dado que as riquezas minerais são absolutamente indispensáveis para a continuidade e progresso da civilização, encontramo-nos, sob tal aspecto, em situação privilegiada, tanto mais porque ditos recursos minerais não são reprodutíveis, mas, pelo contrário, exauríveis.
Diante disto, maiormente em uma economia globalizada, tais riquezas nos conferem uma posição estratégica e a detença delas em mãos de uma empresa estatal de grande porte, como é a Vale, constitui-se em um dos poucos trunfos que o país possui para qualificá-lo no âmbito dos negócios e dos rumos políticos internacionais, já que estes estão sempre atrelados aos decorrentes de interesses e forças econômicas. Ora, desfazer-se de um instrumento de tal expressão para colher uma compensação econômica irrelevante, é algo que toca às raias do absurdo e, para dizer o menos, conspira contra interesses básicos do país.
Nesta linha de idéias, recorde-se que a principal riqueza deste século, como é de universal conhecimento, tem sido o petróleo. Sem embargo, os países que possuem as maiores riquezas petrolíferas, os árabes, precisamente porque interesses externos puderam neles se enquistar, incluem-se entre os mais pobres e mais subdesenvolvidos. Pior que isto, por força deste ingresso de interesses internacionais em seus territórios, têm sido palco de contínuas guerras e conflitos, constituindo-se no cenário permanente de conflitos internacionais.
A razão disto é simples. Riquezas existentes no solo, sobreposse industriais ou comerciais são deslocáveis. Assim, se atos de soberania nacional contravém interesses externos, o golpe que estes últimos sofrem é absorvível, por não ser irrecuperável. Pelo contrário, quando se trata de riquezas no subsolo e demais disso exauríveis, os interesses feridos de países cêntricos não têm alternativa para serem defendidos, senão através da guerra, da invasão, do bombardeamento para vergar quem os contrarie ou, no mínimo, o fomento de combates fratricidas ou entre países vizinhos. A história recente do Oriente Médio vale como a mais indiscutível demonstração do que se vem de anotar.
Ora bem, a venda da Cia. Vale do Rio Doce (a qual tem significativas concessões na Amazônia, em terras indígenas e em faixas de fronteira), liberada para capitais externos, representa perigosíssima fissura na própria segurança nacional e enseja o ingresso de interesses internacionais no delicado segmento econômico sobre o qual opera esta empresa estatal brasileira.
E isto, como se demonstrou, sem que existam motivos minimamente prestantes para justificar tão temerário comportamento e sem que haja, em contrapartida, um aporte de recursos significativo, relevante para o enfrentamento de dificuldades econômicas, se é que algum aporte desta espécie seria bastante para justificá-lo. Em outro tempo histórico, desfrutando o país de outra posição no cenário internacional, possuindo outro nível de desenvolvimento e de consciência de cidadania espraiado pelos diversos segmentos sociais, a alienação do controle acionário sobre empresa desta ordem poderia ser compreensível, desde que efetuada por valores compatíveis. Na atualidade, contudo, no panorama internacional vigente, com os rumos político econômicos ditados por uma única e monolítica tendência, controlada pelo Grupo dos 7, o que ora se projeta é literalmente um absurdo inominável.
É bem de ver, pois, que se trata de ato que, à luz do dia, não encontra razões plausíveis, não pode ser defendido com motivação alguma e que, por ilegal e lesivo ao patrimônio público, deve ser repudiado por todos os cidadãos que tenham alguma espécie de sentimento de respeito ao direito e aos interesses da Pátria.
Está, pois, exibida e de maneira copiosa a paradigmática incursão no art. 2º, letra, letra "d", da lei de ação popular, ou seja, a inexistência de motivos, vício que se verifica quando a matéria de fato ou de direito em que se fundamentou o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido, inclusive porque, de um lado, o ato censurado sequer os apresentou e de outro, é possível demonstrar, como se fez de modo abundante, que o que existem são motivos seríssimos para não praticá-lo.
As ilegalidades até aqui referidas são apenas parte de um número ainda maior de vícios residentes no edital publicado pelo BNDES para leilão das ações da Cia. Vale do Rio Doce. Por amor à brevidade, enunciaremos apenas, sinteticamente, mais alguns deles.
16. Nos termos do item 2.2.2. do edital foi fixado o preço mínimo por ação, entretanto, uma capciosa cláusula, ali inclusa, faz com que o sobredito edital seja nulo e írrito de pleno direito. De acordo com ela.
"O CND poderá, a seu critério, rever o preço mínimo acima indicado, diante de fatos que justifiquem tal decisão".
Este dispositivo que, a um primeiro súbito de vista, aparenta ser meramente defensivo dos interesses da União, é, na verdade, uma porta aberta a conluios e fraudes de toda ordem.
Trata-se da consagração da possibilidade de transmissão de "informações privilegiadas", pois enseja que, durante o transcurso do prazo editalício e naturalmente antes da divulgação pública do novo preço, se comunique reservadamente a algum grupo participante a elevação de tal valor, ensejando-lhe oportunidade de tempestivas gestões e adaptações à situação nova, sem que os demais concorrentes disponham da mesma dilação necessária para os correlatos ajustes.
Tem-se, nisto, uma quinta ilegalidade, qual a de violação manifesta do art. 3º da lei nº 8.666, de 21.06.93, alterada pela lei nº 8.883, de 08.06.94, por se tratar de cláusula que fomenta a burla ao princípio da isonomia e consequentemente a todos os demais princípios arrolados no dispositivo citado.
17. Há, ademais uma sexta ilegalidade. A CVRD, como toda sociedade por ações, tem seu capital dividido em ações cujas espécies são criadas por lei, no caso, a lei nº 6.404, de 15.12.76. Nem o Estatuto Social nem um eventual acordo de acionistas pode criar, numa sociedade por ações, títulos acionários de espécie não prevista em lei.
Ora, de acordo com o Edital (itens 1.1. e 3.2.1) "à União, na qualidade de titular da ação de classe especial ("golden share") da CVRD, será atribuído o direito de veto sobre as seguintes matérias relativas à CVRD, e que deverão obrigatoriamente ser submetidas à Assembléia Geral de Acionistas:". Segue-se a indicação de sete matérias.
Pois bem, esta ação, para a qual se inventou nome de "ação de classe especial", não está prevista nos artigos 16 a 19 da lei de S.A. Trata-se, pois, de uma criação original do ato convocatório, para além do que permite a lei. Ora, não se tem conhecimento de que o Poder Legislativo haja sido transferido ao BNDES.
Com efeito, a lei acionária prevê apenas duas espécies de ações: as ordinárias e as preferenciais. Para umas e outras admite-se (arts. 16 e 18 da lei) a atribuição, pelo Estatuto, de poderes especiais. Sucede que a ação de "classe especial" prevista no edital não é nem ordinária nem preferencial e atribui aos seus titulares poderes que não estão admitidos nos mencionados artigos da lei de S.A. nem para as ordinárias nem para as preferenciais).
Esta ilegalidade é gravíssima porque atinge justamente a garantia especial que pretensamente procurou-se dar à União no sentido de manter um poder especial de controle sobre a CVRD privatizada. Assim, qualquer sócio poderá, ulteriormente, arguindo dita ilegalidade, reduzir a pó as pretensas garantias que à União aparentemente se estava reservando.
Em suma: houve na criação desta tal "ação de classe especial" uma gritante ofensa ao princípio da legalidade.
18. Há ainda uma sétima e chocante ilegalidade. O sistema adotado para transferir a terceiros a exploração dos recursos minerários ora à compita da CVRD implica alienar direitos relativos a bens indeterminados. Com efeito, quem adquirir as ações adquirirá com isto o direito de exploração de um potencial desconhecido, ou seja, muitas vezes maior do que aquele que foi avaliado. Isto é, a União, além de vender o que sabe que tem e que avaliou, está substancialmente vendendo aquilo que ela sequer sabe que tem ou quanto tem. Ou seja, pelo valor da avaliação, aliena-se muito mais do que o avaliado.
De fato, o sistema adotado foi o de alienação de ações de empresa titular de direitos de pesquisa e exploração. Se a alienação fosse exclusivamente dos direitos de exploração dos recursos minerais já quantificados, seria possível avaliá-los e o valor apurável evidentemente tomaria por base o montante dos recursos minerários, mas como a alienação é das ações de uma empresa, quaisquer direitos de exploração, mesmo que concernentes a ocorrências novas nas áreas concedidas ou a excedentes das estimativas ora existentes ou titulados com autorizações de pesquisa, incorporam-se aos direitos do Grupo adquirente. Isto significa que este, ao adquirir as ações, não paga pelos novos recursos minerais à sua disposição. Nada importa que se prevejam no edital "royalties" por excedentes de exploração a partir de montantes prefixados ou que se emitam debêntures para captação de proventos que resultem de novas ocorrências minerais (item 5.2, i.i. do edital e Anexo IV) porquanto, com isto, estar-se-á captando apenas parte de um proveito que seria integralmente absorvido pelos atuais titulares das ações. Logo, a União estará alienando, a título gracioso, parte de tudo aquilo que ela ainda não sabe que tem ou quanto tem, já que só se reembolsará, pela via indicada, de parte do que dantes lhe pertencia.
Com isto, frauda-se o sentido da exigência legal de prévia avaliação do bem a se vendido, estatuísta no art. 17 da lei nº 8.666, pois se aliena, pelo valor da avaliação, mais do que aquilo que foi avaliado e cujo montante sequer se sabe qual é. Com efeito, de nada adianta avaliar um certo bem para obter a base de venda e, sobre esta mesma base, vender muito mais do que o avaliado. Há, nisto, como é claro a todas as luzes, uma verdadeira burla à norma jurídica mencionada.
19. O fenômeno ocorre porque, em se tratando de empresa de mineração, o que lhe confere o ponto de nucleação dos valores são direitos outorgados pelo Poder Público sobre bens cujos montantes não são, em sua totalidade, previamente identificados e que, bem por isto, podem assumir quantitativos variados. Evento desta ordem incorre com outro gênero de empresas cujo objeto de atuação ou independe de atos de outorga do Poder Público ou quando dela dependa, podem ser objeto da prévia delimitação que identifique exatamente o que está a ser alienado. No caso destas, então, últimas, a alienação de ações é procedimento prestante, pois sabe-se de antemão o que lhe integra o acervo, sendo, então, possível, avaliar o que se está a vender, isto é, um patrimônio certo, representado pelo pacote acionário. Então, a venda das ações corresponde realmente à venda de um dado patrimônio conhecido.
Já, no caso da CVRD, pela peculiaridade indicada, o procedimento de venda de ações é, para o Poder Público um procedimento inexequível, a menos que se exclua do âmbito das concessões -diversamente do que foi feito- toda e qualquer ocorrência nova e toda e qualquer autorização de pesquisa ora em vigor.
20. Derradeiramente, cumpre recordar que todo o procedimento de alienação da CVRD está envolvido em sério e justificado ambiente de suspeita. É que, conforme declarações e denúncia (doc. 13) ao Tribunal de Contas, feitas pelo coordenador da Comissão Externa da Câmara Federal encarregada de acompanhar a privatização em causa, há, no procedimento licitatório em questão, a seguinte gravíssima ilegalidade favorecedora de uma das participantes do certame: a empresa sul-africana Anglo American. A saber:
A Merrill Lynch -Consultora do BNDES para o processo de privatização, isto é, uma das associadas que coordenaram todo o procedimento preliminar e a avaliação da CVRD- na época em que ganhou a concorrência para participar da avaliação e da elaboração do modelo de venda da Vale, adquiriu 51% das ações da corretora sul-africana Smith Borkum Hare (SBH) em novembro de 1995. Em fevereiro, após ter conhecimento da data de publicação do edital de privatizações, a Merrill Lynch comprou os 49% restantes das ações da precitada SBH, a qual, de seu turno é a principal acionista de uma das empresas licitantes: a Anglo American (cf. ao respeito o "Correio Brasiliense", de 07.03.97, doc. 12 precitado). Outras denúncias de favorecimento à Anglo, (na qual, a Merrill Lynch, na conformidade do anteriormente referido, teria interesses ou seria controladora), encontram-se estampadas em artigo assinado pelo ex-superintendente de Pesquisas da Companhia Vale do Rio Doce e ex-presidente da Docegeo, empresa controlada integral da CVRD (item 6.6. do edital) (doc. 14 - Gazeta Mercantil, de 19.03.97).
Agrega-se, ainda, suplementarmente, a título ilustrativo de todas as considerações feitas sobre o verdadeiro escândalo substanciado na pretendida alienação das ações da Cia. Vale do Rio Doce nos termos em que foi composta, matéria publicada na Revista Carta Capital, onde diferentes aspectos da questão são examinados (doc. 15).

DO PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR
21. Ante todo o exposto, havendo sido demonstradas múltiplas ilegalidades no procedimento previsto para a alienação da CVRD, algumas das quais, inclusive, configurando hipótese de vícios para os quais a lesividade é dada como presumida, a teor do art. 4º da lei de ação popular (6), mas tendo sido feita, de todo modo, pródiga exibição de lesividade efetiva, requer-se liminarmente, com base no permissivo do art. 5º, parágrafo 4º da lei nº 4.717, pela iminência do dano a ser efetivado com a realização do leilão, previsto para o dia 29 do corrente mês, que V. Excia. determine a suspensão imediata de tal evento até julgamento final desta lide, a fim de que não se consume o ato ilícito, gravoso ao patrimônio público, atentatório à moralidade administrativa e antipatriótico que o BNDES está em vias de perpetrar.
Requer-se, ainda, seja a medida liminar imediatamente comunicada ao Réu, por "telex" ou "fac-símile", ou seja, pelo meio oficial mais rápido e eficiente, considerando a extrema urgência no cumprimento da ordem judicial.

DO PEDIDO

22. Requerendo a citação do BNDES na pessoa de seu presidente, por Carta Precatória, para que, se o desejar, conteste a presente ação ou a confesse, atuando ao lado dos autores populares, como autoriza o art. 6º, parágrafo 3º, da lei de ação popular e protestando pela produção de prova documental e testemunhal, pede e espera de V. Excia. que decrete a anulação de todos os atos do procedimento relativo à desestatização da Cia. Vale do Rio Doce, inclusive e notadamente o Edital nº PND-A-01/97 CVRD, disciplinador da alienação de ações da citada empresa.
Dá-se à presente o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
São Paulo, 22 de abril de 1997
Celso Antônio Bandeira de Mello
OAB-SP nº 11.199
Excelentíssimo senhor doutor juiz da Vara da Justiça Federal - Secção Judiciária de São Paulo
Processo nº 97.0011462-7
Celso Antônio Bandeira de Mello e outros, o primeiro em causa própria e os demais por seu advogado, nos autos da ação popular que movem contra o BNDES, vêm, respeitosamente, à presença de vossa excelência, aditar a petição inicial para que também conste no pólo passivo desta ação a União Federal, que é a proprietária das ações a serem vendidas no leilão previsto para o próximo dia 29 de abril. Requerem, ainda, sejam consideradas parte integrante da petição inicial as seguintes ponderações quanto à competência da Justiça Federal em São Paulo.
1. Dispõe o art. 109, I da CF que é de competência dos juízes federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes...". De outra parte, o parágrafo 2º do mesmo dispositivo constitucional estatui: "As causas intentadas contra a União Federal poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor..."
De seu turno, prescreve o artigo 5º da lei 4.717, de 29.6.65:
"Conforme a origem do ato impugnado, é competente para conhecer da ação, processá-la e julgá-la o juiz que, de acordo com a organização judiciária de cada Estado, o for para as causas que interessem à União, ao Distrito Federal, ao Estado ou ao município.
Parágrafo 1º Para fins de competência, equiparam-se a atos da: União, do Distrito Federal, do Estado ou dos municípios os atos das pessoas criadas ou mantidas por essas pessoas jurídicas de direito público, bem como os atos das sociedades de que elas sejam acionistas e os das pessoas ou entidades por ela subvencionadas ou em relação às quais tenham interesse patrimonial."
2. Por todo o exposto, não havendo quaisquer dúvidas quanto à competência da Justiça Federal de São Paulo para processar e julgar a presente ação, requer-se em aditamento a citação da União Federal, na pessoa de seu representante legal, para, querendo, contestar este feito no prazo legal.
São Paulo, 23 de abril de 1997
Celso Antônio Bandeira de Mello
OAB/SP 11.199

NOTAS
1. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Rev. dos Trib., 15¦ ed., 1990, pág. 92.
2. Direito Administrativo, Ed. Saraiva, 1975, pág. 6.
3. Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores, 1994, pág. 101.
4. Motivo e Motivação do Ato Administrativo, Ed. Rev. dos Trib., 1979, págs. 105 a 107.
5. Emenda Constitucional nº 6, de 15 de agosto de 1995.
6. Cf. Hely Lopes Meirelles, "in" Mandado de Segurança, Ação Popular ..., Malheiros Ed., 16¦ ed., 1995, pág. 91.

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