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OBRAS PÚBLICAS
De 387 programas prioritários, apenas 24 ainda são objeto de acompanhamento especial pelo governo
Crise financeira emperra Avança Brasil
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Xodó de Fernando Henrique
Cardoso, o programa Avança
Brasil caminha a passos cada vez
mais morosos. A crise financeira
avançou mais do que as intenções
de Brasília, atropelando-as.
Frustrou-se uma das pretensões
de FHC: atravessar o último ano
de sua gestão cortando fitas em
solenidades de inauguração. A
penúria alcança canteiros de
obras espalhados por todo o país.
O Avança Brasil -que continha as principais metas para o segundo mandato- englobava 387
programas. Seriam tocados com
prioridade. Representavam, segundo a propaganda oficial, "o
início da trajetória rumo ao desenvolvimento".
No ano passado, a escassez de
verbas levou o governo rever
prospecções e cenários. Selecionaram-se, entre os programas
prioritários, aqueles que seriam
mais prioritários. Foram eleitos
64 dos 387 iniciais.
Agora, com o caixa ainda à míngua, o governo viu-se forçado a
selecionar o prioritário do prioritário do prioritário. Hoje, encontram-se sob o regime de acompanhamento especial escassas 24
das 387 iniciativas.
Seletividade
José Paulo Silveira, funcionário
do Ministério do Planejamento
que centraliza a gestão do Avança
Brasil, diz: "Dados os recursos
disponíveis, se você não adota o
critério da seletividade, tende a
dispersá-los. Aí nem conclui nada, nem contribui para as obras
de maior impacto social ou econômico."
A idéia não é abandonar os demais projetos, explica Silveira,
mas priorizar a injeção de dinheiro nos 24 eleitos. "Como engenheiro, lamento quando uma
obra diminui de ritmo. Mas é motivo de satisfação ver o governo
trabalhando, pela primeira vez,
num plano que não é descontinuado. Ora acelera, ora diminui o
ritmo, sempre respeitando o
equilíbrio fiscal."
A estratégia do governo levou
inquietude à direção das empreiteiras. Pela lei, os pagamentos de
obras públicas devem obedecer à
ordem cronológica das medições.
Receia-se que a prioridade a certos projetos leve a Esplanada dos
Ministérios a furar a fila.
O empreiteiros começaram a se
mexer. Em carta ao ministro dos
Transportes, o peemedebista João
Henrique de Almeida, a Aneor
(Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias) abandonou a sutileza.
Diz um trecho do texto: "(...) renovamos a profunda preocupação das nossas [empresas] associadas ante a concreta alteração
da ordem cronológica dos pagamentos, com ofensa indiscutível
aos princípios constitucionais da
isonomia e da legalidade que devem pautar a atividade da administração pública".
A carta é assinada por José Alberto Pereira Ribeiro, presidente
da Aneor. Data de 22 de agosto. É
a segunda correspondência enviada ao ministro João Henrique
em menos de um mês. A entidade
ameaça ir à Justiça, se necessário.
Vinculações orçamentárias
O que deixou o empresariado de
cabelo em pé foi uma mensagem
interna da Secretaria do Tesouro
Nacional, órgão que pende da
pasta da Fazenda.
O texto, de 24 de junho, cria
"novas vinculações" orçamentárias. O objetivo seria o de exercer
"maior controle dos pagamentos
de programas estratégicos". Menciona-se uma lista de um a 24, justamente as iniciativas prioritárias
do Avança Brasil.
Ainda que bem intencionada,
dizem os empreiteiros, a mensagem do Tesouro concederia poder discricionário aos órgãos que,
na ponta da linha, realizam os pagamentos. Um perigo, sobretudo
em ano eleitoral.
Ouvido, o ministro dos Transportes afirma que as obras sob
responsabilidade de sua pasta estão divididas em listas divulgadas
na Internet. "Aqui e ali corre o
boato de que estão mexendo na
lista", diz João Henrique. "Mas
não se fez nenhum pagamento fora da ordem cronológica. Isso para mim é sagrado".
Resta uma dúvida no ar. Se o
que se deseja não é beneficiar os
24 projetos do Brasil em Ação,
qual o sentido da mensagem do
Tesouro Nacional? Questionada,
por telefone e por escrito, a repartição do Ministério da Fazenda
preferiu o silêncio.
Dinheiro escasso
O passivo do Ministério dos
Transportes é de R$ 700 milhões.
Há faturas de 2001 que ainda não
foram pagas. Desde julho, o governo vem aplicando R$ 200 milhões mensais para tentar desbastar o débito. É como se enxugasse
gelo. À medida que faturas velhas
vão sendo liquidadas, novas contas cruzam os guichês do ministério. "É complicado", resigna-se
João Henrique.
Dinheiro, de fato, é coisa cada
vez mais escassa em Brasília. O orçamento de 2002 prevê gastos de
R$ 26,8 bilhões nos 64 projetos do
Avança Brasil que vinham sendo
considerados prioritários antes
da elaboração da lista que os reduziu a 24. Até julho, emitiram-se
empenhos correspondentes a
55,7% desse total. Mas só 37,4%
foram efetivamente pagos.
Para facilitar o controle gerencial, os 64 projetos foram subdivididos em 237 ações administrativas. Dessas, 31 estavam totalmente paralisadas em julho. As razões
são variadas. A falta de pagamento é uma delas. Há também problemas de natureza ambiental e
indícios de irregularidades detectados pelo TCU (Tribunal de
Contas da União).
Na última terça-feira, encerrou-se um ciclo de reuniões com assessores dos candidatos à Presidência no Ministério do Planejamento. Eles foram apresentados à
filosofia que permeia o Avança
Brasil. Se quiser, o próximo presidente pode virar do avesso a lista
de prioridades elaborada sob
FHC. "Pode, mas não creio que
faça isso", opina José Paulo Silveira. "A receptividade das quatro
assessorias dos candidatos à metodologia foi muito boa".
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