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JANIO DE FREITAS
A imprensa no tribunal
A ocasião é boa para dizermos, todos, quando
e como a imprensa é jornalismo ou não é
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OS INCIDENTES QUE
opuseram a Folha e
"O Globo" e, de outra
parte, ministros do Supremo
Tribunal Federal, vão além
das divergências em torno
da publicação de diálogos e
conceitos embaraçosos de
ministros, sobre o julgamento do chamado mensalão.
Não só ficaram mais conhecidos os ministros e os cenários internos dos julgamentos, sempre tão obscuros para a opinião pública, mas
ainda emergiu alguma discussão sobre a imprensa e
sua função, tão pouco examinadas e debatidas.
A confessada mágoa do
ministro Eros Grau projetou-se, dos ministros que lhe
presumiam os votos (e erraram), para o jornalismo que
fotografou e publicou os
emails que o citavam.
A imprensa recebeu parte
de sua forte reação, lida no
tribunal. Disse, a partir da
afirmação de sua independência: "A sociedade e mesmo a imprensa não o sabem,
mas o magistrado independente é autêntico defensor
de ambos".
A imprensa, além de saber,
tem necessidade vital do
magistrado independente.
Nem mesmo as redações se
dão conta dos malabarismos
feitos a cada dia, já quase automaticamente, mas nem
por isso sem tensões desgastantes, para superar riscos
legais e éticos, de teor ou de
forma, a muito do que deve
publicar. (Jornalistas estão,
em quase todo o mundo, entre as duas ou três comunidades profissionais mais
atingidas por males cardíacos, inclusive como causa de
morte).
Embora mais importante,
o momento seguinte de Eros
Grau passou despercebido.
Mal começáramos a descansar do "estilo" Sepúlveda
Pertence, tão enrolado que
chega a dar nó em frase, Eros
Grau executou um salto triplo sem rede, e a moçada das
redações nem pôde entender: "É mercê da prudência
do magistrado independente que não resultam tecidas
plenamente, por elas mesmas, as cordas que as enforcarão, as elites e a própria
imprensa". O ministro faz
um aviso gravíssimo. Trazido para a linguagem pobre
deste recanto, comunica-nos, em tom definitivo, que a
imprensa e as elites serão
eliminadas por forças que, se
ainda não se entrosaram de
todo para o seu fim, é graças
só aos magistrados independentes.
De certo ponto de vista
que não o da imprensa, foi
providencial a distração das
redações, porque tal advertência por um ministro do
Supremo merecia tratamento jornalístico à altura -e lá
viria mais incidente. Nada
de contrapartida ou equivalência para a opinião do ministro Gilmar Mendes: "Todos os dias julgamos questões sensíveis do ponto de
vista político, e não estamos
preocupados com a opinião
dos senhores". Senhores, no
caso, são os jornalistas.
Há quem veja aí um desprezo insultuoso e uma vazão de soberba. Ainda que a
contragosto, no entanto, a
despreocupação dos ministros dá ou daria ao jornalismo o que a ele mais convém.
O poder, seja qual for a sua
forma nas instituições, não é
destinação do jornalismo, é
objeto dele, é assunto. É para
ser ouvido, fotografado, gravado, investigado, esmiuçado -e desvendado para que
no conjunto social se formem a consciência de cidadania e suas manifestações.
Em um caso, ao menos
um, a situação se complica
entre a ausência total e o excesso de preocupação. O ministro Ricardo Lewandowski que anda por um restaurante a falar, tanto ao telefone como aos ouvidos circundantes, sobre intimidades do
Supremo, é o mesmo a dizer
que "todo mundo [no Supremo] votou com a faca no pescoço". Que faca? A imprensa
que "acuou o Supremo".
Indagado, depois, sobre a
faca, Ricardo Lewandowski
disse: "Falei com relação a
mim". Não, falou em "todo
mundo", por diferentes maneiras, e não se justifica negá-lo. Indagado sobre a afirmação, ao telefone e aos ouvidos dos circunstantes, de
que no Supremo "a tendência era amaciar para o Dirceu", disse: "Primeiro, eu
não sei se usei a palavra
amaciar". Note-se: não negou o sentido da frase, apenas ressalvou a palavra. Não
faria diferença, portanto, se
a palavra fosse abrandar, ou
atenuar, ou relevar, por
exemplo. Onde entra a imprensa?
A exposição extraordinariamente nervosa do seu voto fundamental sobre José
Dirceu foi, logo se veria, o
contrapeso único na resultado de 9 a 1 contra o denunciado. Pareceria até uma
confirmação preventiva da
denúncia de amaciamento,
solitário embora. Logo, o ministro Ricardo Lewandowski fica a dever uma contribuição ao debate, tão necessário e apenas insinuado, sobre a função da imprensa.
Deve o esclarecimento de
pelo menos duas afirmações:
"O que eu senti é que o Supremo foi submetido a uma
pressão violentíssima da mídia / As pessoas [do Supremo] estavam extraordinariamente submetidas à mídia".
A ocasião é boa para dizermos, todos, onde e como "a
culpa é da imprensa". Ou,
como prefiro, quando e como a imprensa é jornalismo
ou não é.
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