São Paulo, domingo, 02 de setembro de 2007

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"O tribunal de opinião pública é importantíssimo", diz ministro

Ele fez a ressalva de que, no entanto, ele não pode comprometer a isenção

DA COLUNISTA DA FOLHA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Carlos Alberto Menezes Direito, que passará a ocupar uma cadeira no STF (Supremo Tribunal Federal) a partir desta quarta-feira, disse que "o tribunal da opinião pública é importantíssimo", desde que não comprometa a isenção dos julgamentos do Poder Judiciário, que devem ser com base na razão, não na emoção.
Direito fez essa afirmação ao ser indagado sobre a decisão do STF de abrir o processo do mensalão, marcada pela troca de e-mails entre os ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia Antunes Rocha e pelo telefonema de Lewandowski, testemunhado pela Folha, em que ele diz que o tribunal julgou "com a faca no pescoço", por pressão da mídia. Ele acredita que as decisões do Supremo no caso do mensalão foram exclusivamente técnicas e dentro das provas dos autos. Sétimo ministro nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro escolhido dentre os integrantes do STJ (Superior Tribunal de Justiça) após 16 anos, Direito sucederá Sepúlveda Pertence, que se aposentou.
Na entrevista, ele criticou a lentidão do processo judicial e defendeu uma profunda reforma na legislação, para simplificar o sistema, que permite dezenas de recursos.

FOLHA - Os 40 denunciados do mensalão se tornaram réus, mas a Justiça é acusada de impunidade quando trata de poderosos.
DIREITO
- Não concordo com a afirmação. Acredito que o sistema processual brasileiro tem inúmeras dificuldades, pela grande quantidade de recursos existentes. É uma lentidão do processo judicial, não é culpa dos juízes. Se uma pessoa entra com uma ação de indenização por danos morais, por exemplo, pode haver 15 recursos só na preliminar [antes do exame do mérito].

FOLHA - O foro privilegiado não é fator de impunidade, até mesmo por eventual falta de vocação dos tribunais superiores, o STJ e o STF, para ações penais?
DIREITO
- Não tenho opinião sobre o foro privilegiado, mas concordo que os tribunais não têm estrutura para manter processos penais originários sem criar alguns mecanismos que aliviem a carga. Um ministro do STJ recebe por mês 1.200 processos. Então a dificuldade não é o foro privilegiado, mas a estrutura disponível.

FOLHA - No julgamento do STF, o tribunal agiu tecnicamente ou jogou um pouco para a platéia?
DIREITO
- Tenho a mais firme convicção de que o STF julgou de acordo com a prova dos autos, dentro de uma perspectiva exclusivamente técnica.

FOLHA - Mas a opinião não influenciou o resultado?
DIREITO
- A nossa liberdade depende muito da nossa capacidade de separar o tribunal da opinião pública do tribunal institucional. No momento em que nos deixarmos levar apenas pelo tribunal da opinião pública, perderemos a condição de julgar com isenção. O tribunal da opinião pública é importantíssimo, mas ele deve ser subordinado ao tribunal institucional formal. Não se pode vincular a razão à emoção. Quando se julga, deve-se julgar de acordo com a lei, só com a razão.

FOLHA - Quando o ministro Ricardo Lewandowski afirma que o STF julgou a denúncia do mensalão com "a faca no pescoço", ele está confessando uma enorme dose de emoção.
DIREITO
- Todo juiz é apenas um ser humano. Temos nossos sentimentos, emoções, medos, angústias, dificuldades. Nenhuma dessas reações humanas pode ser interpretada para o mal. São apenas reações humanas. Todos nós somos iguais, na mesma natureza, com a mesma essência.

FOLHA - O nome do senhor foi citado em e-mails sugerindo que haveria uma troca: ministros rejeitariam a denúncia, e o senhor seria indicado. Essa comunicação entre dois ministros também revelou que o Supremo estaria dividido em grupos.
DIREITO
- Eu não acredito nenhum minuto que tenha havido divisão em grupo do STF. Falei com todos os meus colegas, quero bem a todos eles. Eu li hoje [sexta], no jornal, uma afirmação do ministro Lewandowski de que ele não se referiu a uma troca de voto por nomeação, que se referiu a mudança de voto, de convicção pessoal, o que pode acontecer com todos nós, juízes.

FOLHA - Como o senhor vê o papel da imprensa nos dois episódios: a divulgação dos e-mails e do telefonema no restaurante?
DIREITO
- Não posso responder sobre caso concreto, porque amanhã pode ser necessário que eu venha a julgá-lo. Em tese, a liberdade de imprensa como ação humana está subordinada à responsabilidade civil. Todo aquele que se sente lesado vai ao Judiciário, que vai examinar se houve ou não a lesão. Isso é o princípio da ponderação entre os direitos e garantias individuais e a liberdade de informação.


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