São Paulo, segunda-feira, 02 de outubro de 2006

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JANIO DE FREITAS

Perguntas presentes



A hipótese de que a história do dossiê tenha propósitos diferentes dos supostos até aqui não deixa de fazer sentido


A resposta dos votos não eliminou a segunda interrogação presente na conduta do eleitorado: o terremoto que, no último momento, atingiu o intervalo entre as preferências por Lula e por Alckmin foi provocado pela ausência do candidato-presidente ao debate, na TV Globo, ou pelo sentido ambíguo da exibição do dinheiro destinado, até onde se sabe, a prejudicar José Serra?
A questão é mais relevante do que parece. No caso de influência predominante da falta ao debate, seria a segunda participação determinante desses programas de TV em eleições presidenciais com a participação de Lula. E ambas de conseqüências desfavoráveis a Lula. A primeira delas, o seu debate com Collor, no qual o pobre desempenho que teve foi agravado, em exibições no dia seguinte, por remontagem adulteradora e demolidora feita por um então diretor da TV Globo.
A ausência, agora, foi da sua estrita decisão de "não se submeter aos insultos combinados dos adversários", embora as condições do debate estivessem aprovadas por assessores seus. E previam a repressão a insulto. Mas, vá lá, o insulto feito não seria tirado. Sobreveio então, nos dois dias seguintes, a superexposição na TV e em jornais, em intensidade e em dimensões, de reportagens locais e alegadas repercussões da ausência, como jamais foi feito em relação às ausências de Fernando Henrique nas eleições passadas. Nem agora, por exemplo, em ausência idêntica de Aécio Neves.
Se a falta de Lula ao debate teve influência no movimento do seu eleitorado, isso foi produzido por um programa no portal da madrugada ou pelo volume e modalidade da repercussão que lhe foi dada em quase todos os principais meios de comunicação? O provável é jamais termos a resposta. Nem por isso a indagação deixa de ser útil para considerações futuras sobre o processo eleitoral brasileiro, a relação entre ele, os meios de comunicação e outros aspectos da atividade política, e mais ainda.
Na hipótese de maior influência do dinheiro fotografado, uma constatação é imediata: o contrabando das fotos para jornais e TV, menos de 48 horas antes da votação, teve o intuito de influir na disposição de possíveis eleitores de Lula, ou de Mercadante, ou de ambos. A longa vantagem de Serra torna apenas figurativa a inclusão do Mercadante batido por antecipação. Lula foi o alvo certo. E sua recente hipótese de que toda a história do dossiê tenha origem e propósitos diferentes dos supostos até aqui, na mídia e mesmo na investigação oficial, não deixa de fazer sentido. Claro que esse sentido será logo carimbado de vício da teoria conspiratória -carimbo que é um vício.
Mas o comportamento noticiado, e já bem comentado por Elio Gaspari, do procurador da República em Mato Grosso, Mário Lúcio Avelar, tem conexões esquisitas com declarações e comportamentos do delegado Edmilson Pereira Bruno, que fez, entre outras coisas, a distribuição sub-reptícia das fotos, mentiu negando-a, e terminou por confirmá-la. Foi também em plantão seu, talvez não só por acaso, que se deu a prisão dos que aguardavam, no hotel, a entrega do dossiê (até então, um DVD vazio). Isso, como parte da inexplicada precipitação de prisões em Mato Grosso e em São Paulo, evitando o flagrante, sempre desejado pela polícia e pelo Judiciário, da tal compra e venda do dossiê. A história desta eleição não parece encerrar-se nas votações.


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