São Paulo, sexta-feira, 02 de outubro de 2009

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JANIO DE FREITAS

As concorrências do dia


Na disputa pela Olimpíada de 2016, muita coisa sugere que a vitória verdadeira dos cariocas estará na derrota


AS DUAS CONCORRÊNCIAS que têm no dia de hoje um marco importante -uma como ponto de chegada e a outra como ponto oficial de partida- exibem três aspectos em comum: são controvertidas, têm custos desproporcionais às disponibilidades e não correspondem a necessidades reais. Olimpíada e avião de caça, não sabíamos, são bem parecidos.
Na disputa do Rio pela Olimpíada de 2016, muita coisa sugere que a vitória verdadeira dos cariocas estará na derrota. Olimpíadas exigem gastos monstruosos.
O Pan, de exigências e dimensões insignificantes em comparação com uma Olimpíada, em vez do propalado lucro deixou um fundo rombo no Rio, no Estado do Rio e no governo federal. Com esse montante jamais informado à sociedade pelos três governos, deixou também um rastro de falsos orçamentos, superfaturamento e gastos injustificáveis que ficaram na mais absoluta impunidade, mesmo nos casos comprovados pelo Tribunal de Contas da União ao fim de dois anos de protelação. E vários dos responsáveis pelo Pan são agentes da Olimpíada. Só para chegar à decisão de hoje em Copenhague, a estimativa é que já foram gastos entre R$ 150 milhões e R$ 200 milhões, o que já oferece pistas em diversos sentidos.
O Estado do Rio não tem dinheiro para bancar a sua parte em uma Olimpíada, como evidenciam as infinitas necessidades, gritantes na maioria, para as quais também não tem. Entre o disponível e as necessidades, a situação da Prefeitura do Rio não é melhor.
A Olimpíada significa, portanto, dois efeitos simultâneos sobre as duas administrações: deslocamento de verbas para os altíssimos custos e endividamento a comprometer fluminenses e cariocas por longo período. E essas obras de Olimpíada não trariam para o Rio as melhorias alegadas, porque nada têm a ver com as necessidades prioritárias. Assim como, para a cidade, as tais melhorias a serem deixadas pelo Pan só deixaram gastos.
Os quase dez meses de Eduardo Paes têm dado à administração da cidade movimentação e atenções que havia muito não se viam. Ainda nem tanto em termos de resultado, mas de clima, esse é um fator muito positivo que, em vez de ampliar-se para provocar uma grande virada, seria interrompido, pela concentração de todo o empenho municipal na preparação da Olimpíada.
E, cá entre nós, depois da grandiosidade e da beleza estupenda da Olimpíada na China, a pretensão de fazer uma por aqui não é ideia das mais equilibradas, não. Mas interesses, é claro, são outra história.
Os nossos atletas dos negócios olímpicos foram-se para as alturas do Hemisfério Norte e de lá vieram os representantes da Boeing, que fica no extremo noroeste dos Estados Unidos, e da Saab, que é na Suécia. Estes, mais do que para fazer hoje a entrega das propostas de seus caças, por preocupação com as reiteradas manifestações do governo brasileiro pelos aviões franceses. Já os representantes da Dassault -messieurs Sarkozy, Lula e Jobim- estão despreocupados até da queda em má hora de dois dos seus produtos. Na expressão sucinta e grossa de monsieur Jobim, "não tem a ver", e ponto.
Mas tem. Nelson Jobim diz que a intenção é dar tudo por resolvido em dezembro. Encerra-se o prazo das propostas, porém, sem que a recente queda de dois caças da Dassault (Rafale) esteja explicada. O choque por erro humano é apenas presunção. A qual não exclui a hipótese, por exemplo, de que um súbito defeito levasse um dos caças a chocar-se com o outro, nos retornos que faziam juntos para o pouso. E não é pouco estranho que os radares do porta-aviões Charles de Gaulle não tivessem registrado o choque dois caças, capaz de explicar ao menos o tipo de movimento que o causou. Sem esquecer que esse novo avião teve mais uma queda, em dezembro de 2007, também sem causa divulgada.
Tudo tem a ver em uma competição limpa, e atenta para os interesses legítimos do país. Seja pensando em confronto esportivo ou confronto bélico.


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