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"Corrupção tem no mundo inteiro", afirma Chinaglia
Novo presidente da Câmara diz que combate a fraudes é difícil e que aceita sugestões
Petista quer levar a votação no plenário já na próxima semana o aumento dos salários dos deputados
pela inflação, para R$ 16.700
Lula Marques/Folha Imagem
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Presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, em entrevista à Folha |
FERNANDO RODRIGUES
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em sua primeira reunião político-administrativa como
presidente da Câmara, na próxima terça-feira, Arlindo Chinaglia (PT-SP) quer definir
com os líderes partidários o aumento dos salários dos parlamentares. "Se a pauta permitir,
na primeira semana [colocarei
em votação no plenário]." A
pressa, diz ele, é porque deseja
"ficar livre desse assunto."
Indagado se a iniciativa não
teria repercussão negativa, disse que talvez vote antes algum
outro tema importante. Mas
insistiu que pretende aprovar
em fevereiro o projeto que elevará o salário dos deputados
dos atuais R$ 12.750 para cerca
de R$ 16.700 -um reajuste que
aplicará a inflação do período.
Chinaglia diz não guardar
mágoas do processo eleitoral.
Mas não consegue esconder
ressentimentos em relação ao
presidente reeleito do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL),
que teria trabalhado por Aldo
Rebelo (PC do B-SP).
A seguir, trechos da entrevista concedida ontem à Folha:
FOLHA - A associação do seu nome
ao do ex-deputado José Dirceu durante a campanha o incomodou?
ARLINDO CHINAGLIA - Evidente
que incomodou. Foi uma estratégia de explorar e aumentar
aquilo que ficou definido como
antipetismo. É uma falsa questão, ninguém sabe onde está a
proposta de anistia do José
Dirceu. Ele já declarou que vai
batalhar pela anistia. É direito
dele. Se alguém apresentar um
projeto de lei, vai tramitar.
FOLHA - O presidente da Câmara
tem poder para ajudar a emperrar
ou não a tramitação de um projeto.
CHINAGLIA - O que vou responder de forma definitiva é: eu
não vou patrocinar qualquer
mudança que fira o que já disse.
Ou seja, é de responsabilidade
de quem apresentar. Não vou
interferir, não vou patrocinar.
FOLHA - Nem ajudar, nem atrapalhar?
CHINAGLIA - Exatamente. Por
que eu vou ter uma atitude de
ajudar ou atrapalhar fazendo
uma seleção isolada, individual,
usando o cargo de presidente
para fazer política nesse nível?
Esse é um tema evidentemente
menor frente à constelação de
interesses do país.
FOLHA - Se o projeto chegar ao plenário, o sr. vota a favor?
CHINAGLIA - O presidente não
vota. Mas imagino que no PT o
José Dirceu deverá ter muitos
votos, a maioria.
FOLHA - Na cassação dele, o sr. votou para cassar ou absolver?
CHINAGLIA - Não abri nenhum
voto em qualquer circunstância e não vou abrir agora.
FOLHA - No seu discurso o sr. disse
que tem de resgatar a autoridade da
Câmara.
CHINAGLIA - A sociedade desconfia do Congresso, o que não
é bom. Resgatar a autoridade é
trabalhar, estabelecer o que é
importante para o país, a partir
das necessidades de sua população. Essa é uma parte. A outra
é que não temos nenhum compromisso com o erro. Qualquer
um, inclusive eu, que vier a cometer qualquer erro tem de ser
analisado e julgado individualmente. Mas quando for um caso grave, em que o deputado for
atingido irremediavelmente e
aquilo se provar uma calúnia,
tem que dar o espaço para que
ele recupere a sua condição.
FOLHA - Como fazer isso?
CHINAGLIA - Difícil, muito difícil. O que os deputados mais reclamam é que são julgados e
condenados sem direito a defesa, do ponto de vista de imagem. É importante não aceitar
críticas que se revelarem injustas, algo que generalize o ataque à instituição. Conspira
contra a democracia.
FOLHA - A última legislatura foi
marcada por vários escândalos, como mensalão, sanguessugas. Qual
será a ação concreta para evitar a
reincidência desses casos?
CHINAGLIA - A maior responsabilidade da má imagem é de
componentes da legislatura
passada. Contra isso, não há o
que reclamar. Foram cometidos delitos graves. Esperar que
a sociedade julgue de forma diferente é impensável. O Legislativo deve estar à altura da sua
tarefa e não cometer esse tipo
de erro. A Comissão de Orçamento já produziu alterações
nesse sentido: um deputado
não fica dois anos seguidos na
comissão. Fica apenas um ano.
FOLHA - Nos últimos anos também
foram prometidas medidas moralizadoras, mas os casos se repetiram.
CHINAGLIA - Tem de haver a vigilância da sociedade sobre os
processos licitatórios. O pregão
eletrônico pode ser algo que
ajude a combater as fraudes.
Mas chega num limite em que
não há quem possa controlar,
vamos falar claro, porque corrupção tem no mundo inteiro.
É algo feito nas sombras, na escuridão. É uma tratativa pessoal. Muitas coisas só são descobertas por acidente. É muito
difícil você controlar. Não sei
como fazer, gostaria de saber.
Se vocês tiverem idéias, eu serei todo ouvidos.
FOLHA - Na sua campanha, o sr. declarou ser a favor de mais transparência na prestação de contas dos
deputados sobre a verba indenizatória de R$ 15 mil mensais. Uma medida é divulgar as notas fiscais dessas despesas. O que o sr. fará?
CHINAGLIA - A minha posição se
mantém. Se o presidente puder
tomar a decisão, tomarei. Se tiver de submeter à avaliação da
Mesa, vou fazer isso. Você pode
identificar o valor da nota, o seu
número e o CNPJ.
FOLHA - Poderá tornar público o
acesso à nota fiscal?
CHINAGLIA - Isso eu não sei. Eu
creio que o acesso a documentos da Câmara deva ser só de
funcionários. Se houver dúvida
no trabalho de quem tem a responsabilidade de fiscalizar, nós
temos de corrigir.
FOLHA - Não há um recuo nessa
sua decisão?
CHINAGLIA - Não, não tem. Se a
Mesa Diretora decide sem haver uma costura política a respeito de a mídia, ou quem quer
que seja, ter acesso aos documentos, seguramente haverá
uma reação na linha de que a
privacidade está sendo violada.
FOLHA - Mas o sr. se compromete a
defender a divulgação do CNPJ, o
valor e a data do gasto de deputados com verbas indenizatórias?
CHINAGLIA - Isso sim, claro.
FOLHA - A sociedade acha que os
deputados trabalham pouco. Como
tratará esse tema?
CHINAGLIA - Ontem eu cogitei
de chamar uma sessão deliberativa para segunda-feira. Um
assessor não recomendou. Vai
convocar, não vai acontecer e
eu me desmoralizaria. O importante é ter um plano que seja útil e possível. Pretendo fazer
as sessões deliberativas às terças, quartas e quintas. Às sextas, vamos pautar para o debate
temas relevantes.
FOLHA - Mas a "semana de deputado" de terça a quinta continua?
CHINAGLIA - Isso sempre me incomodou. Eu trabalho sete dias
por semana, pois há uma realidade inescapável. Tenho de ir
ao meu Estado para fazer política. Não existe essa de deputado ficar em casa, sem fazer nada. Quem faz isso não é eleito.
FOLHA - O sr. defende a reposição
da inflação nos salários?
CHINAGLIA - Exato.
FOLHA - Quando vai propor esse
reajuste para parlamentares?
CHINAGLIA - Vou chamar uma
reunião com os líderes [dia 6].
Vou dizer que colocarei em plenário. Se a pauta permitir, na
primeira semana. Quero ficar
livre desse assunto.
FOLHA - Com o reajuste pela inflação, o valor ficar entre R$ 16 mil e R$
17 mil. Não haverá desgaste?
CHINAGLIA - A sociedade entende que o deputado não é um cidadão comum. Ele tem poder
de representação e tem poder
para decidir sobre a vida das
pessoas. Não creio que a sociedade tenha uma visão vingativa
contra os parlamentares. O que
a sociedade exige, com razão,
são atitudes à altura do cargo.
FOLHA - Mas a leitura só pode ser:
na primeira reunião da nova Mesa
se tratou do aumento.
CHINAGLIA - É um bom alerta.
Talvez eu até reveja. Talvez a
gente deva votar alguns temas
importantes antes. Mas não
quero ficar com essa pauta arrastada. Vai ser votado em fevereiro.
FOLHA - Como o sr. vai se relacionar com Renan Calheiros, que preferia a vitória de Aldo Rebelo?
CHINAGLIA - Institucionalmente. Eu não guardo mágoas. Prefiro trabalhar na política.
FOLHA - Houve interferência do Senado na eleição da Câmara?
CHINAGLIA - Claro. O Renan.
Era muito comentado. Embora
ele tenha negado para mim e
soltado uma nota.
FOLHA - O sr. não acreditou?
CHINAGLIA - Eu acreditei, mas a
equipe dele, é público e notório,
estava trabalhando para o Aldo.
FOLHA - O sr. derrotou Lula? Ele inicialmente preferia o Aldo Rebelo.
CHINAGLIA - Quem disse isso?
Eu nunca ouvi. Você imagina se
o presidente Lula tivesse jogado o seu peso contra a minha
candidatura? Eu teria perdido.
Eu gostaria que tivesse ajudado. Mas não teria sido prudente
do ponto de vista institucional.
Por essa razão, ele não entrou.
FOLHA - E o José Serra, ajudou?
CHINAGLIA - Não. Quando surgiu o noticiário de que haveria
interesses cruzados, até desmarquei uma conversa com ele.
FOLHA - Os tucanos paulistas que
votaram no sr. derrotaram FHC?
CHINAGLIA - Acho que Fernando Henrique não apoiou propriamente o Aldo. Ele quis ganhar tempo.
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