São Paulo, terça-feira, 03 de abril de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JANIO DE FREITAS

O descontrole

A desmilitarização não é mágica. Ou será um processo racional ou será um misto de bagunça e leviandade

A MELHORA DA situação nos aeroportos contribuiu para a aparência menos inquietante da crise, mas o ambiente e as tendências nos círculos ressentidos contrariam aquelas aparências, com novos motivos de contraposição, com os reflexos na Marinha e no Exército e, ainda, com o acréscimo de um fato de enorme gravidade -o abandono da direção do controle aéreo pela FAB, deixado em mãos dos funcionários subalternos.
Com tal atitude, altiva como resposta à desautorização dos comandos da Aeronáutica por Lula, em termos funcionais a FAB criou ou aumentou o risco de acidentes aéreos, risco a que ficam sujeitados milhares de pessoas. O controle aéreo não pode ter eficácia, nem mesmo a minimamente indispensável, sem as funções de coordenação, direção e relações autorizadas com os setores complementares, por exemplo, de apoio em informática, em comunicações e de material.
Em termos militares, o abandono do serviço implica a oficialidade e seu comando na recusa a atividade que lhe está atribuída pela legislação. É ilegalidade equivalente à dos seus subordinados grevistas. Se o Ministério Público Militar entrou, como lhe compete, com pedido de inquérito policial-militar contra os sargentos insubordinados, o que lhe cabe quanto aos responsáveis pela atividade de controle não é, por princípio, diferente.
A contribuição negativa de Lula persiste com declarações de rearrumação da face. E tem, hoje, um dia que suscita expectativas entre os controladores: a terça-feira foi o dia marcado por Lula, em afirmações ainda nos Estados Unidos, para apresentar "a solução definitiva" da crise. Como poderia fazê-lo, com tantos problemas diferentes envolvidos na questão, não se pode sequer imaginar. Além da data-chave, ficou marcada para hoje uma reunião de representantes do governo e dos controladores.
Embora tenham abrandado sua atitude pública, inclusive retirando a chantagem de nova greve na Semana Santa, os controlores se dispõem a manter hoje as exigências de desmilitarização apressada do controle. Mas a desmilitarização não é mágica. Ou, no caso, será um processo racional ou será um misto de bagunça e leviandade. Não há muito o que os satisfaça de verdade, a esse respeito, na promessa inconsciente de Lula.
A propósito de reunião, uma outra deu indicação clara de reflexos da crise nos outras dois segmentos militares. Reunião convocada por Lula para ontem contaria, na informação palaciana, com os ministros Dilma Rousseff, Waldir Pires e Paulo Bernardo e, comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Juniti Saito. A meio do dia, chamados para conversar com Lula passaram a ser os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.
A crise ainda não adquiriu clareza alguma. O governo não se mostra menos aturdido do que se viu em suas primeiras e mal conduzidas reações. As partes em confronto direto não apresentam sinal de possível composição entre seus objetivos. O que se percebe é uma série de problemas a se projetarem com estilhaços explosivos no futuro. Como a contradição entre a previsível sentença punitiva dos controladores, pela Justiça Militar, e a promessa de Lula de que a greve não levaria a punições. Ou as previstas dificuldades da indispensável colaboração da Aeronáutica para a desmilitarização eficiente do controle, caso Lula não a relegue para recompor suas relações com os militares. E assim há várias.
Mas se o ônus deixa de recair sobre milhares de pessoas alheias às causas da crise, já é alguma melhora. Bem, não alguma, senão a única.


Texto Anterior: Religião: Senado aprova dia de Frei Galvão
Próximo Texto: Serra critica ambientalistas e prefeito do PT
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.