São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / TENDÊNCIAS DO VOTO

Voto nulo cai, mas atrai cético politizado

Parcela de eleitores disposta a votar nulo ou em branco diminuiu pela metade desde agosto de 2005, no início da crise do mensalão

Anarquistas "e inimigos do sistema" ganham reforço de desiludidos com o PT e usam internet para difundir suas idéias e se organizar

FÁBIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma pergunta ronda a campanha eleitoral: se a percepção de que cresce o número de eleitores dispostos a anular o voto no mês que vem não encontra respaldo nas pesquisas, de onde ela surge, afinal?
A primeira e mais óbvia resposta, de que a massificação da internet entre o eleitorado mais esclarecido e o surgimento do Orkut -site de relacionamentos que concentra cerca de 300 comunidades sobre o assunto- ampliaram a troca de informações entre os descontentes ajuda a entender, mas não dá conta do paradoxo.
O percentual de eleitores dispostos a votar nulo ou em branco para presidente caiu gradativamente desde o mensalão. O índice chegou a 10% em agosto de 2005, auge da crise, mas hoje é de 5%. Mas a percepção não diminuiu, a ponto de o Tribunal Superior Eleitoral fazer uma campanha contra o nulo.
Um mergulho nos movimentos que pregam a anulação revela um dado que talvez seja a novidade desta eleição, e, de quebra, a chave para compreender o fenômeno: produto de desencanto com o PT e com a classe política em geral, o cético eleitoral de 2006 parece mais politizado e propositivo.
Não que anarquistas e inimigos do sistema em geral tenham desistido de pregar. Mas a eles juntou-se um grupo que já votou antes e pretende voltar a fazê-lo, desde que sob novas regras e novos políticos.
Criado por estudantes da USP há um ano para protestar contra o mensalão, o movimento Brasília 17 organiza reuniões e atos públicos em favor do voto nulo. Já tem dez comitês espalhados pelo Estado de São Paulo, somando 150 pessoas.
"Em todos os encontros há a cobrança para que a gente avance para uma forma de organização política. Não somos contra os partidos, mas contra esse modelo falido", afirma o formando em arquitetura Alexandre Bonoit, 26 anos, que já votou no PT e no PSTU.
O Brasília 17 não sabe ao certo que modelo traria esse avanço. "Talvez inspirado nos sovietes pré-Revolução Russa, grupos organizados de participação. Algo que não seja burocratizado e dê voz às pessoas."
Um dos precursores do agito pelo voto nulo na internet, o Movimento Brasil Nova Era, que deu origem à comunidade MobilizAÇÃO Voto Nulo (com 32 mil integrantes no Orkut), surgiu em 2004 sob a bandeira da democracia direta.
"Defendemos a extinção dos partidos e do político profissional. O que temos mais próximo disso é a Suíça. Aqui, as pessoas que gostariam de participar da política mas não querem sujar as mãos não podem, porque têm que comprar legenda", diz o advogado Homero Moutinho, 57, fundador do grupo.
Um dos seu seguidores é o estudante paulistano Lourenço Zein, 16. "É meu primeiro voto, e vou anular. Não sou anarquista, sou democrata e me apaixonei pela democracia direta. Estou nessa para tentar mudar esse sistema político corrompido e um dia poder votar."
A campanha do Movimento Anule Seu Voto, com site na internet e comunidade no Orkut, pede o fim do voto obrigatório. "Nascemos do mensalão. Não quero ter que votar no menos pior. Mas é uma situação momentânea. Eu quero voltar a acreditar", diz o comissário de bordo Carlos Rodrigues, 30, criador do grupo e ex-eleitor do PT e de Ciro Gomes.


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