São Paulo, domingo, 03 de dezembro de 2006

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Coalizão de Lula constitui "saco de gatos", diz analista

Para Octavio Amorim, excessiva heterogeneidade ideológica é limite para governo

Professor da FGV afirma que nomeações comprometem uma parte da capacidade gerencial do Estado, mas são "sacrifício necessário"

FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo Lula está fadado a montar uma coalizão tipo "saco de gatos", o que comprometerá parte da capacidade gerencial do Estado, afirma o cientista político Octavio Amorim Neto, professor da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro.
O Palácio do Planalto terá de contar, sim ou sim, para ter uma base confortável no Congresso, com o apoio de PP e PTB, além dos partidos que já toparam integrar a coalizão.
"Um limite importante para Lula é a excessiva heterogeneidade ideológica com que tem de contar", diz Amorim, que acha positivo que o termo coalizão, usado pelos cientistas políticos, tenha entrado para o jargão político. Apesar do limite, ele vê "Lula indo na direção correta, ao contrário do primeiro mandato", um desastre em termos de relação entre Executivo e Legislativo, que desaguou no escândalo do mensalão. "A história que o Roberto Jefferson contou é muito plausível à luz de tudo que a ciência política brasileira fala a respeito do presidencialismo de coalizão."
Mas, para que a coalizão neste caso mereça o nome, algumas condições têm de ser cumpridas, entre elas a discussão de uma agenda comum e a partilha dos ministérios de maneira proporcional ao peso parlamentar dos aliados: "A questão não é só montar o saco de gatos, mas montar bem desta vez. Há um gato muito grande e gordo lá dentro que é o PMDB, que tem de ser bem alimentado".
Os peemedebistas aprovaram a adesão ao governo Lula nesta semana. Pleiteiam seis cadeiras do gabinete do segundo mandato e se acotovelam com os petistas por espaço, outro foco de problemas. O professor argumenta que não é só jogo de cena a questão da discussão de agenda. "Alguns partidos têm a agenda programática mais robusta. Outros, como o PMDB, gostam de ter pelo menos poder de veto sobre o que entra na pauta de votação".
Amorim afirma que a acomodação dos aliados "pode comprometer a capacidade gerencial do Estado porque os partidos brasileiros, talvez com algumas exceções, não têm quadros técnicos de alta qualidade nem a burocracia brasileira é plenamente profissionalizada".
Mas trata-se de um "sacrifício necessário" para ter apoio estável. A situação só muda, diz ele, se os cargos comissionados forem amplamente reduzidos e o número de partidos, também.
Amorim também se opõe a simplificar a discussão sobre fisiologia e loteamento. "A palavra fisiologia às vezes é apropriada e às vezes não é. O fato é que, mesmo que um partido privilegie seu programa -se ele quer ser mais ideológico do que fisiológico-, para implementá-lo, vai precisar ocupar cargos."
Isso decorre do enorme poder do Executivo brasileiro sobre os recursos. Já nos EUA o Orçamento desenhado pelo Congresso é o que vale. "Para um político americano ter influência nas políticas, não é condição necessária que ele tenha cargo no Executivo. Basta ele ter peso no Congresso."
Mas o PMDB pode ser um aliado confiável? Dados do Núcleo de Estudos do Congresso, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), mostram que o comportamento do PMDB é um dos mais erráticos em termos de disciplina partidária. Mas, para o coordenador do núcleo, Fabiano Santos, os peemedebistas estão conscientes de que, unidos, terão maior poder de barganha. "Sabem que vai ser um bem coletivo se conseguirem se unir de fato. Claro que já há dissidências de saída, mas é difícil prever o peso delas no plenário", diz Santos, que aposta em taxas de disciplina próximas às do governo FHC, visto como "paradigma" de coalizão.


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