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BANCO NOROESTE
Descoberta de US$ 240 mi em agência das ilhas Cayman surpreende o departamento de contabilidade
Controles internos eram "de botequim'
da Reportagem Local
A julgar pelo depoimento dado à
polícia por Jayme Marques de Souza, diretor-gerente com 33 anos de
Noroeste, os controles do banco se
assemelhavam à contabilidade de
um botequim.
Souza disse que, no final de 1997,
o departamento de contabilidade
se surpreendeu ao descobrir US$
240 milhões disponíveis na agência Cayman.
Foram então solicitadas explicações a Nelson Sakagushi. Passados
vários dias sem que aquele diretor
atendesse à determinação, outro
diretor, Pedro de Carvalho, cobrou
novamente a entrega do relatório
solicitado.
Após alguns dias, Souza cobrou
Sakagushi novamente, de forma
áspera, segundo contou.
Nem tudo, aparentemente, estava perdido. Otávio Valero, que assistia ao diálogo, disse a Souza que
o tal relatório dependia de alguns
documentos de suporte que estavam na casa de Sakagushi.
Diante desse fato, Souza e Sakagushi entraram numa sala reservada. Sakagushi lhe disse, então, que
faltavam documentos relativos a
algo em torno de US$ 9 milhões a
US$ 12 milhões, mas que a referida
quantia iria retornar ao banco. E
que ele traria, no dia seguinte, os
documentos que dariam suporte a
esses valores.
"Muito preocupado" (sic), Souza
"imediatamente" (sic) levou o fato
ao conhecimento dos demais diretores e à vice-presidência.
Então, determinou que a Price e a
auditoria interna fizessem um "levantamento minucioso".
Marcos Ribeiro, que era chefe de
câmbio e trabalhou sob a gestão de
Sakagushi, disse que, entre 1995 e
1997, recebeu determinações verbais de Valero e Danilo Mainente
(um auxiliar de câmbio) para realizar lançamentos na contabilidade
da agência Cayman.
Alegando sua condição de formado em ciências contábeis, disse
ao delegado não saber explicar o
motivo dos auditores da Price não
terem apurado o desfalque, pois
bastava fazer uma conciliação das
contas e seria constatada a diferença no patrimônio do banco.
Por sua vez, Mainente afirmou
que a única pessoa que lhe determinava fazer transferências para o
exterior, sem o suporte de documentos, era Sakagushi.
²
Pista de decolagem
Com um rigor contábil desses,
não surpreende a versão de que a
maior parte dos recursos desviados do Noroeste se destinava a um
projeto de aeroporto na Nigéria.
São conhecidos os casos de golpes aplicados em empresários por
nigerianos. A literatura policial,
contudo, não registra perdas com
o volume sofrido pelo Noroeste.
A ex-secretária de Sakagushi
Akiko Inoue disse que, durante
dois anos, seu chefe fez ligações
para personagem identificado só
como "Excelência".
Como ela nunca soube qual era o
nome real de "Sua Excelência", decidiu catalogar o número do telefone na letra "R" de sua agenda,
pois quem atendia era um tal de
Rachid.
Até o último mês em que trabalhou no Noroeste, Akiko atendeu
ligações de "Sua Excelência".
O ex-gerente de auditoria interna
do banco José Luiz Teixeira Pinto
disse que lhe coube apurar a dimensão do rombo e o "modus
operandi", trabalho que considerou extremamente desgastante e
que durou algo entre quatro e cinco meses.
Pinto concluiu que Sakagushi
subtraiu exatos US$ 242,53 milhões. Desse total, US$ 190 milhões
saíram da agência Cayman por
meio do sistema "swift" (transferência eletrônica). Algo em torno
de US$ 20 milhões saiu em fichas
de caixa, e cerca de US$ 8 milhões
foram usados em operações de arbitragem de moedas (operações
especulativas de compra e venda
de moedas em praças diferentes).
O restante (cerca de US$ 24 milhões) correspondia a lançamentos contábeis falsos, registrados
como receita da agência Cayman,
para mascarar o desvio.
²
Questão de fé
Segundo Pinto, Sakagushi lhe
confirmara que US$ 12 milhões haviam sido entregues a uma "mãe-de-santo", a título de "oferendas",
por serviços prestados de proteção
espiritual ao banco e a alguns diretores da instituição.
Trata-se de Maria Rodrigues da
Silva, "guia espiritual" que também foi ouvida pelo delegado Múcio Alvarenga, responsável pelo
caso.
Leocádio Rocha, um diretor que
trabalhou no Noroeste durante 40
anos, disse ter presenciado Sakagushi afirmar que os US$ 242 milhões retornariam em 72 horas. E
que os recursos que haviam sido
dados como "oferendas" a uma
"mãe-de-santo" -retirados da
agência Cayman- não retornariam.
Em seu depoimento, Sakagushi
negou que as oferendas fossem
além de doações para a compra de
velas e outros objetos litúrgicos.
Carlos Montone, ex-diretor de
tesouraria, também confirmou
que Sakagushi lhe havia dito que as
oferendas espirituais tinham o objetivo de proteger o banco e os seus
dirigentes.
Exceto o depoente, que não necessitava de ajuda espiritual, conforme ressalvou Montone no inquérito.
(FV)
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