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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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Governo comete estelionato eleitoral, diz sindicalista

PATRICIA ZORZAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Presidente do Sindilegis, o Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do Tribunal de Contas da União, Ezequiel Souza do Nascimento afirma que a proposta de reforma da Previdência do governo Lula representa um ""estelionato eleitoral".
""É uma reforma que não é a reforma do PT eleito, mas a derrotada nas urnas no ano passado. Infelizmente", afirma o sindicalista.
Crítico da tributação de inativos, medida que diz considerar ""uma imensa e hedionda covardia", e da relação da CUT (Central Única dos Trabalhadores) com o Executivo petista, Nascimento declara ainda não confiar no ministro Ricardo Berzoini (Previdência) e diz que greves não estão descartadas. Leia a entrevista.
 
Folha - O que os sindicatos farão contra a proposta de reforma da Previdência do governo?
Ezequiel Nascimento
- Existe uma quantidade de sindicatos que são absolutamente ligados ao PT e estão tendo uma atitude meio que de proteger o governo contra as suas próprias bases. Nós não somos ligados à CUT. Estamos batendo firme. Eu mandei um pedido de auditoria ao Tribunal de Contas da União pedindo auditoria contábil, financeira, patrimonial e operacional. Porque o [ministro da Previdência, Ricardo" Berzoini não possui tantas gravatas quanto números. Todo dia ele troca de números.

Folha - Eles são contraditórios?
Nascimento
- Já fui a algumas reuniões com o Berzoini. Saio dessas reuniões com aquela sensação que tenho quando vejo uma moça bem bonita de biquíni. Ela me mostra um monte de coisas, menos o essencial, o que quero ver. O Berzoini faz isso. Mostra uma penca de números, que às vezes a gente fica até embasbacado, como fica com as curvas, mas não mostra o que a gente quer ver. E a cada reunião que ele vai, apresenta números diferentes.

Folha - Os servidores estão sendo responsabilizados?
Nascimento
- Essa é a lógica que o ministro da Previdência colocou para a sociedade. Ele satanizou os servidores. Eu confio tanto no Berzoini quanto confio no Coringa do Batman.

Folha - É uma decepção?
Nascimento
- Imensa. Imensa. É uma reforma que não é a reforma do PT eleito, mas a derrotada nas urnas no ano passado. Infelizmente. O governo está, sob o manto do apoio popular e da esperança, ressuscitando uma reforma derrotada e enterrada. Pelo menos imaginávamos isso naquele momento [da eleição".

Folha - A que o sr. atribuiu essa atitude do PT?
Nascimento
- Ainda quero acreditar que isso seja por pressões do sistema financeiro internacional, do mercado. Porque criar um fundo de previdência complementar para o servidor significa juntar talvez todos os fundos de pensão. Esse recurso terá de ser aplicado e é nisso que o mercado está de olho. Sendo público ou não. Não quero acreditar que esse seja o PT real e que mentiu para nós o tempo todo porque queria conquistar o poder.

Folha - Quais os principais pontos de discórdia com o governo?
Nascimento
- Taxação de inativos, fim de regras de transição, que se faça isso imediatamente. Que eles criem mecanismos de compensação no tempo.

Folha - Está faltando discussão com a sociedade?
Nascimento
- Não houve discussão nenhuma. Há um arremedo, e já fui a algumas [reuniões". Coloca um bando de sindicalistas em um auditório, o ministro começa a passar coisas no computador e fica um bando de sindicalista com cara de besta e boca aberta vendo uns números. É a mesma coisa, se você tiver um pouco de inteligência, que você fica em relação à mulher de biquíni. Antes disso ele [o ministro" já diz que só vai poder responder a duas ou três perguntas e vai embora. Essa é a discussão com a sociedade.

Folha - Pelas ligações históricas entre o sindicalismo e o PT, está mais difícil discutir a proposta?
Nascimento
- Está sim. Esse comportamento dos dirigentes sindicais, que mesmo com esse estelionato eleitoral cometido continuam mais representando o partido a que pertencem do que as categorias, desarma segmentos importantes do funcionalismo. Estamos identificando entre os dirigentes quem está contra a condução da reforma.

Folha - A CUT, tradicionalmente mais ligada ao PT e aos servidores, tem sido crítica o suficiente?
Nascimento
- [A CUT" faz mais ou menos um tapinha nas costas e vende como se fosse um míssil. Está light demais. Não é a velha CUT que a gente conhece.

Folha - Pela ligação com o PT?
Nascimento
- Direto.

Folha - Mas haverá uma troca de direção em junho.
Nascimento
- Vai piorar. Está trocando a direção justamente porque ainda tem crítica. O atual presidente [João Felício" é servidor. O outro [Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que deve ser eleito" não. E a CUT está criando fundos de pensão em vários sindicatos.

Folha - Existe a possibilidade de greve para combater a proposta de reforma da Previdência?
Nascimento
- Também. Tenho a impressão de que, com esse 1% [aumento concedido pelo governo para o funcionalismo", que mais parece uma péssima brincadeira, uma chacota, um escárnio, mais a reforma da Previdência... Porque o governo mediu o seu poder, a sua capacidade de organização, quando ganhou no Congresso [a regulamentação fatiada do artigo que trata do sistema financeiro internacional".

Folha - Greve é a última opção?
Nascimento
- É uma opinião minha. Greve é a bomba máxima que a gente tem, é o instrumento final. Porque a greve atinge fundamentalmente a população.

Folha - O sr. disse que as lideranças sindicais são ligadas ao PT e à CUT. Mas e as bases?
Nascimento
- Estão indignadas. Muitíssimo. Sentem-se traídas.

Folha - Será fácil mobilizá-las?
Nascimento
- Tenho impressão de que sim. E, se esses dirigentes continuarem nessa postura, alguns acho que já estão mudando, as bases vão atropelá-los.



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