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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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VESTÍGIOS DO ARAGUAIA

Documentos reforçam os indícios de que restos pertencem a João Hass Sobrinho, morto na guerrilha

Arquivo indica que ossada pode ser de médico

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Documentos inéditos sobre a guerrilha do Araguaia obtidos pela Folha reforçam indícios de que uma das 11 ossadas que estão em Brasília à espera de identificação seja a do médico gaúcho João Carlos Hass Sobrinho.
Os documentos, datilografados com o cabeçalho "Documento apreendido pela 3ª Brigada de Infantaria de Terroristas que agem a região SE do Pará", estão organizados em anexos dispostos em ordem alfabética. Integram os arquivos do general Antonio Bandeira, que comandou as ações militares no Araguaia em 1972.
A suposta ossada de Hass foi descoberta em um cemitério em Xambioá, em 1996, e trazida para Brasília juntamente com outras quatro. Duas delas foram devolvidas ao local em fevereiro passado e enterradas depois que um laudo de peritos argentinos descartou a possibilidade de pertencerem a guerrilheiros. Batizada de X2, a ossada tem o osso da perna direita quebrado na altura do joelho.
Entre os documentos do arquivo de Bandeira, existe uma carta do guerrilheiro Flavio, codinome de Ciro Flávio Salazar Oliveira, destinada aos pais e que nunca chegou, na qual ele relata como Hass foi alvejado.
Flavio e outros três guerrilheiros estavam em uma missão especial comandada por Hass. Precisavam encontrar "camaradas" que, fugindo de um ataque militar, embrenharam-se na mata sem deixar rastro.
Em uma emboscada, Hass "tinha levado dois tiros na perna". Flavio conta que só soube do ferimento do "comandante" depois de andarem 500 metros em meio a um cipoal. "Este tempo todo não tinha dito uma única palavra sobre o ferimento".
Outro anexo reproduz a caderneta de anotações de um dos guerrilheiros, provavelmente do próprio Hass, hipótese que pode ser levantada tanto pelas descrições quanto pela coincidência de datas. As anotações se encerram em 25 de setembro. Hass foi morto por militares em um combate em 30 de setembro de 1972.

Emboscada
Integrante do comando militar da guerrilha, Hass descreve a emboscada na qual provavelmente sofreu os ferimentos na perna, em 25 de junho de 1972, detalhando quantidade de armas e formação de ataque do "inimigo".
Cinco dias antes, registra "a campanha de propaganda do inimigo", frisando que os militares difundiam a idéia de que os guerrilheiros haviam sido treinados em Cuba e que, se ganhassem a guerra, "o povo vai sofrer muito -cego e aleijado morrem em nossa [dos guerrilheiros" lei".
A Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada ao Ministério da Justiça, vai se reunir ainda em maio e deve propor o encaminhamento das três ossadas, levadas para Brasília em 1996, para identificação na Universidade de São Paulo.
As oito restantes estão sob a guarda da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e aos cuidados do Instituto Médico Legal de Brasília.
Há tratativas, coordenadas pelo deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) -e ainda tímidas-, para proceder à identificação. A primeira delas é montar um banco de DNA das famílias dos guerrilheiros para poder fazer a comparação com essas ossadas, já que, segundo Greenhalgh, a identificação por exame morfológico não é possível.



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