UOL

São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NO PLANALTO

Filantropia banca até campanha eleitoral

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Aqui revelou, há um ano e meio, que a Faap (Fundação Armando Álvares Penteado) é filantrópica de mentirinha. Não paga impostos. Só à Previdência deixou de recolher R$ 88,4 milhões nos últimos 10 anos. Em troca, teria de conceder bolsas de estudo à malta. Mas dá de ombros.
Recorde-se o que disse em 2001 Américo Fialdini Jr., diretor tesoureiro da escola paulistana: "A lei está me pedindo para engarrafar um raio de sol. O carente não chega ao terceiro grau. Qual a universidade do país que atende aos descamisados?".
Restava saber o que é feito dos tributos. Munido do texto da Folha, o Ministério Público enviou fiscais do INSS à escrituração da Faap. A auditoria foi concluída há um mês. Alguns dos achados:
1) em julho de 2002, auge da campanha presidencial, a Faap doou R$ 100 mil ao PSDB. O gesto foi aos livros sob a rubrica "despesas administrativas gerais";
2) em outubro de 2002, nova "despesa administrativa": R$ 100 mil para a campanha de Juscelino Cardoso de Sá (PSDB-SP), deputado estadual;
3) bancam-se cartões de crédito de diretores. Para a Faap, despesas funcionais. Para o INSS, remuneração indireta, vedada por lei. Dois exemplos, entre muitos: a) em maio de 2002, o American Express do reitor Victor Mirshawka sorveu R$ 4.284,03; b) em dezembro de 2002, o Gold Bradesco do tesoureiro Américo Fialdini Jr. consumiu R$ 2.354,66, gastos em finas casas de pasto da capital paulista: Gero, Rodeio e La Tambouille;
4) em agosto de 1999, a Faap firmou convênio para custear reforma do Palácio Phampilli, sede da embaixada brasileira em Roma, então chefiada por Paulo Tarso Flecha de Lima. Enterraram-se na obra R$ 3,2 milhões. Ficou um colosso. Mais fácil, porém, Lula virar socialista de novo do que um patrício pobre pisar as tapeçarias do faustoso prédio do Século 17;
5) João Pedro Flecha de Lima, filho do embaixador, prestou "serviços" à Faap. Forneceu coisas impalpáveis como consultoria e representação institucional. Há contratos de 1996, 1997 e 2000. Os recibos não especificam os serviços executados. Um deles, de novembro de 1996, anota R$ 23 mil;
6) Iliana Graber vende assessoria jurídica à Faap. É sócia do advogado Américo Fialdini Jr., o tesoureiro, em duas empresas: a Fiagra Ltda. e a FGA Participações;
7) a firma Mirshawka Consultoria e Treinamento Ltda. emitiu inúmeras faturas contra a Faap. Pertence a Victor Mirshawka, o reitor;
8) o orçamento de viagens e representações da Faap é generoso: R$ 3,7 milhões em 2002, dos quais R$ 1,6 milhão (45,59%) aplicado na organização de exposição de arte contemporânea da China. Coisa fina. Dissociada, contudo, do universo das bolsas de estudo à bugrada;
9) chama-se Dominique Besse uma das beneficiárias de reembolsos de viagem. Mora em Paris. É curadora de artes. Serve à Faap desde 1996. Ganha R$ 4.700 ou US$ 4.000 mensais, o que for maior. Afora contratos específicos. Como o celebrado em março de 2002, para organizar exposição chinesa. Só a primeira parcela de honorários rendeu-lhe R$ 47,8 mil. Restituem-se-lhe todos os gastos. Há caso de aquisição de peça íntima de vestuário;
10) alugam-se jatinhos até para cobrir trechos bem-servidos por aviões de carreira. Em junho de 2002, Fialdini Jr., o tesoureiro, foi de São Paulo para Brasília a bordo de aeronave executiva, ao custo de R$ 12 mil;
O repórter procurou a Faap na tarde de quarta-feira. A pedidos, encaminhou por escrito o teor do que seria publicado. Foi informado de que, aproveitando o feriado de 1º de maio, todos os diretores da escola haviam viajado. Impossível, argumentou-se, localizá-los. Uma pena.
A ausência do contraponto empobrece o debate. Não está em questão o grau de excelência da Faap. Se fossem genuinamente privados, os negócios da escola não interessariam senão aos seus controladores. A isenção de tributos sujeita-os, porém, ao interesse público. Sobretudo num instante em que o governo avança contra o bolso de funcionários inativos e trabalhadores privados.



Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Caso Silveirinha: CPI vai propor o indiciamento de 15 suspeitos
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.