São Paulo, quinta-feira, 04 de julho de 2002

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JANIO DE FREITAS

Testemunha sigilosa

O depoimento de uma "testemunha sigilosa", que o ministro Nelson Jobim suspeita ser o próprio testemunhado João Francisco Daniel (o irmão do prefeito assassinado Celso Daniel), está explicado com um argumento técnico que isenta os promotores do caso de Santo André de suspeitas pelo uso de tal recurso. Mas prevalece, a propósito, uma questão importante.
Motivado pelo artigo aqui publicado ontem, o procurador de Justiça de São Paulo, Luiz Antônio Marrey, ofereceu uma explicação simples para o depoimento apresentado ao Supremo Tribunal Federal sem o nome do depoente, apenas citado como "testemunha nš 1", na acusação de João Francisco Daniel contra o deputado José Dirceu (processo já rejeitado por Nelson Jobim).
Entende Marrey que se "criou uma celeuma baseada em um equívoco", porque a inclusão do depoimento de "testemunha sigilosa" baseou-se no provimento 34/00 da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. Por esse provimento, a identificação do depoente, a chamada qualificação, "em um primeiro momento é feita em separado, e fica em um envelope a ser aberto quando o sigilo deixar de existir".
Marrey contesta a dedução do ministro Jobim de que as formas idênticas nos depoimentos de João Francisco Daniel, acusador, e da sua "testemunha sigilosa" sugerem tratar-se de um só depoente -o próprio João Francisco. Nega, ainda, que os dois depoimentos fossem tomados no mesmo dia. E ressalta que não fez qualquer juízo sobre José Dirceu, até por não lhe competir fazê-lo, no material que lhe coube enviar ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, e que este transformou em rápida e mal-sucedida solicitação de processo criminal contra o deputado.
Concluídas as explicações, que registro haverem sido de iniciativa ainda matinal de Luiz Antônio Marrey, foi o momento da pergunta: a autorizada inclusão de um depoimento de testemunha anônima não conflita com a legislação, em particular com o Código de Processo Penal?
Resposta: "O provimento nunca sofreu uma contestação. Vou verificar isso, se pode haver algum defeito jurídico".
É uma questão, no mínimo, interessante neste confuso momento: como pode um magistrado emitir uma decisão que se baseie, mesmo que só parcialmente, em testemunho anônimo? Foi, no entanto, o que Geraldo Brindeiro pretendeu obter no Supremo Tribunal Federal.
PS.: A explicação anterior transcreve literalmente o que me foi dito por Luiz Antônio Marrey, embora suas declarações, mais tarde, à repórter Silvana de Freitas, sejam diferentes.

Inúteis
O Banco Central oferece ao mercado, em cada dia desta semana, US$ 100 milhões à venda a preço abaixo da cotação. A partir da semana que vem e até o fim do mês, US$ 50 milhões por dia. Paciência, essa é a estabilidade da moeda de que o governo se vangloria. Mas é impossível ter paciência com a hipocrisia que envolve essa estabilidade mentirosa.
Ao comunicar a oferta generosa para o mercado e desastrosa para os cofres oficiais, Luís Fernando Figueiredo, diretor do Banco Central, disse que isso "não é para interferir na cotação do dólar", que está aí impondo recordes de desvalorização do real. Para quê essa farsa? Por que o empenho permanente em ludibriar a opinião pública?
Armínio Fraga, por seu lado, faz o pândego com a história de mais 30 meses para que o Brasil seja visto como seguro para investidores estrangeiros. Pedro Malan, em 94 para 95, dizia serem necessários dois anos. Ao fim deles, passou a falar na necessidade de três a quatro. Depois foi necessário um segundo mandato de quatro anos.
Os que não foram capazes de fazer em oito anos, apesar dos ônus brutais que impuseram à produção e à população, não fazem melhor nem que tenham, em vez de 30 meses, 30 anos mais. Não é outra a demonstração implícita na queima do "total de um bilhão e meio de dólares até o fim do mês", para preservar um pouco mais de falso valor do real.



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