São Paulo, segunda-feira, 04 de dezembro de 2000

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Brasil não precisa mais deles, afirma Skidmore

Marcos Finotti/Folha Imagem
O historiador e brasilianista norte-americano Thomas Skidmore, que ainda vê problemas no país


DO ENVIADO A WASHINGTON

Thomas Skidmore já foi Deus e o diabo na terra do sol. Aos 67 anos e brasilianista há 39, o historiador norte-americano é um dos maiores teóricos estrangeiros sobre o Brasil. "Quando cheguei ao país, nos anos 60, era tratado como agente da CIA...", brinca.
Diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos do instituto Watson Institute e professor da Universidade Brown, nos EUA, escreveu livros ainda hoje fundamentais para entender a história recente do país, como "De Getúlio a Castelo" (ed. Paz e Terra, 1969) e "Preto no Branco - Raça e Nacionalidade no Pensamento Brasileiro" (idem, 1976).
Brincalhão, fez piada já na abertura de seu comentário, no sábado de manhã. "Temos de preservar nossa independência, apesar de estarmos nas dependências do embaixador, que nos mandou buscar de carro e ofereceu vinhos franceses aos brasilianistas." Depois, deu entrevista à Folha. (SD)

Folha - O sr. acha que, a um mês do século 21, o Brasil ainda precisa do olhar estrangeiro para se entender melhor?
Thomas Skidmore -
Não. Os brasilianistas demos uma contribuição externa que ajuda, mas, do ponto de vista da identidade nacional, é marginal. A capacidade intelectual do Brasil cresceu muito desde 1960. Não é mais aquele país que espera vir o pensador dos EUA para ser explicado. O Brasil não precisa mais de brasilianista.

Folha - Nos anos 60, quando o sr. começou a ir ao país, a recepção geral aos brasilianistas não era das melhores, não é?
Skidmore -
Quando cheguei, era tratado como agente da CIA... Fui censurado na imprensa, tive o visto negado uma vez. Mas, no geral, não tive maiores dificuldades. Eu brincava com a esquerda. Eles diziam que tinham me visto na casa do embaixador Lincoln Gordon na noite do golpe, o que era um absurdo, e eu respondia que estava lá, sim, que fui o autor do manifesto dos generais! (risos).
Mas o fato é que aquela época foi muito difícil para os intelectuais brasileiros. Eu, por ser americano, consegui lançar "De Getúlio a Castelo" num tempo em que muitos brasileiros eram impedidos de publicar. E o livro trazia informação sobre muita coisa censurada. Ainda assim, a esquerda acusou: "Ah, ele teve acesso especial aos arquivos do governo". Só se for à Biblioteca Nacional do Rio, aberta ao público, onde eu devorava as coleções do "Correio da Manhã".

Folha - O sr. disse sábado que o Brasil é o país do presente, não mais do futuro. Por quê?
Skidmore -
O mundo está espantado com o progresso do Brasil em termos de organização do país. A privatização do sistema telefônico, por exemplo. É claro que tem alguma coisa da infra-estrutura ainda mal resolvida, como as estradas. Mas o que mais impressiona é a capacidade financeira do país: em comparação com México e Argentina, o Brasil conseguiu passar pelas crises muito melhor. Sua taxa de inflação é muito baixa, o sistema financeiro nem tem comparação. Mas há problemas graves, claro.

Folha - Quais?
Skidmore -
Passei uma semana recentemente em Marília, no interior de São Paulo, e o desenvolvimento é impressionante. A região está igual ao Norte da Itália, tudo muito próspero, tudo funcionando muito bem. Mas isso é sinal de que as divisões regionais estão piorando, não? É uma ameaça para o Brasil: o Nordeste atrasado e o Sul evoluindo...


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