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MEMÓRIA
Discípulo de Florestan Fernandes e ex-parceiro de FHC, intelectual estava internado com câncer; enterro será hoje
Sociólogo Octavio Ianni morre aos 77 anos
DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O sociólogo Octavio Ianni, 77,
morreu ontem em São Paulo. Ele
sofria de câncer havia mais de um
ano e estava internado no hospital
Albert Einstein desde a segunda-feira da semana passada. O enterro está previsto para as 15h de hoje no cemitério municipal de Itu,
cidade em que ele nasceu.
Discípulo de Florestan Fernandes (1920-1995), Ianni pertenceu a
uma geração de professores da
USP decisiva na consolidação dos
estudos sociológicos voltados ao
conhecimento do país. Ao lado do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi pesquisador assistente do autor de "A Revolução
Burguesa no Brasil" (1974).
A questão racial e, depois, os
problemas do desenvolvimento
foram temas muito abordados
por Ianni -assuntos, de resto,
que marcam essa segunda geração de estudiosos do país, cujos
precursores foram os historiadores Caio Prado Jr. e Sérgio Buarque de Holanda, entre outros.
Ianni estudou na Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da
Universidade de São Paulo. Obteve o título de mestre em 1956 com
a dissertação "Raça e Mobilidade
Social em Florianópolis".
De 1958 a 1965, participou com
jovens professores da USP da leitura coletiva de "O Capital", hábito que ficou conhecido como o
"Seminário Marx".
Marxista por formação, Ianni
foi um crítico severo da era FHC e
da gestão Lula, cujo governo qualificou em entrevista concedida
em março de "nave de enlouquecidos" que "não se debruçou sobre os problemas nacionais".
Segundo Fernando Henrique,
Ianni "era uma pessoa muito íntegra e será sempre reconhecido na
sociologia brasileira. Escrevemos
dois livros juntos e fomos pesquisadores do Florestan. Depois ele
saiu da universidade e chegou a
ser meu aluno por um período".
As obras publicadas com Fernando Henrique são: "Cor e Mobilidade Social em Florianópolis:
aspectos das relações entre negros
e brancos numa comunidade do
Brasil meridional" (1960); e "Homem e Sociedade: leituras básicas
de sociologia geral" (1961).
Para Gabriel Cohn, professor de
ciência política da USP, a obra de
Ianni representa um "jogo entre
os grandes panoramas, como desenvolvimento e globalização, e o
espaço que dedicava a analisar a
malha fina das relações sociais".
"O grande Ianni está nos pequenos ensaios", disse Cohn, que destacou uma publicação do início
dos anos 60 chamada "O jovem
radical", na qual Ianni aborda a
crise e a metamorfose dos jovens.
"Um dos pontos mais marcantes foi o seu estudo sobre a sociologia da cor. Ele contribuiu decisivamente para o entendimento do
desenvolvimento brasileiro e,
mais recentemente, para a análise
da globalização", afirmou o economista Paul Singer, atual secretário de Economia Solidária do
Ministério do Trabalho e um dos
fundadores do Cebrap (Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento), em 1969, ao lado de Ianni.
A tese de doutorado de Ianni,
em 1961, chamada "O Negro na
Sociedade de Castas", ilustra o interesse pela questão racial nesse
período. Dois anos depois, o objeto de análise muda para o desenvolvimento. Escreveu "Industrialização e Desenvolvimento Social
no Brasil", em 1963, e "O Estado e
o Desenvolvimento Econômico
no Brasil", em 1964.
Novos temas
Em 1969, foi aposentado compulsoriamente da USP em razão
do AI-5. Transferiu-se para a PUC
e, depois, para a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas),
onde lecionava até 15 dias atrás.
A partir da década de 90, dedicou-se à análise dos efeitos da globalização. Publicou, entre outros,
"A Era do Globalismo" (1996).
Recebeu em 1993 o Prêmio Jabuti por "A Sociedade Global"
(1992). Em 2001, "Enigmas da
Modernidade - Mundo" (2000)
lhe rendeu o Prêmio da ABL
(Academia Brasileira de Letras),
na categoria ensaio, e o Troféu Juca Pato, de Intelectual do Ano,
que foi concedido pela União Brasileira de Escritores.
"Ianni era um espírito livre e
aberto para compreender o novo.
Ele era uma das mais fortes expressões da ciência social latino-americana", declarou Ricardo
Antunes, professor de sociologia
da Unicamp, onde trabalhou com
Ianni mais de 15 anos.
O sociólogo, que era viúvo, deixou duas filhas e cinco netos.
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