São Paulo, domingo, 05 de agosto de 2001

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SUCESSÃO NO ESCURO

Presidente afirma não temer eventuais represálias de Jader

FHC diz que Sarney à frente do Senado seria "maravilha"

Alan Marques - 2.ago.2001/Folha Imagem
O presidente Fernando Henrique Cardoso, no Palácio do Alvorada


ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso admite a renúncia de Jader Barbalho (PMDB-PA) à presidência do Senado e já torce até para um candidato ao cargo: José Sarney (PMDB-AP), ex-presidente da República e do Senado.
Numa conversa com FHC na quinta-feira à tarde, no Palácio do Planalto, a Folha perguntou se Sarney seria o novo presidente do Senado. FHC respondeu de pronto: "Tomara! Ele é um ótimo nome. Tem dimensão, experiência e não causa problema".
Lembrado que Jader só está licenciado, FHC se deu conta do ato falho e tentou consertar: "Ih. Tem mais essa. O que eu queria dizer é que o Sarney seria uma maravilha, mas isso é coisa lá deles, do Senado".
Também disse não temer eventuais represálias de Jader, pressionado a renunciar: "Eu não tenho nada com isso, não mexi uma palha. E o que ele pode ter contra mim, contra o governo? Nada".
FHC atravessou a crise do Senado torcendo e atuando, apesar de insistir que não se mete em assuntos de outro Poder. Mas não se negou a elogiar Sarney, admitindo que telefona sempre para ele e que o visitou em casa depois de uma cirurgia há poucos meses.
"Um ex-presidente tem que ser discreto, tem que ficar distante, não se meter, não falar mais do que deve e principalmente não criar problema. O Sarney é tudo isso, e é isso também que eu vou querer ser com meu sucessor", disse FHC na conversa.
Seria uma crítica ao governador de Minas, Itamar Franco (PMDB)? "Não, que nada. Deixa o Itamar lá quieto no canto dele", disse, com um sorriso malicioso.
Itamar foi o principal padrinho da candidatura presidencial de FHC em 1994. Depois, passou a ser um dos seus maiores críticos e hoje é presidenciável na oposição.
Para FHC, é ótimo que por enquanto haja essa multiplicidade de candidatos à Presidência da República, mas será preciso indicar um candidato do governo até o início do próximo ano, para começar a ser conhecido e deslanchar quando a propaganda gratuita entrar no ar, em agosto.
"Janeiro é o ideal", disse ele. "Antes, é muito cedo. O candidato vai andar na rua, falar com as pessoas e ser tratado como abestalhado, porque ninguém o conhece. E depois pode ficar tarde demais para se tornar conhecido e ganhar confiança."
FHC também prevê mudanças no quadro de candidaturas da oposição: "Hoje, há uma pulverização de candidatos da oposição, mas você acredita que isso vai continuar? Duvido! Até lá, uns vão acabar saindo, outros, se unindo", disse. Quanto à pulverização de nomes no campo governista, ele até comemorou: "Ótimo! Nós temos um alvo móvel".
Quis dizer, com "alvo móvel", que o excesso de presidenciáveis passíveis de ter seu aval divide as críticas e insinuações que partem dos adversários. "Quem está na política sabe que tem pancadaria e tem que ter lombo curtido", disse ele, começando a traçar o perfil que considera ideal para o candidato governista de 2002.
Deles, o que teve maior destaque no noticiário da semana passada foi o ministro Pedro Malan (Fazenda). Mas ele não é político. Teria o "lombo curtido" para enfrentar a "pancadaria"?
"Ora! Claro que tem! Depois de sete anos no Ministério da Fazenda, apanhando dia sim, dia não, o Malan está bem curtido. Todo mundo pedia a cabeça dele, e ele lá, firme. Firme como uma ostra no rochedo", respondeu FHC.
Então, ele é o candidato?

Fatores decisivos
FHC lembra que há outros fatores decisivos. Exemplo: "O candidato tem que querer. E tem que querer muito, porque é uma guerra. E o Malan sempre diz que não quer. Você acha que ele só diz isso para vocês [jornalistas]? Não. É o que ele diz para todo mundo, para mim também".
Pergunta obrigatória: "Se diz, é porque o sr. tenta convencê-lo?".
Resposta de FHC: "Eu pergunto a todos eles. Pergunto ao Serra [ministro José Serra, da Saúde], ao Tasso [Jereissati, governador do Ceará], ao Paulo Renato [Souza, ministro da Educação]. Nenhum deles diz claramente: "Quero e vou brigar por isso"".
FHC contou que, ao voltar a Brasília do encontro com o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, na semana passada, reuniu um grupo de ministros e assessores no Alvorada. E perguntou: "Por que vocês não se filiam ao PSDB ou a qualquer partido?".
Todo mundo olhou para Malan, mas FHC fez questão de frisar: "Não estou só falando para ele, estou falando para todos". Armínio [Fraga, presidente do Banco Central", por exemplo, estava lá.
Ainda como perfil do candidato, FHC defendeu que "seja bom de briga e tenha experiência administrativa, lastro político, vida limpa e boa capacidade de comunicação, porque quem decide a eleição é a televisão e o rádio".
Esse perfil é o do Serra? FHC responde ambiguamente: "Pode ser, por que não? Ele é um dos nomes. Mas há outros".
Quanto aos baixos índices dos potenciais candidatos governistas nas pesquisas, FHC disse que "isso não tem a menor importância". Serra, que tem a melhor performance, só teve 8% no último Datafolha, de julho. Para FHC, "as pessoas ainda não estão nem aí para a eleição, nem conhecem direito os candidatos". E exemplificou: "Naquelas pesquisas que não dão os nomes, as pessoas dizem até o meu nome. E eu sou obviamente o anticandidato".
Ele também desdenhou do franco favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT: "Na minha vez [eleição de 1994", ele chegou a 42% e perdeu. Agora, fazem essa onda toda, mas tem menos do que isso". No Datafolha publicado em julho, Lula teve mais de 30% em todos os cenários.
De qualquer forma, o presidente analisa que o segundo turno tende a ser entre Lula, porque ele e o PT já saem com uma plataforma alta de votos, e o candidato do governo, que também entra na disputa com um patamar alto.

"Só Deus sabe"
"Assim por cima, mais de 30% aprovam o governo, e eu tenho 20% de ótimo e bom na média das pesquisas. É claro que o candidato vai ficar com uma boa parte disso." O presidente também frisou que esses índices, que considera "bons", foram aferidos "numa época ruim, de baixa [para o governo" e podem melhorar".
E a economia vai melhorar? Responde ao seu melhor estilo: "Só Deus sabe!".
E tenta consertar: "Diziam que ia ficar muito pior do que ficou, por causa do racionamento, da crise da Argentina. Mas o que se vê é que o produto está inalterado, e o desemprego até caiu".
Segundo ele, o ex-presidente da Colômbia César Gaviria contou-lhe que o país também viveu um racionamento de oito meses, mas as empresas se adaptaram, e o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu em torno de 4%.
Admitindo plagiar o presidente do Chile, Ricardo Lagos, FHC falou em tom meio sério, meio de brincadeira, que o PIB médio mundial deve ficar em torno de 1,5% e, como do Brasil vai ser em torno de 3%, "vamos ter o dobro do produto internacional".
De qualquer forma, a previsão no início do ano era de 4,2%, e o resultado de 3% é muito aquém. Diz FHC: "Todas as expectativas eram muito favoráveis, mas não deram certo. O mundo está caindo. A crise da Argentina, essa coisa toda... Foi culpa nossa? Não. E, do mesmo jeito que as expectativas eram boas e não se concretizaram, pode acontecer também o inverso. Nunca se sabe".
Apesar de evitar falar das disputas internas do PMDB, FHC usou o PFL para encerrar a conversa provocando indiretamente o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que renunciou ao mandato: "E o PFL, hein? Anda numa fase ótima, excelente".



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