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JANIO DE FREITAS
Aviação sem desvios
A civil Anac, em princípio,
é um avanço. Se a sua forma não é boa, a alteração cabe
ao Congresso. Não à Defesa
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SEJAM QUAIS forem as suas causas diretas, a tragédia de Congonhas expõe um absurdo, tipicamente brasileiro, que é a causa
inicial dos problemas no setor de
aviação e em vários outros. Trata-se
da desordem estrutural que faz, por
exemplo, com que a aviação comercial seja subordinada ao Ministério
da Defesa.
O que as atribuições militares da
segurança territorial têm a ver com
empresas privadas de aviação de
passageiros e de carga, e com o funcionamento de aeroportos de uso civil e suas lojas, além de tantos outros
componentes do sistema de aeronáutica privado? A resposta é tão
dispensável quanto a própria pergunta seria. A brasilidade fez-se ainda mais notável, porém, com a criação desse monstrengo rotulada como reforma modernizadora. E como tal muito aplaudida.
O Ministério da Defesa se tornou
possível, apesar dos militares, por
insistência dos EUA. Ainda presidente, o próprio Fernando Henrique Cardoso disse que os americanos queixavam-se da complicação
de lidar com três ministros militares
no Brasil, e insistiam na solução já
universal de um Ministério da Defesa. Mas, como adotada, a solução
não solucionou para lá e trouxe mais
problemas para cá. Na prática, Aeronáutica, Marinha e Exército continuaram tendo os respectivos ministros, apenas mudado o seu título para comandantes, e a presença de ministro civil até hoje é uma sucessão
de complicações.
O que é ruim vai piorar. O uso, feito agora, do Conselho Nacional de
Aviação Civil para impor a redistribuição de linhas aéreas choca-se
com a autonomia e a exclusividade
dadas por lei, para o mesmo fim, à
recente Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac. Mau começo. No
passo seguinte, para retomar a fatia
de poder retirada da Defesa pela
Anac, o ministro Nelson Jobim quer
acrescentar mais um à multiplicidade de órgãos da aviação civil -uma
secretaria com poderes idênticos e
sobrepostos aos da Anac.
A fórmula representa a entrada
em cena do autoritarismo, disfarçado de eficiência e comando. A secretaria destina-se a passar por baixo
ou lado da legislação que constituiu
a Anac e suas atribuições intransferíveis. A civil Anac, em princípio, é
um avanço. Se a sua forma não é boa,
possível caso da impossibilidade de
demissão de seus diretores por cinco anos, a alteração cabe ao Congresso. Não ao ministro da Defesa.
Nem por desvios.
A crise aérea e a tragédia de Congonhas tornam mais evidente que o
necessário é a estruturação racional
do aparelho administrativo desatinado. Este que põe a aviação civil na
Defesa; transfere e ao mesmo tempo
contesta uma fatia desse setor para
uma agência especializada; e mantém um estradeiro Ministério dos
Transportes até hoje alheio a um século de transporte aéreo.
Não há nem sombra de indício de
que Nelson Jobim seja a pessoa para
encaminhar tal processo, o oposto
da voracidade de poder -legítimo
ou não. Imaginá-lo abrindo mão de
parcela do seu poder, em vez de ampliá-lo, seria mais do que imprudência. Melhor sinal do esperável vem
de sua proclamada disposição de interferir até nos preços das passagens: o ministro da Defesa mudando
a política econômica baseada na liberdade de mercado.
Nada disso importa, no entanto.
Esses são problemas do país. A preocupação do presidente da República,
no momento, está posta na marquetagem para compensar, de um lado,
as vaias que soem do outro. E tome
de viagens e comícios.
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