|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Pesquisas nortearam ataque a privatização, afirma João Santana
Para marqueteiro de Lula, tucanos erraram ao evitar debate e não apontar resultados positivos da venda de empresas estatais
Ele nega a intenção de trabalhar para governo
e revela uso de "telefone vermelho" para contatos com campanha adversária
DO ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR
Neste trecho de sua entrevista à Folha, o marqueteiro político João Santana revela que a
abordagem depreciativa das
privatizações feitas pelo PSDB
"não surgiu por acaso nem foi
fruto de uma intuição temporária". Também afirma que não
aceitará nem disputará contas
de publicidade estatais federais.
(FERNANDO RODRIGUES).
FOLHA - Como foi definida a abordagem a respeito do tema das privatizações?
JOÃO SANTANA - Esse é um tema
riquíssimo, que foi muito bem
pensado. Nós tínhamos alinhado alguns dos temas de intensa
fragilidade e de imensa comoção política. Estava em primeiro lugar a privatização. Não
usamos no primeiro turno porque não houve necessidade.
FOLHA - A forma como o assunto
foi usado não se prestou a deseducar o eleitor? Propagou-se a noção
de que a privatização em si é algo
ruim...
SANTANA - Foi deseducativo de
acordo com determinado ideário. Para o "consenso de Washington", sim. No Brasil, para alguns setores, revigorou-se
um sentimento cívico. Não faço
juízo de valor, mas o fato é que a
privatização se apresenta no
imaginário brasileiro com uma
série de emoções políticas.
FOLHA - Quais eram essas emoções?
SANTANA - Primeiro, há um eixo cívico-épico-estatizante que
vem de Getúlio Vargas, com a
campanha "o petróleo é nosso".
O outro eixo são as "tramas
obscuras". Não quero questionar como foram feitas as privatizações no governo FHC, mas o fato é que ficou, na cabeça das
pessoas, como se algo obscuro
tivesse ocorrido. Foi erro de comunicação do governo FHC,
que poderia ter vendido o benefício das privatizações de maneira mais clara. No caso da telefonia, teve um sucesso fabuloso. As pessoas estão aí usando
os telefones.
FOLHA - Não é desonesto se beneficiar de uma idéia geral que vigora
na sociedade? Algo que possivelmente o próprio presidente da República sabe que não é a verdade
completa?
SANTANA - Não. Eu trabalho
com o imaginário da população. Em uma campanha, nós
trabalhamos com produções
simbólicas. Não considero que
exista aí desonestidade, pois o
tema foi, pelo menos, discutido.
É bom que a população fale e
reflita sobre esses temas. No
primeiro turno, analisando as
pesquisas, eu vi que essa discussão poderia ser retomada.
Enxerguei ali um "monstro vivo" que poderia ser jogado.
FOLHA - Mas, se foi apenas uma tática para encurralar o adversário, fica então reforçada a tese de que
houve uma certa desonestidade intelectual. Ou, para usar a expressão
do candidato do PSDB, uma "mentirobrás"?
SANTANA - Não é bem assim. O
presidente não foi reeleito por
causa da polêmica sobre privatização. O fato é que o adversário teve a chance de responder,
mas não o fez. Tivesse ele uma
resposta pronta, objetiva, o impacto teria sido reduzido. Alckmin poderia mostrar objetivamente o uso de telefones, de
computadores, de internet.
FOLHA - Pelo que o sr. diz, não houve desonestidade porque o candidato tucano se recusou a responder?
SANTANA - Podemos dizer que
houve duas fugas de debate extremamente negativas por parte dos dois candidatos. A de Lula, no primeiro turno, quando
não foi ao debate promovido
pela Rede Globo. A segunda
quando Alckmin não quis debater a privatização.
FOLHA - Do seu lado, não houve
um exagero na forma como foi
abordada pejorativamente a privatização?
SANTANA - Eleição é disputa de
poder. É um combate quase
sanguinário. Para ter espaço, é
preciso dar um empurrão, um
solavanco numa pessoa. Usar
um tema como privatização é
muito mais honesto do que tentar assacar contra a honra do
outro candidato, como Lula foi
atacado injustamente.
FOLHA - José Serra teria sido um
adversário mais difícil?
SANTANA - Tenho dúvidas.
Acho que Alckmin foi muito
bem no primeiro turno. Serra
talvez fosse melhor que Alckmin no segundo turno, no momento em que a campanha embicou para a discussão mais
programática e ideológica. Se
campanha fosse igual a futebol,
o Serra deveria ter saído do
banco no segundo tempo.
FOLHA - A regra tem sido publicitários vitoriosos acompanharem o político no governo. Quais são os seus
planos?
SANTANA - Não vou disputar
nenhuma conta de publicidade
no governo federal. Mas quero
manter, se for de interesse do
presidente, a relação de consultor, como fui no ano passado.
Pode ser algo remunerado por
hora técnica. O que não quero é
conta milionária nem cargo
dentro do governo.
FOLHA - Qual foi o custo total da
campanha petista?
SANTANA - Só posso falar da
área de propaganda e marketing. O contrato da minha empresa, envolvendo os dois turnos, foi de cerca de R$ 13,750
milhões, envolvendo TV, rádio,
internet, criação gráfica e planejamento estratégico.
FOLHA - Por que a imagem de marqueteiros políticos é, em geral, tão
negativa?
SANTANA - É a dificuldade de
entender o que é persuasão e o
que é manipulação. Há um limite entre essas ações e muita
confusão desde a Grécia Antiga.
No século 19, surgiu o estudo da
psicologia das massas, pela ótica patológica. Na França, Gustave Le Bon [1841-1931] dizia
que a multidão era a escória,
uma massa uniforme e objeto
das manipulações mais vis.
A partir daí, vem uma série
de interpretações sociais deformadas. Cesare Lombroso
[1835-1909], na Itália foi outro
caso. A interpretação enviesada
do marketing político deriva
também dessas outras visões
deformadas da sociedade.
Detratores da publicidade
política-eleitoral acham que só
manipulamos e que a massa é
imbecil. Por isso cito a Grécia.
Sólon [poeta e legislador] dizia
que o ateniense isolado era
uma raposa astuta, e, em massa, um bando de ovelhas. Vem
de longe essa visão equivocada
da relação com as massas.
FOLHA - O sr. falou com o publicitário de Alckmin, Luiz González, durante a campanha?
SANTANA - Tínhamos uma espécie de telefone vermelho, para situações de crise. Mas só
usamos para discutir debates e
entrevistas, dos nossos candidatos. Liguei, também, para esclarecer uma versão absurda,
supostamente divulgada por
tucanos, de que o presidente
Lula teria usado ponto eletrônico no debate da TV Record.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Frases Índice
|