São Paulo, quinta-feira, 05 de dezembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

O $ do problema

A cada dia vem saindo um dado novo, no curso normal do noticiário, que torna mais perturbadora a percepção acumulada dos problemas com que o futuro governo vai se deparar.
São mais 163% de falências e concordatas do que em novembro de 2001, o que retrata dificuldades empresariais graves; é o desemprego que cresce, é a inflação prestes a cruzar os 10% e já deixando a poupança na perda, o que não havia desde 95; os que vivem com menos de R$ 100 por mês são mesmo um terço da população, 14 milhões a mais do que os 40 milhões de miseráveis que Fernando Henrique Cardoso disse serem um número mentiroso.
Nada surpreendente, tão só apenas a continuidade lógica só ignorada por quem assim decidiu fazer nos últimos anos. O que torna perturbadores os dados que apenas se atualizam é a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. Criou-se a expectativa de enfrentamento dos problemas, de início de solução, como jamais se teve ou se esperaria de outro resultado eleitoral. A expectativa faz arregalar os olhos para a dimensão do drama.
O noticiário segue seu curso normal: "os bancos estrangeiros que operam no Brasil dobraram seus lucros neste ano, elevando-os de R$ 3,884 bilhões para R$ 7,643 bilhões. O noticiário mantém a eloquência, mas a natureza da notícia é outra. Nela, os bancos estrangeiros apenas prenunciam o que logo aparecerá a respeito também dos bancos brasileiros e, no mesmo passo, da generalidade dos bancos que operam no Brasil. Ou operam o Brasil.
Os lucros desses bancos não se limitam a ser os maiores do mundo. São também os mais despudorados do mundo. Neles, o lucro advém da especulação, das tarifas espoliadoras por seus serviços sempre duvidosos e de juros estrangulantes (160% no cheque especial tem diferenças morais em relação aos atos que compõem a chamada insegurança urbana?).
Os lucros recordistas dos bancos não se fazem de aplicação nas atividades produtivas. Com os obstáculos que opõem ao financiamento de atividades produtivas e os juros com que atacam as duplicatas decorrentes de produção, os bancos no Brasil compõem a linha de frente contra o crescimento, pelo desemprego, contra o trabalho da indústria e do comércio, pela injustiça social e a concentração da renda.
Falar em função social dos bancos, como tanto foi feito em anos pré-neoliberalismo, é ridículo. Mas sem submeter à reconsideração a natureza dada aos bancos no Brasil, o próximo governo não terá como ser o que promete. Lucros bancários honestos são um grande negócio - para os bancos, pela parte que lhes fica; para o país em que lucram, pelo que transformem em fator de produção, comércio e emprego.


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