São Paulo, terça-feira, 06 de março de 2007

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Ex-presidente da CNBB, d. Ivo morre aos 79 no RS

Bispo de Santa Maria presidiu a entidade de 1979 a 1986 e lutou contra o regime militar

D. Ivo foi um dos expoentes da igreja no embate contra a ditadura e morreu ontem de infecção generalizada após passar por uma cirurgia

Charles Guerra-5.mar.2006/"Diário de Santa Maria"
D. Ivo Lorscheider, bispo de Santa Maria (RS) e presidente da CNBB entre 1979 e 1986, em sua casa


LEANDRO BEGUOCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Dom José Ivo Lorscheiter, 79, morreu ontem às 16h em Santa Maria, no interior do Rio Grande do Sul, em decorrência de uma infecção generalizada. Presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) de 1979 a 1986, estava internado desde o dia 25 de fevereiro deste ano no Hospital de Caridade por causa de problemas no sistema digestivo.
Bispo de Santa Maria desde 1974, d. Ivo faz parte da galeria de bispos brasileiros que assumiram a linha de frente contra a ditadura militar (1964-1985). Está no mesmo patamar de d. Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife morto em 1999, d. Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de SP, d. Luciano Mendes de Almeida, bispo de Mariana (MG) morto em 2006, de d. Aloísio Lorscheider, arcebispo emérito de Aparecida (SP) e primo de d. Ivo.
"É com profunda tristeza que recebo a notícia da morte de meu querido amigo dom Ivo Lorscheiter", afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Exerceu, com firmeza e serenidade, a secretaria-geral da CNBB, acompanhando todo o processo de redemocratização do país com o qual contribuiu de maneira decisiva. Quero, neste momento de dor e de saudade, expressar meus sentimentos aos familiares, a toda a comunidade católica e aos amigos de d. Ivo, esse ser humano maravilhoso, que deixa para todos nós um exemplo de vida e de dedicação às boas causas."
D. Ivo -que era diabético e tomava 18 remédios por dia- passou por uma cirurgia de emergência no estômago na madrugada de sábado para domingo. Durante a operação, os médicos notaram o surgimento de uma infecção, que acabou por matá-lo. Ele será enterrado hoje, às 16h, no Santuário-Basílica de Nossa Medianeira de Todas as Graças, em Santa Maria, no mesmo dia em que completaria 41 anos de episcopado.

Biografia
Ligado à Teologia da Libertação, corrente do catolicismo que vê a igreja a serviço da transformação social, d. Ivo foi bispo-auxiliar de Porto Alegre de 1966 a 1974 e secretário-geral da CNBB entre 1971 e 1978.
Durante todo o tempo em que esteve à frente da entidade, d. Ivo e a CNBB se opuseram às violências da ditadura militar.
"Ele teve uma liderança muito grande e soube conduzir a igreja com muita sabedoria. É uma referência em liberdade", afirma d. Odilo Scherer, atual secretário-geral da CNBB.
Criado em uma colônia agrícola alemã, d. Ivo nasceu em São Sebastião do Cai (RS). Seu lema como bispo resumia sua proposta de conciliar a tradição da igreja com as mudanças dos tempos: "coisas novas e velhas". Foi o último brasileiro nomeado por Paulo 6º para o Concílio Vaticano 2º (1962-1965), que permitiu à igreja dialogar com a modernidade.
O espírito aberto e corajoso fez d. Ivo ser um dos primeiros bispos do país a pedir a realização de eleições diretas para a Presidência da República, em 1983. Ao mesmo tempo, condenava a legalização do PCB, por achar a sigla antidemocrática.
Também era multirreligioso. Em Santa Maria, havia missa na igreja protestante e culto luterano na catedral católica.
Com a dissolução do regime militar, d. Ivo se voltou para dentro da igreja e novamente assumiu posições polêmicas. Se opôs às medidas do Vaticano contra o então frade Leonardo Boff e disse ao papa João Paulo 2º, nos anos 80, que o silêncio imposto ao religioso era muito ruim porque o Brasil havia acabado de sair de uma ditadura. "Foi um gigante, uma pena que não tenha sido nomeado cardeal. A igreja terá de pedir perdão a ele", afirma o teólogo Fernando Altemeyer.

Colaborou a Sucursal de Brasília


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