São Paulo, domingo, 06 de junho de 2004

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AGENDA POSITIVA

Ministro da Fazenda se destacou na reunião anteontem, enquanto seu colega da Casa Civil ficou calado

PIB faz Palocci ganhar espaço sobre Dirceu

Sérgio Lima-25.jan.2003/Folha Imagem
Lula entre os ministros Palocci (à direita) e Dirceu durante o anúncio de um pacote de crédito


KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Ainda que insuficiente como resposta imediata ao alto desemprego e à queda da renda dos trabalhadores, o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) no primeiro trimestre deste ano já provoca um rearranjo na correlação de forças no governo e no PT.
"Alívio" é a expressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em conversas reservadas, ao comentar o crescimento do PIB em 1,6% comparado ao último trimestre de 2003 e 2,7% em relação ao primeiro trimestre do ano passado.
O primeiro efeito ficou claro na reunião ministerial de anteontem. Antes sob críticas, Antonio Palocci Filho foi destaque do encontro. Falou que a palavra de ordem é "crescimento, crescimento, crescimento". A posição do ministro da Fazenda se reforça nos enfrentamentos internos do governo.
Em contrapartida, diminui o peso de José Dirceu (Casa Civil), que não abriu a boca na última reunião ministerial.
Dirceu trava com o colega da Fazenda, desde o início do governo, uma guerra de bastidores na qual faz contraponto ao modelo econômico. No PT, terreno dominado pelo chefe da Casa Civil, Palocci também ganha força. Vê atenuar-se o "fogo amigo".
Entre outros efeitos, Lula já discute mudanças no ministério. Oscila entre ajustes pontuais e uma troca de cadeiras mais ampla, a ser feita depois das eleições municipais de outubro. Mostra-se convencido de que precisa mudar ministros ineficientes. Será a segunda reforma da Esplanada.
Apesar de não gostar do termo, Lula vislumbra a chegada da "fase dois", como alguns de seus assessores definem o ansiado momento econômico pós-ajustes. Lula acalenta o desejo de imprimir aos dois últimos anos de sua gestão a marca da prosperidade e do crescimento. Recorda que, no final de 2002, ainda na transição do governo Fernando Henrique Cardoso para o seu, Palocci lhe havia dito que os dois primeiros anos seriam duríssimos. "A travessia será dolorosa", afirmou.
Embora ciente de que não logrará atingir o prometido "espetáculo do crescimento", o presidente espera colher efeitos positivos no emprego e na renda dos trabalhadores na segunda metade de seu "primeiro mandato".
Ao falar em "primeiro mandato", ministros e auxiliares próximos de Lula já denunciam o debate interno em torno da reeleição do presidente Lula.
A Folha apurou que o presidente também tem dito que a oposição vai se surpreender com o cenário político que encontrará nas eleições municipais de outubro. Acha que será menos adverso do que se apregoa para os candidatos do PT e dos partidos aliados. Acredita que o próximo índice do IBGE atestará a manutenção da curva de crescimento do PIB no segundo trimestre de 2004. Um prato cheio, acredita Lula, para os candidatos governistas.
Desde a divulgação dos números do PIB, em 27 de maio, Lula tem notado nas conversas com caciques do PT que baixou muito o tom crítico em relação a Palocci.
Petistas voltam a comprar a tese de uma dureza fiscal necessária como "transição" para um "governo-do-PT-de-verdade", no qual políticas sociais e investimentos públicos teriam um destaque maior.

Dirceu e Meirelles
Num contexto em que Palocci ganha força, Dirceu avalia se é melhor para seu futuro político permanecer na Casa Civil ou voltar ao Congresso, para presidir a Câmara dos Deputados a partir de fevereiro de 2005.
Lula emite sinais de que gostaria de ter Dirceu na Câmara, de onde ele comandaria de fato a articulação política, área da qual gosta e que é sua grande especialidade. Mas o presidente não quer que o ministro volte ao Parlamento contrariado ou julgando que foi escanteado do governo. Nessa hipótese, prefere que ele continue no quarto andar do Palácio do Planalto.
Primeiro, porque Lula vê qualidades no ministro. Acha-o disciplinado. Enxerga nele enorme capacidade de trabalho. Segundo, porque Dirceu, magoado, poderia capitanear uma oposição mais dura e efetiva à política econômica. Numa fase em que Lula julga que terá refresco nessa área.
Na reunião ministerial de anteontem, foi muito simbólico que Dirceu, alçado por Lula em fins de janeiro à função de "gerentão" do governo, não tenha aberto a boca justamente num encontro em que o foco foi melhorar a gestão do governo.
Outra operação tão delicada quanto decidir o futuro político de Dirceu é calibrar a política monetária. Lula acha que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, montou uma diretoria conservadora demais e que perdeu em janeiro e fevereiro oportunidade para diminuir a taxa básica de juros da economia, hoje em 16% ao ano.
Como está fora de seus planos tirar Meirelles, Lula lida com ele politicamente. Antes da reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) em maio, o presidente do BC esteve reunido com o presidente e o avisou de que talvez não fosse possível diminuir a taxa básica naquele mês.
Meirelles expôs números que mostravam que o mercado projetava taxa básica superior à do BC e que talvez não conseguisse baixar os juros em 0,25 ponto percentual. Feita a reunião do Copom, aconteceu o que Lula não queria. O presidente ficou contrariado, mas, de público, poupou o BC.
No trabalho de bastidor, ele continuará a batalhar por uma taxa menor e que não mine o clima de otimismo gerado pelo crescimento do PIB no primeiro trimestre do ano.


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