São Paulo, Domingo, 06 de Junho de 1999
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CELSO PINTO

Concessões aos municípios

A Lei de Responsabilidade Fiscal pode ser amenizada em relação às exigências para os municípios, como uma forma de ajudar na sua aprovação ainda este ano.
A lei estabelece uma série de exigências para Estados e municípios, sujeitas a acompanhamento e punições aos administradores. Algumas das maiores resistências têm surgido de municípios.
A razão principal é a dependência da maioria dos municípios de verbas federais e estaduais. A receita disponível dos municípios chegou a R$ 45 bilhões em 98, mas só R$ 13,2 bilhões foram gerados por receita própria (ISS e IPTU). O restante, R$ 31,6 bilhões, veio de transferências federais (R$ 13 bilhões) e estaduais (R$ 18,6 bilhões).
Quer dizer, os municípios, em média, controlam apenas 29% das receitas que gastam. No caso dos municípios com menos de 50 mil habitantes, 91% do total, essa proporção cai para 13%.
O receio de muitos prefeitos é assumir mais responsabilidades na gestão fiscal, controlando, na verdade, uma parcela muito pequena dos recursos que utilizam. Se algum problema, político ou econômico, afetasse o volume ou o prazo das transferências de recursos para os municípios, eles correriam o risco de pagar pelo não cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, sem ter controle sobre o grosso da receita.
Para contornar essa resistência, o governo está pensando em limitar algumas das exigências da nova lei apenas aos municípios acima de 200 mil habitantes. Do ponto de vista fiscal, são esses os municípios que contam.
O problema fiscal potencial dos municípios menores é outro: seus fundos de Previdência. No Programa de Estabilidade Fiscal do ano passado, está mencionado que 1.388 municípios têm regime próprio de Previdência, dos quais 943 com menos de 20 mil habitantes e que "não apresentam nenhuma estrutura de administração da conta previdenciária".
É uma bomba de tempo. Quando esses sistemas começarem a estourar, a pressão para que a conta seja repassada para Brasília será imensa.

Evasão na Bolsa
Quanto dinheiro de brasileiros sai do país e volta, sob a forma de investimento externo (via Anexo 4), para aplicar em Bolsa sem pagar imposto?
O Secretário da Receita Federal falou que US$ 17 bilhões do Anexo 4 viriam de "paraísos fiscais" da América Central e que o grosso seria de brasileiros. O que o levou a sugerir que o Anexo 4 fosse taxado como os investimentos locais.
A conta, contudo, não é clara. Alfredo Rizkhallah, presidente da Bolsa de São Paulo (Bovespa), diz que o estoque de Anexo 4 em 30 de abril era de US$ 20 bilhões (já chegou a US$ 29 bilhões antes da crise russa). Desse total, cerca de 30% teriam origem na América Central, o que dariam US$ 6 bilhões e não US$ 17 bilhões.
Dados de fevereiro da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) mostram que 36% das carteiras de Anexo 4 têm origem na América Central. No entanto, isso não quer dizer que 36% do volume vêm de lá, apenas que 36% dos titulares das carteiras são de lá.
Existem carteiras de apenas um investidor, mas existem também as chamadas "contas ônibus": sob um titular estão inúmeros investidores. Existem cerca de 400 contas no Anexo 4, mas sabe-se que, atrás destas contas, existem mais de 5 mil investidores.
Olhando a origem dos investidores e não das contas, cerca de 75% vêm dos Estados Unidos, Reino Unido e Canadá. Uma razão para isso é que vários fundos dedicados à América Latina, ao Brasil ou a países emergentes têm origem na América Central e acabam reunindo, como investidores, grandes fundos institucionais americanos ou de outras origens.
A Bovespa custodia boa parte do dinheiro do Anexo 4. Do que estava custodiado lá, em maio, 62,1% tinham origem nos Estados Unidos e Canadá; 26,3% na Europa; 10% na América Central; 0,9% na América do Sul; 0,7% na Ásia e 0,1% no Oriente Médio.
É claro que existe dinheiro expatriado de brasileiros não só na América Central, mas no resto do mundo e o "passeio fiscal" deve ser coibido. Só que fica complicado entender de onde vem o número de US$ 17 bilhões de brasileiros vindos da América Central.
Ninguém é contra coibir essa evasão. A principal razão para não taxar o Anexo 4 é outra: ela vai desviar ainda mais negócios com ações brasileiras para o exterior, especialmente Nova York, onde já são negociadas ações que representam 70% do movimento da Bovespa. O que esvaziaria o benefício fiscal da medida e encolheria o mercado brasileiro.


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