São Paulo, domingo, 06 de agosto de 2006

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JANIO DE FREITAS

A infecção


É preciso alargar as possibilidades das investigações parlamentares, e não restringi-las a um assunto determinado

A SEQUÊNCIA DAS revelações de corrupção está fazendo a radiografia de um país com infecção generalizada, e não é de hoje.
Só o que emerge do Congresso, com cerca de um terço da Câmara presente nas denúncias de caixa dois, mensalão e sanguessugas, agora enriquecidas por senadores, bastaria para o diagnóstico do quadro alarmante. Mas aí estão ainda, simultâneas, as revelações de numerosos casos em assembléias estaduais, investigação de licitações em três ministérios, de integrantes do alto judiciário em pelo menos dois Estados, escândalos no Paraná, em Rondônia, no Espírito Santo, Ceará (outra vez com dirigente do PT), enfim, pelo país afora. E na própria Polícia Federal, que descobre em seu organismo o mesmo que tem revelado e reprimido como faz uma verdadeira polícia -o que nunca fora.
É diante de um cenário assim resumido que o presidente da República pede à Ordem dos Advogados do Brasil e recebe as sugestões de um grupo de juristas para redefinir a função e os procedimentos das comissões parlamentares de inquérito. E, satisfeito com as sugestões recebidas, propõe-se a mandá-las em breve ao Congresso. Segundo informação inicial, não apenas como sugestões mas também como projeto proposto pelo Executivo.
O necessário debate sobre a possível interferência do projeto presidencial em assunto interno e exclusivo do Congresso, como já foi lembrado, cabe a juristas. Mas o aspecto mais rasteiro da questão, por isso cabível aqui, não parece ter a menor importância.
Os fatos estão mostrando que é preciso alargar as possibilidades de investigações parlamentares, e não restringi-las a um assunto determinado, como reza o regulamento das CPIs e é um ponto focal na sugestão levada a Lula. É preciso, isso sim, metodizá-las, impor-lhes regras de objetividade para impedir que sirvam de palco a uns e de pasto a outros. Mantê-las aprisionadas a um só tema, porém, é absurdo. Indícios correlatos e derivados do principal surgem nas investigações, e não é raro que se mostrem mais graves. Devem ficar isentos de investigação, devem esperar pela eventualidade de outra e improvável CPI pelo fato de não estarem citados no requerimento da CPI em curso? Isso é mais do que despropósito, é acobertamento de indícios criminais.

Revelações
A dimensão e a quantidade de problemas estão mostrando também que é preciso reconsiderar a limitação do número de CPIs concomitantes. Por que cinco, e não seis ou oito, ou lá o que seja? CPIs devem responder à função do Congresso e à gravidade do tema. A propósito, já que o Legislativo deixou de legislar para ser mero carimbador de medidas provisórias e de pequenas providências do governo, a horrorosa legislatura que se encerra deixou ao menos uma boa quantidade de revelações ao país, com as CPIs, conseqüentes ou não. Mas as revelações aos cidadãos talvez sejam a melhor conseqüência.


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