São Paulo, segunda-feira, 06 de agosto de 2007

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Cálculo político atrasa reforma, diz Abrucio

Professor da FGV afirma que partidos miram eleição ao discutir projeto e que fidelidade partidária é essencial

FERNANDO BARROS DE MELLO
DA REDAÇÃO

Os partidos sabem da necessidade de uma reforma política, mas divergem sobre como ela deve ser feita. Um dos motivos para isso são os cálculos sobre o futuro dos próprios políticos.
Para o cientista político Fernando Abrucio, da FGV, o PSDB se preocupa com a popularidade do presidente Lula, enquanto o PT teme o fortalecimento da cúpula partidária. Abrucio diz que não há "reforma salvadora" e que a fidelidade partidária é, nesse momento, o ponto mais importante. Leia os principais trechos da entrevista à Folha.  

FOLHA - O que dificulta a aprovação da reforma política?
FERNANDO ABRUCIO
- Houve reação na sociedade contra o casuísmo de regras que favoreciam a classe política atual e contra a idéia de votar em uma lista e não em pessoas. Já dentro do Congresso, existe consenso de que há vários problemas no sistema político. Mas não há consenso sobre qual remédio dar. Esse é o ponto.

FOLHA - Os partidos, quando falam de reforma política, medem riscos futuros para eles mesmos?
ABRUCIO
- Exatamente. Há uma grande dificuldade dos partidos fazerem o cálculo da reforma para além da sua carreira. O maior medo do PSDB é um fortalecimento exagerado do PT no processo político. Isso se daria pela lista fechada colada ao financiamento público. No fundo, eles estão preocupados com a popularidade do Lula. Para o PT, o temor é interno, de que haja o favorecimento da cúpula partidária. Sobretudo nesse momento em que há uma redivisão de forças no PT.

FOLHA - E o PMDB e o DEM?
ABRUCIO
- Você olha a votação no primeiro semestre do PMDB e é um saco de gatos. O partido que mais se interessava na reforma era o DEM. Eles imaginavam que ela favoreceria a cúpula partidária e achavam que diminuiria um pouco o peso dos pequenos partidos via fidelidade e cláusula de barreira, o que significa menos chance de perder membros. Além disso, o financiamento público pagaria a campanha de 2008. É preciso pensar nas estratégias dos atores envolvidos.

FOLHA - Uma questão levantada por deputados é a de que não seria possível aprovar financiamento público de campanha sem voto em lista fechada. Isso é verdade?
ABRUCIO
- Se nós colocarmos um financiamento público exclusivo, é difícil imaginá-lo sem a lista. Mas o pior problema do sistema é manter o financiamento para cargos majoritários e não para os proporcionais. Outro ponto essencial é a distribuição de cargos. Para montar maioria, os governos precisam de deputados, que aceitam ficar na base governista sobretudo pela distribuição de cargos. Essa que é a grande cola do sistema político brasileiro.

FOLHA - O que fazer, então?
ABRUCIO
- Prefiro uma melhoria do atual sistema, que signifique maior capacidade de controle, maior transparência, redução de candidatos.

FOLHA - E financiamento público?
ABRUCIO
- Acho que essa rodada de reforma do primeiro semestre tinha um bode na sala: o financiamento público, que foi colocado como a resposta ao sistema, mas não acho que seja. É possível melhorar o sistema de financiamento de campanha, sem ter um sistema exclusivo de financiamento público.

FOLHA - Como?
ABRUCIO
- O atual sistema já é misto. Financiamento público não é só fundo partidário, é horário eleitoral gratuito também. Se você tem horário de rádio e TV só para quem tem grau de representatividade razoável, reduz o número de candidatos. Assim, os TREs poderiam controlar muito mais. Também é preciso melhorar o controle de fundo partidário. Denúncias de corrupção e de caixa 2 deveriam levar a penalidades no fundo. Do lado do financiamento privado, precisa criar regras que obriguem que os candidatos declarem via internet e também criar restrições sobre quem pode financiar. Provavelmente, limitando financiamento à pessoa física.

FOLHA - A lista fechada é fundamental ao projeto?
ABRUCIO
- Temos que olhar quais são os verdadeiros problemas. A idéia de que existe reforma salvadora é um equívoco. O sistema atual de lista completamente aberta é ruim. Agora, é preciso soluções que não piorem ainda mais. O sistema mais elogiado é o da Irlanda: há uma lista apresentada pelo partido, mas o eleitor pode mudar a ordem de candidatos. Mas primeiro precisamos criar vida partidária, com prévias, primárias. Nesse atual momento a fidelidade partidária é a medida mais importante.


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