|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SERRA
Com dificuldades para consolidar sua rede de apoios e campanha de altos e baixos, candidato chega à reta final entre o êxito e o fiasco político
Após percurso acidentado, tucano aposta no 2º turno
ELIANE CANTÂNHEDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RAYMUNDO COSTA
EM SÃO PAULO
Depois de uma campanha de
"três contra um", o candidato do
presidente Fernando Henrique
Cardoso, José Serra (PSDB), chega ao dia da eleição seis quilos
mais magro, gripado e rouco, mas
com a "sensação de que vou ganhar a eleição" -sentimento expresso após uma jornada de campanha no Rio Grande do Sul, no
início da semana.
Para "ganhar a eleição", Serra,
60, precisa passar para o segundo
turno e recolher apoios como se
começasse do zero. No primeiro
tempo, para usar uma imagem recorrente do próprio tucano, que
diz empregar a tática da seleção
brasileira na última Copa, foram
poucos os que se mantiveram ao
lado dele até o fim.
FHC é um deles. Assim como
foi fundamental na escolha de
Serra para ser o candidato do
PSDB, o presidente agiu para evitar que decisões de governo piorassem suas chances no final, como ocorreu no início da campanha ao permitir um aumento no
preço do gás de cozinha.
Foi um dos piores momentos
para a campanha de Serra. Ele
próprio atacou a política de preços dos combustíveis adotada pela Petrobras, explicitando o que
de início tinha dificuldades para
dizer: era o candidato de FHC,
mas não do governo.
Pior do que o aumento de preços, segundo a avaliação da campanha de Serra, foram os 15 dias
que antecederam o início do horário eleitoral gratuito no rádio e
na TV, época em que as notícias
de renúncia do candidato ganhavam credibilidade diante de sua
dificuldade para crescer nas pesquisas de opinião.
Serra atravessou a campanha
sob a acusação de "destruir adversários", mas apanhando simultaneamente de Ciro Gomes, candidato da Frente Trabalhista (PPS-PDT-PTB), de Anthony Garotinho (PSB) e de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT). Ele e o governo, ou o
governo e ele.
Ônus sem bônus
O grande trunfo de Serra foi
também seu principal problema:
ser o candidato do governo. Depois de dois mandatos, oito anos,
sucessivos abalos econômicos,
mais vidraça do que vitrine.
Na dúvida entre ser ou não governo, Serra ficou no meio do caminho. Herdou o ônus, sem ter o
bônus. Um grande ausente da
atual campanha é justamente a
acusação mais comum em qualquer campanha: o uso da máquina a favor do candidato oficial.
Além de deixar um "meio FHC"
para Lula no meio do caminho,
Serra também deixou uma legião
de ex-aliados para Lula e Ciro,
principalmente. Da aliança que
elegeu e sustentou o governo FHC
durante quase uma década, muito
pouco restou no fim da campanha tucana.
Serra perdeu o PFL institucionalmente e correu o risco de perder a maioria dos pefelistas quando Ciro Gomes se tornou a grande
onda da campanha. Nunca conseguiu unanimidade do PMDB, responsável por poderosos minutos
na propaganda eleitoral da TV. E
enfrentou dissidências no próprio
PSDB, a partir do Ceará.
A linha de Lula nas pesquisas de
toda a campanha é estável, com
tendência ascendente. A de Garotinho é estável durante um tempo
e crescente na reta final. A de Ciro
é um "V" invertido: ele cresceu rápido e caiu ladeira abaixo. E a de
Serra é tão esquizofrênica quanto
sua campanha: sobe, desce, sobe,
desce, sem jamais estar num patamar considerado "seguro". O
ponto crítico roçou os 10%, quase
o quarto lugar.
Desde o início, Serra era acusado de ser "o candidato da mídia",
mas reclama de ter sido tratado
sempre de forma negativa, como
reclama um dos mais fiéis serristas da eleição, o líder do PSDB na
Câmara, Jutahy Magalhães Jr.
(PSDB-BA).
Quando Serra disputava a legenda, escrevia-se que ele perderia para o então governador do
Ceará, Tasso Jereissati. Quando a
conquistou, que ele "não iria decolar" e iria ser substituído pelo
presidente da Câmara, Aécio Neves. Ao negociar o apoio do
PMDB, considerava-se que não
iria conseguir. Quando conseguiu, que era um apoio "podre" e
"infiel". Ao subir nas pesquisas no
início do ano, dizia-se que "era
uma bolha". Ao cair em seguida,
que estava "morto". A previsão
era de uma "debandada em massa" dos aliados, que nem colocavam sua foto, ou mesmo nome,
nos outdoors de campanha.
Serra teve uma campanha difícil, política e internamente. O humor e a eficiência do seu comitê
variavam de acordo com as pesquisas, as chances, as ameaças de
defecção. As disputas por espaço
multiplicavam-se. E faltava dinheiro.
Ao mesmo tempo em que era
acusado de ser o candidato dos
"banqueiros" e do "capital internacional", Serra sofreu abalos
profundos com a situação econômica que, em alguns momentos,
parecia fora de controle. O dólar
disparava, as Bolsas caíam, a culpa era do governo. E quem "pagava o pato", portanto, era o "candidato do governo".
Acusado por FHC de não defender os avanços de seus dois mandatos, Serra também suportou
sorrisos, conversas a sós, telefonemas constantes e elogios "de bastidores" de FHC para Lula. Sempre considerados um "já ganhou"
para Lula e um "já perdeu" para
José Serra.
Ele, também, é o "candidato da
indústria paulista", mas empresários não sentiam firmeza na candidatura e apressavam-se a promover encontros com Ciro Gomes, num determinado momento, e a aderir ao favorito Lula,
quando a distância entre haver ou
não segundo turno estava por um
fio. Ou um ponto, literalmente.
Recomposição
Numa campanha recheada de
"se", o tucano chega a este domingo com o fantasma de três "se": se
houver segundo turno, se não for
Garotinho e se finalmente for ele,
Serra vai ter que recosturar toda a
sua campanha.
Pode descartar desde já o apoio
de Antonio Carlos Magalhães
(BA) e do clã Sarney (MA) -eles
estão com Lula desde o primeiro
turno e acusam Serra de ter participado de toda a operação policial
que desmontou a candidatura de
Roseana Sarney.
Mas a cúpula da campanha
aposta que Tasso Jereissati e o
PFL praticamente inteiro fecharão com Serra, enquanto o PMDB
que já é serrista finalmente vai arregaçar as mangas. Nesse processo de recomposição, a promissora
campanha do tucano Geraldo
Alckmin ao governo de São Paulo
poderá ser fundamental.
Quanto a Ciro e Garotinho, Serra pode até tentar, mas com pequenas chances. Com exceção do
líder do PPS no Senado, Roberto
Freire (PE), a cúpula cirista do
PDT já mal se continha de ansiedade para aderir a Lula no primeiro turno. E o discurso anti-governo de Garotinho projeta uma tendência pró-Lula -em quem,
aliás, o ex-governador do Rio diz
que votou em 94 e 98.
Quanto à disputa que de fato interessa, a do eleitorado que restar
dos derrotados do primeiro turno: a disputa a partir de amanhã,
se houver, será preto e branco,
mano a mano, sim e não.
Um "tie break" do vôlei entre
"oposição" e "governo". E Serra
vai ter que, finalmente, olhar para
os dados sobre FHC: o presidente,
apesar das críticas a seu governo,
tem quase 30% de ótimo e bom
nas pesquisas. Na reta final, o candidato tucano só passou a barreira dos 20% das intenções de voto
dias atrás. FHC vai ter que, finalmente, ser chamado a entrar na
campanha.
Os tempos de TV no segundo
turno são iguais, as condições,
também. Com uma diferença: Lula entra com a onda e a maioria do
eleitorado a favor, Serra chega por
um triz, cansado e magro.
Mas, como diz Jutahy, quem ultrapassou tantos obstáculos e ressurgiu das cinzas tantas vezes numa só campanha não entra no segundo turno para perder. Se houver segundo turno, todas as fraquezas de Serra o terão tornado
forte. E ele vai disputar com Lula
como se fosse a última coisa que
faz na vida.
Ao contrário de 1996, quando
perdeu a eleição para a Prefeitura
de São Paulo, Serra chega ao final
da campanha em paz com seu
"marqueteiro" Nizan Guanaes.
"Criativo" e "gênio" são duas expressões que o candidato costuma usar sobre o publicitário.
Nizan, por sua vez, cobrou do
candidato os apoios políticos para
vencer. O marketing, por si só, argumentou, não levariam Serra à
Presidência. Por duas vezes, Nizan cobrou o empenho dos políticos na campanha.
Ele tinha o que cobrar: quando a
campanha de Serra parecia desandar, foi Nizan quem garantiu
os pagamentos da equipe.
A campanha de Serra terminou
como começou -improvisada.
Anteontem no Rio, ele planejava
ir a Goiânia, Pernambuco e Paraíba. Cancelou os três. Voltou para
São Paulo, prometendo encerrar a
campanha na Mooca.
1942
Em 19 de março, nasce em São
Paulo José Serra Chirico, filho único de Francisco Serra e Serafina
Chirico Serra. De origem modesta, foi criado na Mooca, bairro
paulistano em que se concentravam imigrantes italianos. Sua
educação básica foi na escola pública. Alfabetizado no Colégio
Dom Bosco, fez o ginásio no São
Judas Tadeu e o científico no Colégio Roosevelt
1963
Militante da Ação Popular -organização política ligada à Igreja
Católica- é eleito presidente da
União Nacional dos Estudantes
(UNE) em julho. Após o movimento militar que depõe o presidente João Goulart (1961-64) em
31 de março do ano seguinte, a
UNE é posta na ilegalidade e seus
diregentes são perseguidos. É
obrigado a deixar o país. Segue
primeiro para a França, depois
para o Chile e Estados Unidos
1973
Segue exilado para a França e então para o Chile. Casa-se com Sílvia Mônica Allende. Após o golpe
militar que depõe o presidente
Salvador Allende, deixa o país e
vai para os Estados Unidos
1978
De volta ao Brasil, candidata-se a
deputado federal pelo MDB. Sua
candidatura, porém, é impugnada sob o argumento de que seus
direitos políticos continuavam
suspensos
1986
Elege-se deputado federal constituinte pelo PMDB de SP. Dois
anos depois, participa da fundação do PSDB e é derrotado por
Luiza Erundina na disputa pela
Prefeitura de São Paulo
1995
Assume o Ministério do Planejamento no primeiro ano de governo Fernando Henrique. No ano
seguinte, deixa a pasta para novamente disputar a Prefeitura de
São Paulo. Derrotado mais uma
vez, termina em terceiro lugar,
atrás de Celso Pitta e Luiza Erundina, que disputaram o segundo
turno. Convidado para assumir o
Ministério da Saúde, prefere voltar ao Senado
1998
Durante reforma ministerial promovida por Fernando Henrique,
deixa a presidência da Comissão
de Assuntos Econômicos do Senado para substituir Carlos Albuquerque na pasta da Saúde. Sua
atuação no Ministério seria a
principal plataforma de lançamento de sua candidatura à Presidência da República, em fevereiro de 2002, com o apoio do Palácio do Planalto
Texto Anterior: PT leva militância de 700 mil às ruas hoje Próximo Texto: Frases Índice
|