São Paulo, domingo, 06 de outubro de 2002

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CIRO

Com poucas chances de passar ao 2º turno, Ciro apoiaria Lula contra Serra, mas a Frente que já começou a abandoná-lo deve rachar

Isolado, candidato remói erros e tem futuro incerto

PATRICIA ZORZAN
DA REPORTAGEM LOCAL
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Se o apoio de Ciro Gomes (PPS) a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em um eventual segundo turno da eleição presidencial é dado como certo pelas pessoas mais próximas do candidato, seu futuro político ainda é considerado uma incógnita por todos.
Acabada a primeira fase da disputa, o ex-governador deve, como admitem alguns de seus mais fiéis aliados, não apenas declarar publicamente sua adesão ao petista como também empenhar-se pessoalmente para que ele seja eleito o sucessor de Fernando Henrique Cardoso.
Isso significa que pode até mesmo subir no palanque de Lula. Principalmente se, ao que tudo indica até aqui, a disputa for travada contra seu maior desafeto, o ex-ministro José Serra (PSDB).
Mas, se para Ciro a decisão parece óbvia, a escolha do caminho a seguir vai provocar mais um racha na Frente Trabalhista que apóia sua candidatura. Ou que apoiava, diriam os mais realistas.
Enquanto o PDT de Leonel Brizola preferiu nem mesmo esperar pela contagem dos votos para optar publicamente por Lula, o PTB de José Carlos Martinez acena em direção ao candidato do governo.
Embora Martinez venha demonstrando uma tendência pró-PT, o restante do partido prefere Serra. Em busca de argumentos que justifiquem a adesão ao tucano, listam as incompatibilidades históricas com a legenda de Lula e a intolerância que atribuem aos colegas petistas.
Apesar de responsabilizar Serra pelo ressurgimento de suas ligações com o ex-presidente Fernando Collor de Mello, Martinez já avisou ao vice da chapa, o sindicalista Paulo Pereira da Silva (PTB), o Paulinho, de que não poderá contrariar a decisão da maioria.

Paulinho
O sindicalista também está entre os que devem se reagrupar em torno da candidatura petista. Paulinho já havia manifestado sua opinião sobre assunto logo que Ciro começou a cair nas pesquisas de intenção de voto.
Depois, chegou a demonstrar hesitação diante de seu projeto pessoal de concorrer à Prefeitura de São Paulo. Segundo assessores, ponderou que uma vitória de Lula fortaleceria a prefeita Marta Suplicy, sua adversária natural na disputa pelo comando da cidade.
Mas, pesados prós e contras, deve acabar recomendando o voto no PT e colocando oficialmente à disposição de Lula a estrutura da Força Sindical, central de cuja presidência se licenciou para concorrer ao Planalto ao lado de Ciro.
Em troca, comunicou a Lula que gostaria apenas de enviar sugestões de alguns nomes para o Ministério do Trabalho de sua eventual administração.
Nem mesmo no PPS de Ciro há uma definição. O presidente da sigla, senador Roberto Freire, já afirmou que o partido fará publicamente sua escolha.
Correligionários declaram que a opção natural da legenda seria Lula, mas apontam dificuldades regionais para a concretização do apoio. O caso mais citado até o momento era o do Rio Grande do Sul. A disputa no Estado, entretanto, dá sinais de que não servirá de impedimento, já que pesquisas realizadas nos últimos dias indicam que Antônio Britto (PPS) está cada vez mais distante da possibilidade de ir ao segundo turno contra Tarso Genro (PT).
Há quem diga, contudo, que Freire gostaria mesmo é de uma união com a candidatura governista. O senador, que causou inúmeras polêmicas durante a campanha, evita tocar no assunto, mas já afirmou que um eventual governo Serra não pode ser considerado um problema para o país.
Diante de tantas indefinições, a semana começará com uma série de reuniões em que serão discutidos os rumos de cada um dos partidos. Integrantes da aliança defendem que PTB, PDT e PPS decidam unidos, mas admitem que essa possibilidade hoje é remota.
Especialmente depois de Brizola e de Martinez terem articulado a renúncia de Ciro em favor de Lula. Muito irritado com a iniciativa, o ex-governador não demonstra disposição nem sequer de sentar-se à mesa com os dois para começar a discutir a questão, garantem seus interlocutores.

Lula do Lula
Aos 44 anos, Ciro, ex-deputado, ex-prefeito, ex-governador e ex-ministro da Fazenda, como ele mesmo gosta de repetir, termina sua segunda disputa pelo Planalto com um percentual de votos válidos semelhante ao do final da campanha de 1998 -10,97%, conforme dados oficiais do TRE (Tribunal Superior Eleitoral).
Seu poder de negociação hoje, entretanto, é muito maior. Segundo colocado na disputa durante um longo período do primeiro turno, é citado como um dos ministeriáveis de Lula.
Entre os integrantes da Frente Trabalhista, são poucos os que se atrevem a fazer considerações sobre o futuro político do pepessista. Mas, quando surgem, as propostas são variadas. Vão de um extremo ao outro, em um exemplo típico do desencontro que marcou toda a campanha.
Do PPS, partem ponderações de que o candidato deveria recomeçar sua carreira tentando novamente se eleger prefeito de Fortaleza. Integrantes da cúpula da legenda avaliam que essa poderia ser a melhor forma de tentar recuperar a imagem do ex-governador, desconstruída com o bombardeio promovido pela propaganda eleitoral de Serra.
Já no PTB que se manteve fiel ao candidato, a idéia é torná-lo presidente da sigla que deve nascer da fusão da legenda com o PDT.
Líder do PTB na Câmara e um de seus vice-presidentes, o deputado federal Roberto Jefferson é o autor da proposta.
"Antes eu achava que esse cargo deveria ser do Brizola. Mas ele erra muito. Ciro é melhor", ataca Jefferson, referindo-se à sugestão do pedetista de que Ciro renunciasse à sua candidatura em favor de Lula ainda no primeiro turno. "Ele é que sairá da eleição como o grande líder", completa.
Para levar o projeto adiante, o deputado promete sugerir a filiação do candidato à sua legenda.
Mas é como um oposicionista que o próprio Ciro costumava se definir, sempre que mencionava a possibilidade de não chegar ao segundo turno.
"Se não for eu o escolhido pelos brasileiros para ter a honra da governar o país, servirei ao Brasil na oposição", repetiu incontáveis vezes durante toda a primeira fase da eleição deste ano.
"Ele será o Lula do governo Lula, mas com propostas", declarou o deputado João Herrmann, que faz parte da coordenação da campanha do ex-governador e é líder do PPS na Câmara.
Já entre os assessores do presidenciável há quem aposte em sua participação na disputa por uma vaga no Congresso Nacional nas próximas eleições.
Não que tenha desistido da Presidência da República, um projeto, avaliam alguns interlocutores, a ser retomado daqui a aproximadamente duas eleições.
Amigos do candidato discordam. Afirmam que os prejuízos à sua imagem já foram superados e que ele está pronto para uma nova sucessão presidencial.
"Além de ter se tornado uma liderança clara, foi investigado e o máximo que conseguiram contra ele foi apontá-lo como destemperado", disse um aliado próximo.

Renúncia
A menos de 48 horas da eleição e já conscientes da derrota, interlocutores do pepessista ainda enumeram, desolados, os erros cometidos pela campanha.
Entre os problemas mais citados, a falta de profissionalismo de grande parte da equipe -basicamente formada pela família do candidato-, o temperamento de Ciro e o descompasso entre os integrantes da Frente Trabalhista.
Se a divisão de opiniões era óbvia desde o início do processo eleitoral, quando Freire fez críticas públicas à possibilidade de uma aliança formal com o PFL, tornou-se mortal quando Brizola, Martinez e o guru intelectual de Ciro, o filósofo Roberto Mangabeira Unger, passaram a defender a renúncia do candidato diante de sua iminente derrota.
Ciro não renunciou por duas razões. Primeiro, porque como todo político, sempre achou que uma chance mínima ainda era uma chance. Avaliava que nesta que foi a mais televisiva de todas as campanhas presidenciais, teria uma possibilidade de reversão do quadro com sua aparição no debate da TV Globo de quinta-feira.
Segundo, pelo temor da reação do eleitorado diante de uma decisão como essa.
"Poderia parecer que sempre houve um conchavo entre nós. Não haveria garantias de que os meu votos iriam para o Lula. Poderiam também ir para o Serra e acabar garantindo a realização do segundo turno. Seria um suicídio para mim", explicou para alguns de seus aliados mais próximos.

1957

Em 6 de novembro, nasce em Pindamonhangaba (SP) Ciro Ferreira Gomes, filho do cearense José Euclides Ferreira Gomes Junior e da paulista Maria José Santos Ferreira Gomes. Aos quatro anos, muda-se com a família para Sobral (CE). Seus parentes são antigos políticos da região. Seu bisavô paterno foi prefeito de Sobral, cargo ocupado mais tarde por seu avô e também por seu pai

1982

Após formar-se na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará em 1979, inicia sua carreira política como segundo suplente de deputado estadual no Ceará pelo PDS, mesmo tendo se filiado fora do prazo estabelecido, pelas mãos de seu pai, José Euclides Ferreira Gomes Júnior, prefeito de Sobral. Eleito, assume a cadeira na Assembléia logo no início do mandato

1986

Reeleito deputado estadual pela legenda do PMDB, torna-se líder do governo do empresário Tasso Jereissati, seu amigo e padrinho político, na Assembléia Legislativa do Ceará

1988

Com o apoio de Tasso Jereissati, vence as eleições municipais e torna-se prefeito de Fortaleza. Cumpre o mandato por quinze meses, quando renuncia para concorrer ao governo do Estado

1990

Em outubro, elege-se governador do Estado do Ceará -mais uma vez com o apoio de Tasso Jereissati- pelo recém-formado PSDB. É o único governador eleito pelo partido

1994

Em 7 de setembro, renuncia ao governo do Ceará para atender ao convite do presidente Itamar Franco e assumir o Ministério da Fazenda no lugar do embaixador Rubens Ricupero. Permanece até 1º de janeiro de 1995, quando é substituído por Pedro Malan, indicado pelo novo presidente da República, Fernando Henrique Cardoso

1998

Após período nos Estados Unidos como estudante visitante da Universidade de Harvard, aproxima-se do filósofo Roberto Mangabeira Unger, que atuaria como guru em seus próximos programas de governo. Em 1997, descontente com o PSDB, filia-se ao PPS. No ano seguinte, lança-se pela primeira vez candidato à Presidência da República. Termina em 3º lugar, atrás de FHC e Lula


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