São Paulo, terça-feira, 06 de novembro de 2001

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Doações "esquentavam" dinheiro

DO ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Os papéis que parecem ser o livro-caixa secreto da campanha de Cassio Taniguchi contêm algumas inscrições cifradas. Por exemplo, aparecem vários "D" na frente do nome de doadores. A Folha apurou que isso significa que se tratam mesmo de doadores. É importante a distinção, pois alguns doadores da campanha aparecem com a inscrição "E" à frente de seus nomes. Esses são de uma categoria especial.
Ao todo, 22 doadores estão na classe "E". Representam um valor total doado de R$ 1,5 milhão, quase a metade do declarado ao TRE oficialmente por Taniguchi. O "E" era como o pessoal do comitê financeiro do PFL de Curitiba tratava uma operação chamada "engenharia financeira". São casos de doadores que fazem a entrega do dinheiro oficialmente, mas recebem o mesmo valor de volta, de maneira informal, sempre em espécie, para evitar o rastreamento.
A razão dessa operação é simples. Algumas campanhas quase sempre recebem doações ilegais ao longo do tempo. Quando chega a hora da prestação de contas no TRE, é necessário declarar a origem do dinheiro. Por isso empresas amigas são convidadas a fazer doações "quentes" para esquentar o dinheiro "frio" que já estava no caixa do político.
A doação é perfeitamente legal. Sempre realizada por meio de cheque nominal, aparece na prestação de contas ao TRE. O que é ilegal é a devolução do dinheiro, numa transação "por fora". Como a devolução era feita em dinheiro, por funcionários subalternos, o receptor do valor devolvido era convidado a assinar um recibo atestando o pagamento. A pessoa do comitê garantia assim que realmente havia feito a operação. Há muitos desses recibos no material obtido pela Folha.
Na tentativa de se eximir de culpa, uma empresa confirmou a veracidade de um desses papéis. A Risotolândia, grande fornecedora de refeições para a Prefeitura de Curitiba (fatura cerca de R$ 1,5 milhão por mês com o contrato municipal), realizou uma doação de R$ 100 mil no esquema de "engenharia financeira" em 28 de agosto de 2000.
Três dias depois, em 31 de agosto, o diretor Marcelo Bueno assinou um recibo atestando ter recebido os R$ 100 mil de volta por "prestação de serviços". O superintendente da Risotolândia, Carlos Humberto de Souza, foi contatado para explicar a operação. Sua reação inicial foi negar a transação. Depois de examinar o recibo, entretanto, mudou sua versão e acabou "autenticando" a fotocópia em posse da Folha.
"Nós recebemos [o recibo" do partido, do PFL, em função de serviços prestados durante esse período da campanha. Isso significa eventos tipo almoços, jantares que são feitos aí para correligionários", disse Humberto.
Como na declaração de Taniguchi ao TRE não consta nenhum tipo de pagamento à Risotolândia, a versão complicou ainda mais a situação do prefeito curitibano.
Ao saber que sua explicação para a existência do recibo era incompatível com a parte oficial da campanha pefelista, o superintendente da Risotolândia declarou: "Aí também não sei como foi feita a contabilidade deles interna nesse sentido. Teríamos até que conversar em três partes para termos um esclarecimento melhor (...). O motivo que levou eles [sic" a não declarar eu não posso citar exatamente". (FERNANDO RODRIGUES)


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