São Paulo, terça-feira, 06 de novembro de 2007

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Ministros querem julgar no STF deputado que renunciou

Integrantes do Supremo indicam que não aceitarão manobra de Cunha Lima

Ele deixou a Câmara dias antes de o tribunal analisar acusação de tentativa de homicídio para que o caso fosse levado à Justiça da PB

SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O STF (Supremo Tribunal Federal) indicou ontem que não aceitará que a renúncia do ex-deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) sirva de manobra jurídica para impedir a eventual condenação por tentativa de homicídio e sinalizou que o submeterá a julgamento.
Quatro dos 11 ministros votaram a favor de levar o processo ao fim, independentemente da renúncia. A decisão foi adiada por causa de um pedido de vista da ministra Cármen Lúcia. Ela deixou claro, porém, a disposição de votar no mesmo sentido. Ninguém defendeu o direito de Cunha Lima a abrir mão do mandato. O julgamento poderá ocorrer amanhã.
Relator da ação penal contra o ex-deputado, Joaquim Barbosa levantou a polêmica, citando norma da Constituição pela qual, após aberto o processo que possa resultar na cassação do mandato parlamentar, no próprio Congresso, a renúncia não impede a punição.
Barbosa defendeu que o STF mude a sua jurisprudência e, por analogia, aplique essa regra ao processo judicial. "Essa renúncia teve como objetivo exclusivo impedir a jurisdição desse tribunal", disse.
Cezar Peluso falou em seguida e apresentou outros dois argumentos, reforçando a tese de Barbosa. Ele considerou "abuso de direito" e "fraude" o ato de renúncia, anunciado na última quarta, a cinco dias do julgamento final, que seria ontem.
"Se fosse um ato praticado no início do processo ou no meio, eu não teria nenhuma dúvida em dizer que estava absolutamente conforme a norma jurídica. Não, porém, se às vésperas do julgamento por esta Corte ele assume contornos mais ou menos nítidos para impedir a incidência da norma", disse.
"Só às vésperas desse julgamento ele veio exercer esse direito [de renunciar], que eu entendo, assim como o ministro Peluso, como uma tentativa de fraude", declarou Barbosa. Os outros votos foram de Eros Roberto Grau e Cármen Lúcia.
Ao pedir vista, Cármen Lúcia lembrou o caso do ex-presidente Fernando Collor, que renunciou no momento em que o Senado já havia iniciado a sessão de julgamento, no desfecho do processo de impeachment, em dezembro de 1992. Sem poder declarar a perda do cargo, os senadores aplicaram a outra pena prevista na Constituição, o impedimento de concorrer a cargo público por oito anos.
Na época, Collor recorreu ao STF, alegando que a inelegibilidade seria uma pena "acessória", mas o tribunal ratificou a deliberação do Senado. Cármen Lúcia lembrou que, como advogada, emitiu parecer defendendo a punição.
Em 1993, Cunha Lima disparou dois tiros contra o adversário político Tarcísio Burity, em um restaurante de João Pessoa. O crime completou ontem 14 anos. Na quarta, Barbosa disse que a renúncia representava "um escárnio com a Justiça" e criticou o foro privilegiado. Afirmou ainda que a ação penal seria iria para a Justiça da Paraíba, onde recomeçaria da estaca zero. Ao abrir mão da condição de deputado, Cunha Lima também perderia o foro privilegiado (direito de só ser processado e julgado pelo STF).
O ex-deputado quer ser julgado por tribunal do júri em João Pessoa, onde espera ser absolvido. Ele manifestou esse desejo ao STF, alegando que cabe a júri apreciar acusações de crime contra a vida. Mesmo condenado, ele teria mais chances de entrar com recursos nas instâncias superiores até a prescrição do crime, prevista para no máximo 2012.
Ao final da sessão de ontem, um ministro afirmou em caráter reservado que a decisão a ser tomada valerá exclusivamente para o caso Cunha Lima e que eventuais renúncias de outras autoridades com foro no STF serão analisadas.


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