São Paulo, quarta-feira, 07 de março de 2001

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A MORTE DE COVAS

Clima mais tenso no velório ocorreu na chegada do corpo do governador, quando secretários, amigos da família e assessores choravam em volta do caixão de Covas, exposto no salão nobre

"O governo Mário Covas continua", diz Alckmin

O novo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, foi o único político a acompanhar o caixão de Mário Covas, ao lado da família Covas, na chegada para o velório no Salão Nobre do Palácio dos Bandeirantes. Eram 11h43. Fez-se um longo silêncio no salão.
"Na política brasileira, todos os significados da palavra dignidade podem ser resumidos num nome: Mário Covas", disse ele, rapidamente, aos jornalistas.
"O governo Mário Covas continua, em seus valores e seus princípios", comprometeu-se Alckmin, que assume o cargo até janeiro de 2003 e estava acompanhado da mulher, Maria Lúcia.
Até chegar ao Palácio dos Bandeirantes, o rápido cortejo fúnebre desde o Incor foi saudado ao longo de ruas e avenidas de São Paulo com aplausos, lenços e roupas brancas. No Morumbi, moradores portavam faixas: "Covas, descanse em paz".
A postura dos paulistanos foi de reverência silenciosa. Quase não se ouviam buzinas, à exceção de uma centena de motoqueiros que acompanharam o cortejo buzinando e gritando. O carro funerário estava protegido por um cordão de batedores da PM.
Ao chegar para o velório no Palácio dos Bandeirantes, o corpo foi recebido pela viúva do governador, Lila Covas, toda de preto e de óculos escuros, seus filhos, Renata e Mário Covas Neto, o Zuzinha, e a irmã de Covas, Nídia, além de Alckmin e a mulher.
O corpo foi velado durante todo o dia e a noite no Salão Nobre do palácio. O presidente Fernando Henrique Cardoso, 23 ministros, 16 governadores e parlamentares de todos os Estados compareceram. O enterro será hoje, no cemitério do Paquetá, em Santos.
Além de Covas, só um outro governador do Estado de São Paulo morreu no meio do mandato: Carlos de Campos, em 27 de abril de 1927. O cargo era denominado "Presidência de São Paulo".
Quando o corpo de Covas entrou no Salão Nobre, havia cerca de 400 pessoas ali, metade delas, jornalistas. O primeiro ministro a chegar foi Paulo Renato de Souza (Educação), que estava desde as 7h no Incor. Apesar da multidão, fez-se um longo silêncio até que o caixão fosse colocado no local.
O clima mais tenso e mais emocionado no Bandeirantes foi nesse início do velório, quando Lila aproximou-se do caixão e passou alguns minutos acariciando Covas e chorando.
Mais tarde, ela causou novo momento de comoção quando foi com sua neta, Sílvia, filha de Zuzinha, até o caixão. Sussurrou algo ao ouvido dela, que sorriu.
O secretário de Ciência e Tecnologia, José Aníbal, a deputada Zulaiê Cobra, o assessor de Comunicação, Oswaldo Martins, o secretário particular, Antônio Carlos Malufe, alguns deputados e várias secretárias choravam.
"Ele não podia ter feito isso com a gente", repetia Zulaiê, amparada pelos dois filhos e por colegas deputados. Ela é muito próxima da família Covas.
O caixão do governador estava ladeado por quatro cadetes da PM. Duas esculturas de anjos-tocheiros (considerados "guardiães das almas"), de 1,5 m de altura, foram postas dos dois lados.
Eram esculturas do século 18, em madeira, do acervo do próprio palácio. Logo atrás do caixão, havia uma pequena imagem de Nossa Senhora com Jesus, em marfim e madeira. No meio da tarde, chegou também uma estátua do "Senhor morto".
Na primeira hora do velório, chegou a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, acompanhada do marido, o senador Eduardo Suplicy (PT). Marta abraçou longamente Renata e depois Lila.
Por volta das 13h, abriram as portas para cidadãos comuns. Ou seja, sem o adesivo verde que indicava as "autoridades".
Um momento de susto: o santista Plínio Augusto de Camargo, 61, muito parecido com Covas, entrou no salão. Da mesma altura, barriga proeminente, cabelos brancos cortados rentes, ele já está acostumado a ser confundido com o conterrâneo.
"Na greve dos professores, quase quebram os vidros do meu carro", contou ele, que na época saía justamente do Palácio dos Bandeirantes.

"Ele se foi para sempre", diz Lila
Ao abraçar Lila Covas, o ex-governador Richa estava com presidente da Itaipu Binacional, Euclides Scalco. Em minutos, juntou-se a eles o ministro da Saúde, José Serra. Além deles, foram fundadores do PSDB o próprio Covas, o presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Franco Montoro, que morreu em julho de 1999.
Richa e Scalco, desiludidos, abandonaram a política e o próprio PSDB. Richa, porém, continuou sendo próximo amigo de Covas e sempre jantava com ele quando em São Paulo. No velório, abraçou-se longamente com Lila, que chorava alto: "Ele se foi. Se foi para sempre", dizia ela.
"Se fosse outro, já tinha desistido há muito tempo. Ele, não. Ele lutou até o fim. Era um guerreiro. Queria saber de tudo, queria participar até o fim", relatou a viúva de Covas a Richa.
Serra havia chorado duas vezes pela manhã, durante o lançamento de uma campanha de saúde em Recife. "Um grande lutador", definiu, quando soube da morte.
No velório, Serra dizia à imprensa, no canto à direita do salão, que Covas era um "político único, insubstituível, pelo padrão ético irretocável".
No canto à esquerda, o governador Tasso Jereissati (CE), outro presidenciável tucano, classificava Covas como "uma unanimidade". Antes de morrer, Covas declarou preferência por Tasso, apesar de Serra ser paulista.

Um PFL de cada lado
Os representantes do PFL também se dividiram em dois grupos: o vice-presidente da República, Marco Maciel, o presidente do partido, senador Jorge Bornhausen (SC), o líder na Câmara, Inocêncio Oliveira, e o presidente da seção paulista, Cláudio Lembo, chegaram juntos.
O ex-presidente do Senado Antonio Carlos Magalhães (BA), em confronto aberto com o PMDB, o governo e FHC, chegou com sua própria tropa pela entrada principal, fazendo questão de passar no meio de uma pequena multidão de anônimos.
Estavam com ele o senador e ex-governador da Bahia Paulo Souto, o prefeito de Salvador, Antonio Imbassahy, e o ex-ministro Rodolpho Tourinho, demitido por FHC na véspera do Carnaval.
Num ambiente fortemente político, ninguém se arriscava a dar declarações formais sobre a crise política instalada em Brasília pelas denúncias feitas por ACM e pelas provas que surgem contra o atual presidente do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA).
Jader também compareceu ao velório, pouco depois da chegada do do presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG).


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Agora vocês têm de repassar adiante"

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