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DECORAÇÃO BUROCRATA
Desenho do pintor espanhol, que divide moldura com restos de insetos, foi descoberto por historiador
INSS encontra por acaso obra de Picasso
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Uma mulher desenhada por Pablo Picasso passa os dias debaixo
de luzes fluorescentes e em meio à
papelada de uma repartição do
governo federal. O desenho é uma
das preciosidades do patrimônio
do INSS (Instituto Nacional do
Seguro Social) localizadas recentemente e quase por acaso.
O historiador Francisco Azevedo tentava recompor o acervo do
INSS. Procurava "Homens numa
Jangada", uma tela de Cândido
Portinari, da qual só foi encontrada uma reprodução. "Na nossa
avaliação, trata-se de um objeto
novo colocado numa moldura
antiga", escreveu Azevedo num
laudo de sua consultoria ao Ministério da Previdência. O quadro
original era de 1940. A pedido do
instituto, a Polícia Federal investiga a hipótese de furto.
Na busca do Portinari, o historiador encontrou o desenho de
Picasso numa das salas da administração do INSS em Brasília.
Sob a moldura, havia restos de insetos e uma segunda assinatura
do artista espanhol, que indicaria
a autenticidade da obra. "Não fazemos idéia do que pode ter sido
perdido", afirma o historiador.
O trabalho de rastreamento das
obras se torna complicado por
causa de uma antiga regra do patrimônio da União. Na lista dos
bens numerados, não apareciam
detalhes da peça nem de sua autoria, mas apenas a indicação "obra
de arte de vulto histórico".
A moldura encontrada com a
reprodução de "Homens numa
Jangada", por exemplo, levava
duas plaquinhas do patrimônio:
7332-Ipase e 004.206-INSS.
"Nem sabemos se o Portinari
está realmente desaparecido",
disse o coordenador-geral de logística do INSS, Cantídio Mundin
Neto. Parte das obras localizadas
do acervo está num depósito no
prédio da diretoria do órgão. Outras peças do Museu da Previdência, fechado há cinco meses, estão
armazenadas numa empresa
transportadora.
Pendurada desde o final do ano
passado numa das salas da diretoria do instituto próxima de uma
fotografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a mulher de Picasso ainda aguarda um destino
melhor. "A sensibilidade para a
arte nem sempre foi o forte na administração pública, mas não podemos perder uma riqueza dessas", observa o ministro Amir
Lando (Previdência), disposto a
negociar um lugar mais seguro
para as obras, onde elas possam
ser expostas ao público.
Há atualmente uma mostra
com 126 trabalhos de Picasso em
cartaz em São Paulo, no parque
do Ibirapuera. A exposição prossegue até o dia 2 de maio.
As principais obras de arte do
INSS faziam parte da coleção particular de Tomás Santa Rosa,
comprado pelo antigo instituto de
Previdência, o Ipase, em 1957, ano
seguinte ao da morte do artista
plástico pernambucano. Santa
Rosa trabalhou como auxiliar de
Portinari, que também foi seu padrinho de casamento.
No início dos anos 50, Santa Rosa passou uma temporada na Europa, época em que teria se encontrado com Picasso e comprado um de seus desenhos.
Além do desenho da mulher de
braços cruzados e dos indícios de
uma tela de Portinari, a coleção de
Santa Rosa também reúne pinturas a óleo do também pernambucano Augusto Rodrigues, telas do
próprio Santa Rosa e outras de
autoria desconhecida.
O Museu Santa Rosa -destino
original da coleção- foi extinto.
As obras passaram para o também extinto INPS no final dos
anos 60 e viajaram para Brasília já
nos anos 90, quando a direção do
INSS mudou-se para a capital.
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