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Desvios no Bolsa Família chegam a R$ 318 mi por ano
Valor é referente a um ano; auditoria do TCU revela que donos de carros, políticos e mortos estão entre os beneficiários
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social, família pode ter patrimônio elevado, mas preencher os critérios estabelecidos
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Uma família de Sergipe declarou ter renda mensal de
R$ 35 por pessoa da família e se
credenciou a receber R$ 94 por
mês do Bolsa Família, mas foi
flagrada por uma auditoria do
TCU (Tribunal de Contas da
União) como proprietária de
sete caminhões avaliados em
R$ 756.467. Em outra família,
beneficiária do programa em
São Paulo, um dos integrantes
aparece como dono de motocicleta importada, modelo 2007.
Esses foram alguns dos casos
contados no relatório aprovado
ontem pelo TCU sobre o mais
importante programa de transferência de renda do governo
federal, que pagará R$ 11,4 bilhões neste ano em benefícios
entre R$ 20 e R$ 182 a mais de
11 milhões de famílias.
Entre os beneficiários do
Bolsa Família, que só podem
ter renda até R$ 137 mensais
por pessoa da família, o TCU
flagrou milhares de proprietários de veículos, políticos, pessoas com renda acima do limite
e até mortos, além de indícios
de pagamentos em duplicidade.
O combate às supostas fraudes
poderiam fazer o governo economizar o equivalente a 3,4%
da folha mensal de pagamentos
do programa ou cerca de R$ 318
milhões no período de um ano.
Ao cruzar a lista de beneficiários com os cadastros do Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores), auditores
identificaram mais de 106 mil
famílias proprietárias de carros
acima de R$ 4.000, critério
considerado "conservador" pelo tribunal. Entre os veículos
identificados, há 713 avaliados
em mais de R$ 100 mil.
O tribunal não divulga os nomes dos beneficiários relacionados aos indícios de fraude. Se
comprovada, as famílias são excluídas do programa, e é aberto
um processo administrativo
para a devolução do dinheiro
recebido indevidamente.
O Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pela
gestão do Bolsa Família, ponderou que uma família pode ter
patrimônio elevado e, ainda assim, preencher os critérios de
renda do programa.
"Patrimônio é um bem utilizável ou não dotado de valor
monetário, e não é computado
como rendimento financeiro
para o orçamento", justificou o
ministério, que também levantou a possibilidade de os carros
serem "herança ou doação" e
de os beneficiários terem tido
seus nomes usados de forma
fraudulenta, como "laranjas".
Políticos
O TCU também cruzou a lista de beneficiários do Bolsa Família com a relação de políticos
eleitos e seus suplentes nas
eleições de 2004 e 2006.
O cruzamento revelou a existência de 20.601 políticos que
recebem Bolsa Família, a maioria deles na categoria dos extremamente pobres. Na folha de
pagamentos de um mês, fevereiro de 2008, os políticos receberam R$ 1,6 milhão.
"Tal situação compromete a
eficácia do programa, na medida em que ocorre o pagamento
de benefícios a famílias fora do
público-alvo pretendido e, consequentemente, a não assistência a famílias desse público", registra a auditoria. O TCU cobra
maior controle do acesso ao
programa, baseado na renda
declarada pelo interessado.
O tribunal identificou 1,1 milhão de famílias com indícios
de renda acima do permitido.
Elas receberam mais de R$ 65
milhões na folha de fevereiro
de 2008. Consideradas só as
entrevistadas em 2007, o TCU
identificou mais de 195 mil com
indícios de omissão de renda.
O cruzamento com o Sisobi
(Sistema Informatizado de
Controle de Óbitos) revelou a
presença de quase 300 mil
mortos. Na folha de fevereiro
de 2008, foram identificados
3.791 benefícios pagos a famílias com pessoas mortas.
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