São Paulo, domingo, 07 de julho de 2002

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PT SOB SUSPEITA

Mário Maurici de Lima Morais atribui denúncias a interesses eleitorais

Secretário de Governo acusa "massacre" contra petistas

André Sarmento - 20.jun.2002/Folha Imagem
O secretário de Governo de Santo André, Mário Maurici de Lima Morais, em entrevista na prefeitura


LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Com a missão de defender a Prefeitura de Santo André das denúncias de corrupção, Mário Maurici de Lima Morais, 41, secretário de Governo, vai para o ataque. Diz que o PT está sendo "massacrado" por promotores, pela imprensa e por adversários políticos. "Em ano eleitoral, há uma convergência de interesses."
Em uma hora e meia de entrevista à Folha, o secretário repetiu 14 vezes não haver "indícios, provas ou testemunhos consistentes" que comprovem a denúncia dos promotores criminais, que acusam a prefeitura, por meio do secretário afastado de Serviços Municipais Klinger Luiz de Oliveira Sousa, de cobrar propina de empresas de ônibus da cidade.
Como não leu o procedimento investigatório, que ensejou a denúncia (acusação formal) à Justiça, Morais justificou suas críticas ao perfil das pessoas ouvidas pela Promotoria. Criticou primeiro a família Gabrilli, dona da empresa de ônibus Expresso Guarará, que acusou o pagamento de propina à prefeitura. Depois, o oftalmologista João Francisco Daniel, irmão do prefeito assassinado Celso Daniel, que afirmou ter ouvido que parte da propina foi para campanhas eleitorais do PT.
Na entrevista, Morais afirmou que Luiz Antônio Marrey Filho, última instância do Ministério Público de São Paulo, "faltou com a verdade" ao negar ter conhecimento da investigação promovida por promotores criminais.
Bem articulado e com voz pausada, o secretário não deixou de responder a nenhuma das perguntas e revidou todas as acusações. Leia trechos da entrevista:
 

Folha - Contra a Prefeitura de Santo André há três ações cíveis, uma penal e pelo menos 50 investigações em andamento. Qual a responsabilidade do PT?
Mário Maurici de Lima Morais -
Acho que há um massacre contra nós. O Ministério Público está exorbitando de suas funções. Alguns promotores agem de forma que beira a irresponsabilidade, aliás, beira não, atinge a irresponsabilidade. Se um cidadão comum acusasse alguém de um crime, sem documentos, provas ou testemunhos consistentes, como foi feita a denúncia criminal, certamente estaria sujeito à lei. Um promotor pode fazer essas coisas da maneira mais leviana possível porque, se processado por danos morais, quem pagará é o Estado.

Folha - O sr. leu o procedimento criminal que ensejou a denúncia?
Morais -
Não. Pedimos três vezes para ter acesso, mas não tivemos.

Folha - Se não leu, como afirmar que não há provas consistentes?
Morais -
Não é uma opinião só minha, é também do ministro Nelson Jobim [do Supremo Tribunal Federal, que arquivou pedido de inquérito para investigar o presidente do PT, José Dirceu, acusado de usar dinheiro de propina em campanhas eleitorais". Sei que não há provas. Tem o depoimento, por exemplo, de João Francisco, que não viu e não sabe de nada, mas que ouviu falar [da cobrança de propina de empresários e do uso do dinheiro para campanhas do PT".

Folha - Tem ainda o depoimento da empresária Rosângela Gabrilli...
Morais -
Sim. Foram ouvidos todos os donos de uma empresa [Expresso Guarará" e uma funcionária dessa empresa. É uma relação, no mínimo, incestuosa, estão todos do mesmo lado.

Folha - É um complô contra o PT?
Morais -
Em ano eleitoral, acho que há uma convergência de interesses. Isso faz, por exemplo, com que a imprensa dê mais peso a questões que não daria em condições normais. Há interesses de candidaturas colocadas, prontas a instrumentalizar denúncias contra adversários. Há os promotores de Santo André que gostam de holofote. Mas não há denúncias novas, são coisas que estão rolando há um ano, dois anos.

Folha - Por que o sr. tem afirmado que há interferência política na ação dos promotores?
Morais -
Vou citar um exemplo. Como não tivemos acesso ao procedimento criminal do Ministério Público, o presidente da Câmara Municipal de São Paulo, José Eduardo Cardozo (PT), e o advogado Márcio Thomaz Bastos perguntaram ao procurador-geral se ele sabia de alguma investigação envolvendo o PT de Santo André. [Luiz Antônio" Marrey disse que não tinha conhecimento. Só que, uma semana antes, o Tribunal de Contas do Estado nos avisou de um pedido de Marrey para que os contratos de Santo André fossem facilitados aos promotores. Acho isso, no mínimo, muito estranho.

Folha - Klinger é responsável pela cobrança de propina?
Morais -
Eu não seria responsável se admitisse uma coisa desse tipo. Conheço Klinger há três anos, trabalho com ele. É um excelente companheiro e um excelente secretário. Custa acreditar que ele possa estar envolvido nessas denúncias. Mas ninguém aqui é idiota. Queremos a investigação, desde que haja evidência de irregularidade, e não há. Temos os depoimentos do irmão de Celso Daniel e da família Gabrilli, cuja empresa não cumpriu seus deveres contratuais com a prefeitura.

Folha - Que deveres não cumpriu?
Morais -
A Expresso Guarará ganhou uma concorrência pública para construir um corredor tronco-alimentar (avenida de ônibus cortada por linhas laterais), mas não concluiu o serviço. A prefeitura cobrou e eles pediram um prazo maior. Cobrou de novo, e pediram um segundo prazo. Depois, afirmaram que a empresa havia gasto cerca de R$ 11 milhões, onde deveria gastar R$ 7 milhões. Montamos uma comissão especial de fiscalização para averiguar se essa informação (do gasto excedente) era verdadeira. Imediatamente, a Guarará entrou com três mandados de segurança para desfazer a comissão e para evitar ser obrigada a entregar seus relatórios financeiros. A Justiça negou dois mandados e um ainda não teve decisão. Por isso, para mim, essa denúncia tem muito mais cara de represália.

Folha - O sr. colocaria sua mão no fogo pela inocência de Klinger, de Ronan Maria Pinto e de Sérgio Gomes da Silva, todos denunciados pelo Ministério Público?
Morais -
Acho que não existe nenhum motivo no mundo para colocar a mão no fogo por alguém. Conheço Klinger há três anos. Nunca vi uma demonstração de que ele se locupletasse por meio de seu cargo público. Divergências políticas existem dentro do partido, o que é normal, mas nunca ninguém o acusou dessas irregularidades. Quanto a Ronan e a Sérgio, vi essas pessoas somente uma vez na minha vida, e não posso falar nada.



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