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CELSO PINTO
O vespeiro da Cedae
Ao anunciar a privatização da
Cedae, a empresa de água e saneamento, por R$ 4,8 bilhões, dia
10 de setembro, o governo do Rio
abriu um vespeiro bilionário. O
setor é uma fonte fantástica de
negócios, mas controversa e imersa numa complicada disputa legal.
Se tiver sucesso, o Rio terá aberto um caminho para a privatização do setor. Mais: seu modelo
vai virar uma referência.
O BNDES, que há anos quer
colocar o setor no programa de
privatização, ainda não ousou
sugerir um modelo, embora tenha encomendado trabalhos a
bancos de investimento. Seu presidente, André Lara Resende, diz
que, dado o enorme impacto social do setor, é um caso típico em
que o modelo deveria privilegiar
mais metas e serviços do que a
maximização do preço. Ele não
conhece em detalhes o modelo carioca.
O secretário da Fazenda do Rio,
Marco Aurélio Alencar, diz que o
modelo da Cedae prevê pesados
investimentos. Nos 25 anos de
concessão, o operador investirá
R$ 3,5 bilhões. Terá que fornecer
água para 95% das áreas urbanas em cinco anos e para 80%
das áreas rurais em dez anos. Em
cinco anos, terá que cobrir 60%
do esgoto sanitário. Assumirá várias obrigações, como o emissário
submarino da Barra da Tijuca e
a despoluição da baía da Guanabara. As áreas de baixa renda
terão cobertura obrigatória.
Além das metas, contudo, será
importante ter uma agência reguladora para fiscalizar o cumprimento. O impacto social da
água e saneamento (por exemplo,
sobre a saúde) é enorme, o que
torna o papel da regulação ainda
mais vital do que em outros setores já contemplados com agências
federais, como telecomunicações,
energia e petróleo.
O nó jurídico é complicado. A
Constituição diz que os municípios podem cuidar dos serviços
locais, mas também diz que regiões metropolitanas podem cuidar de serviços públicos de interesse comum. O argumento do
Estado do Rio é que o sistema de
coleta, tratamento e distribuição
é interligado em vários municípios, portanto só faz sentido examiná-lo como região metropolitana.
Alencar vai além e diz que nesse setor é vital ter escala e subsídios cruzados: áreas mais ricas
pagando pelo serviço de áreas
mais pobres. Se fosse municipal, o
serviço ficaria inviável.
Um projeto de lei do então senador José Serra define de vez a
questão. Num ano eleitoral, contudo, a chance de tramitar um
projeto que contraria os municípios é zero.
O Rio ganhou, em junho, uma
ação no Supremo que julgou inconstitucional o artigo 357 da
Constituição estadual que exigia
a aprovação de cada município
envolvido para a criação de região metropolitana. Restam, contudo, três ações no STF, uma do
PFL e duas do PDT, e uma ação
da Prefeitura do Rio, todas contra a privatização da Cedae.
Alencar aposta no julgamento
dessas ações em agosto, com vitória do governo estadual. Se ficar
alguma pendência, complicará
muito a privatização. Alencar
lembra que, mesmo que o STF
desse razão aos municípios, eles
só poderiam assumir a área indenizando os investimentos da Cedae, o que seria financeiramente
inviável.
Alencar argumenta que empreiteiras e intermediários financeiros têm estimulado prefeituras
a tocar a privatização, como
"uma negociata": como uma forma de tocar obras ou ficar com
contratos de gaveta. O fato de
haver 5.000 municípios, uma situação legal cinzenta e muito dinheiro potencial é uma mistura
explosiva.
A decisão de privatizar o setor
tem levantado polêmicas em diversos países. O Reino Unido vendeu as empresas do setor (e não
apenas concessões) e o resultado
foi mais do que controverso. Outros países preservaram a estrutura estatal, total ou parcialmente. São Paulo só aceita vender
parte da Sabesp, jamais o controle. Alencar lembra que a Cedae
deu prejuízo nos últimos três
anos e a vantagem de garantir
investimentos no futuro.
O preço, de R$ 4,8 bilhões, se
explica porque é a venda de
99,9% da empresa e não 19% como no caso da Telebrás, ou 15%
como na Vale. O desembolso imediato é R$ 1,2 bilhão, o restante é
distribuído em 25 anos. Os altos
índices de perdas (51%) e inadimplência (27%) garantem um
potencial de ganhos de eficiência.
Empresas britânicas e francesas
já mostraram interesse na Cedae.
A própria Sabesp sonha em comprar empresas pelo Brasil afora.
A conferir em setembro.
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