São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2008

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JANIO DE FREITAS

Fios enrolados


Formular a solução adequada para os grampos parece difícil, mas uma resposta aflita pode ser pior do que a espera

Dois aspectos semelhantes à primeira vista, mas de fato muito distintos, estão se confundindo e influenciando negativamente no problema das escutas telefônicas e ambientais.
Um deles é a disposição, nas instâncias mais altas do Judiciário e no governo, de reverter a proliferação das escutas autorizadas por juízes da primeira instância e instalar um controle para contê-las. Os fatos justificam o propósito, mas a solução proposta provoca reações fortes, em princípio também justificadas, da Associação dos Magistrados Brasileiros e da Associação dos Juízes Federais do Brasil.
Criar no Conselho Nacional de Justiça uma centralização das autorizações de escuta, para exame das razões em que foram baseadas (e eventual contenção da quantidade), implica dar ao CNJ o poder de uma decisão judicial que não consta das suas atribuições legais. Além disso, tende a expor os usuários dos telefones sob escuta à identificação excessiva e contrária à investigação.
As discussões sobre autoria, equipamentos e impropriedade das escutas recentes incitam o desejo de respostas imediatas. Pode-se supor até que menos para a opinião pública, mais divertida do que preocupada com os acontecimentos, do que para tranqüilidade dos passíveis de escuta nos altos níveis dos Poderes. Formular a solução adequada parece difícil, mas uma resposta aflita pode ser pior do que a espera. Ignorar, por exemplo, que o excesso de grampos também se deve à prioridade desse método investigativo na Polícia Federal, levaria a provável aumento de escutas ilegais, mesmo que com uso já ocorrente de terceirizados.
Outra sobreposição muito atual é uma espécie de condenação antecipada do diretor-geral (em afastamento provisório) da Abin, Paulo Lacerda, com sobras de mesmo sentido contra o seu superior, general Jorge Felix, ministro de Segurança Institucional.
Uma figura de bastidores, François René, levado da PF para a Abin por Lacerda para a ligação com a reportagem diária, emerge no centro da carga contra seu chefe. A ele é atribuída a origem das denúncias de imprensa contra dois integrantes do Supremo Tribunal Federal: Sepúlveda Pertence (hoje aposentado), por improbidades não comprovadas; e Gilmar Mendes, apresentado, nesse primeiro incidente, como autor dos feitos de um homônimo colhido pela PF.
Entendido que François René é assessor de plena confiança de Lacerda, desde ambos na PF, a dedução é que cumpriu ordens pessoais do diretor contra os dois ministros do STF. Daí a presumir que Paulo Lacerda é o responsável também pela recente gravação de Gilmar Mendes, logo, deve ser demitido, nem cautela telefônica foi necessária. Com extensão ao general Felix, pessoa de bons propósitos e seriedade funcional, agora acusado de falta de controle em uma área onde jamais alguém teve ou terá controle integral: agentes de espionagem são, por definição, criadores de confiança falsa.
Nada, porém, isentou ainda qualquer das possíveis origens da escuta telefônica de Gilmar Mendes/Demóstenes Torres -Abin, PF, empresa de espionagem e ordinarice avulsa.


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