São Paulo, sábado, 07 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / ESCÂNDALO DO DOSSIÊ

Crise do dossiê derruba Berzoini; PT expulsa 4 envolvidos no caso

Marco Aurélio assume cargo temporariamente; pressão foi feita para minimizar danos à campanha de Lula

Jorge Lorenzetti, Osvaldo Bargas, Hamilton Lacerda e Expedito Veloso foram envolvidos na tentativa de compra de dossiê


Marlene Bergamo/Folha Imagem
Berzoini, ex-coordenador-geral da campanha de Lula, ao anunciar licença da presidência da sigla


MALU DELGADO
ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Sob forte pressão do partido e do desejo velado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, se afastou ontem do comando da legenda, 16 dias após sua saída da coordenação de campanha da reeleição.
Ele foi substituído em caráter temporário pelo vice-presidente Marco Aurélio Garcia, o mesmo que já havia herdado a coordenação de campanha. É a quinta mudança na presidência do PT durante o governo Lula. A mudança ocorre, mais uma vez, pelos desdobramentos da crise provocada pelo envolvimento de petistas na tentativa de compra de um dossiê contra políticos do PSDB.
O afastamento de Berzoini foi decidido em reunião da Executiva Nacional do PT que durou mais de cinco horas. O partido decidiu, ainda, expulsar outros quatro envolvidos na crise: Osvaldo Bargas, Jorge Lorenzetti, Expedito Afonso Veloso e Hamilton Lacerda.
As medidas têm como objetivo principal minimizar os danos políticos à campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dar argumentos para os debates que ele enfrentará na TV a partir de amanhã. Agora, avaliam petistas, o presidente poderá dizer que o partido "não joga sujeira para debaixo do tapete como fez o PSDB durante o governo Fernando Henrique Cardoso".
Durante o anúncio do afastamento de Berzoini, Garcia chegou a utilizar a frase, mas recuou após perceber que poderia avalizar a culpa do dirigente no episódio: "Quem dera que todos os partidos pudessem fazer o que estamos fazendo aqui, e não jogassem sua sujeira para debaixo do tapete. No caso nosso, nem sequer é sujeira", disse o presidente interino.
Apesar de ter articulado o encontro da Executiva, com o aval de Lula, Garcia ficou calado durante toda a reunião.
Abatido e sério, Berzoini comunicou a decisão de afastar-se do comando do PT em entrevista coletiva na sede do partido em São Paulo. Leu uma nota justificando que sai em licença "pelo prazo necessário para o completo esclarecimento dos fatos". "Em nenhuma hipótese eu aceito a condição de envolvido no caso", disse em seguida.
Segundo petistas, a mensagem foi escrita pelo próprio petista e em sua primeira linha traduziu o principal motivo do afastamento: "Informo que, em benefício da unidade e da coesão do PT, decido licenciar-me da presidência nacional do PT."
A frase se traduz pelo quantidade de petistas que opinaram pela sua saída. Segundo a Folha, dez petistas manifestaram-se a favor da saída de Berzoini e apenas cinco foram contra. Do chamado Campo Majoritário à esquerda do PT, o incômodo era visível.
Petistas disseram à Folha que Berzoini chegou reticente à reunião. Reiterou que não sabia das negociações para a compra do dossiê e não tinha intenção, inicialmente, de deixar o cargo. Num desabafo aos colegas, disse que estava sendo "fritado". A líder do PT no Senado, Ideli Salvatti, chorou, dizendo em discurso emocionado ver o partido definhando desde a saída de José Genoino.
Os que foram contrários à saída de Berzoini argumentaram que a medida não traria nenhum benefício à campanha e apenas daria argumento á oposição de que o PT parece "boteco em decadência, que a cada dia está sob nova direção".
Outro argumento utilizado para o não afastamento do dirigente foi que a medida o tornaria inevitavelmente alvo da Polícia Federal, já que passaria a imagem de culpa.
Durante a entrevista, Berzoini revelou que procurou Bargas e Lorenzetti no início da crise, para buscar explicações: "Infelizmente não obtivemos informações suficientes para ter segurança em relação ao caso".
Garcia elogiou o gesto de Berzoini. Disse que pretende devolver em breve a ele o posto, que considerou um "abacaxi". Depois, explicou: "Não é um abacaxi. É um abacaxi para mim. Não sou uma pessoa que esteja à altura dessas responsabilidades. (...) Entendam a expressão com a carga irônica que dou a pronunciamentos".
O rigor e a rapidez com que o PT agiu na crise do dossiê diferem do escândalo do mensalão. Garcia reconheceu que em 2005 foi aberta uma "ferida" no PT. "E esse episódio [dossiê] reabriu essa ferida e criou as condições para que se tentasse exercer contra o governo e a candidatura do presidente Lula uma nova ofensiva", disse.
Pela primeira vez desde o início da crise do dossiê, a direção do PT manifestou-se publicamente: "Os filiados envolvidos nessa negociação não consultaram a direção do PT, não consultaram a coordenação de campanha e não consultaram os candidatos do partido. Portanto, desrespeitaram as normas básicas de convivência num partido democrático", diz trecho da nota em que são anunciadas as expulsões.


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