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Cobertura de dossiê fez Lula criar TV pública
Projeto foi acelerado depois de avaliação do presidente de que Rede Globo teve atuação parcial na eleição presidencial
Emissora rebateu as acusações de suposta falta de equilíbrio na cobertura da campanha e afirmou ter tido uma atuação isenta
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A cobertura da Rede Globo
sobre o dossiegate na reta final
do primeiro turno da eleição de
2006 foi o fator determinante
para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidisse priorizar no segundo mandato a
criação de uma rede pública de
TV. O projeto sairá do papel
nesta semana por meio de medida provisória. Pesou ainda a
abordagem que a Globo deu à
sua ausência no debate dos
candidatos à Presidência na
primeira fase da eleição.
Segundo a Folha apurou, Lula avalia que a Globo fez cobertura desequilibrada desses dois
episódios. Na época, Lula comentou com ministros que um
governo não poderia ficar "na
mão da Globo", enfrentando o
poder de fogo de uma rede que
domina o mercado.
Então, disse em reunião com
seus principais auxiliares e o
marqueteiro da campanha,
João Santana, que tocaria
adiante a criação da rede pública de TV, projeto que à época
andava em banho-maria.
Procurada pela Folha, a
Central Globo de Comunicação
respondeu ontem: "As boas
normas de jornalismo recomendam tanto a não-publicação de críticas em off [nas quais
as fontes não se identificam]
quanto o comentário sobre críticas em off". Durante a eleição
de 2006, a Globo defendeu ter
praticado uma cobertura apartidária e isenta. Diretores da
TV rebateram críticas de suposta falta de equilíbrio apontadas pelo PT e integrantes do
governo federal.
No caso do dossiegate, disseram que toda a imprensa deu o
destaque jornalístico que mereciam as fotos do R$ 1,7 milhão usados por petistas para
comprar o dossiê antitucanos.
Uma semana antes do primeiro turno da eleição, Lula
faltou ao debate que a Globo
organizou entre os principais
presidenciáveis. Compareceram Geraldo Alckmin (PSDB),
Heloísa Helena (PSOL) e Cristovam Buarque (PDT).
Lula disse a auxiliares que se
sentiu pressionado pela Globo
a comparecer ao debate de um
modo mais forte que o usual.
Ele crê que a sua ausência levou a Globo a retaliá-lo com
uma cobertura mais negativa
do dossiegate.
Na visão de Lula, a repercussão do dossiegate que aparecia
em toda a imprensa dera início
a uma sangria de votos, mas a
cobertura do "Jornal Nacional"
na reta final do primeiro turno
potencializou essa perda de cacife e levou a disputa para uma
segunda fase contra Alckmin.
Quando convidou o jornalista Franklin Martins neste ano
para ministro da Secretaria de
Comunicação Social, Lula disse
que desejava priorizar a criação
de rede pública e tirou essas
atribuições do ministro Luiz
Dulci (Secretaria Geral).
Franklin, ex-Globo, se disse
entusiasmado, mas afirmou
que a idéia morreria se fosse
carimbada como "canal chapa-branca". Desde então, Lula e
Franklin adotaram um discurso de que a rede teria independência em relação ao governo.
Equipe
No formato que constará da
medida provisória, há um conselho curador que terá poder de
derrubar a diretoria executiva
ou um diretor específico por
voto de desconfiança. Essa diretoria será indicada por Lula.
Os conselheiros, também indicados pelo governo, terão mandato de quatro anos.
Para a rede, o Planalto procurou profissionais do mercado
com boa relação não só com o
governo, mas com partidos de
oposição: Tereza Cruvinel
(presidente) e Helena Chagas
(direção de jornalismo).
Também pediu ajuda a um
dos criadores do chamado "padrão Globo de qualidade", José
Bonifácio de Oliveira Sobrinho,
o Boni. Foi ele quem levou a
Lula números sobre custos de
televisão. Explicou que uma
operação anual como a da Globo somaria cerca de R$ 5 bilhões e avaliou que um patamar
para a rede pública começar seria uma estrutura semelhante à
da Rede Bandeirantes (R$ 350
milhões por ano). Essa é a
quantia prevista no Orçamento
de 2008 para a rede pública,
que não prevê publicidade.
Neste ano, a Radiobrás e a TVE,
canais federais, têm orçamento
de R$ 220 milhões.
O governo sabe que a rede dificilmente terá o peso que a
BBC tem no Reino Unido, pois
não competirá com a Globo e
outros canais em termos de audiência. Mas avalia que, se o
projeto der certo, poderá ser
uma espécie de contraponto à
grande mídia, no qual aparecerão com destaque temas que
esses canais não abordariam.
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