São Paulo, Terça-feira, 07 de Dezembro de 1999


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ÍNDIOS
Total pode ser maior, diz Funai
Registrados 10 suicídios de ticunas neste ano

ELVIRA LOBATO
enviada especial ao Alto Solimões

Levantamento parcial feito pela Funai (Fundação Nacional do Índio) registrou, neste ano, dez casos de suicídio entre os índios ticunas, que habitam a região do Alto Solimões, no Amazonas, próximo da fronteira com o Peru e a Colômbia.
A população ticuna no lado brasileiro da floresta amazônia (há ticunas também no Peru e na Colômbia) é de 32 mil índios.
O levantamento da Funai só abrangeu 80% da população: cerca de 25 mil índios. O número real de mortes por suicídio nas tribos, segundo a Funai, pode ser ainda maior.
O suicídio entre ticunas tem sido pouco estudado por antropólogos, que concentraram as atenções nos Kaiowá-Guarani, em Mato Grosso do Sul, que tiveram 308 casos nos últimos 13 anos.
No dia 12 de novembro, quando acompanhava a Polícia Federal na localização de pistas de pouso clandestinas no Alto Solimões, a reportagem da Folha presenciou, na aldeia Nova Itália (dentro da reserva ticuna Vui-Uata-In), o enterro do índio Juvenal Albino, 49, que havia se enforcado no dia anterior. A mulher dele também morreu por suicídio, há dois anos.
A pedido da Folha, o posto da Funai em Tabatinga, que coordena a ação do órgão no Alto Solimões, tentou fazer um levantamento dos suicídios nas demais aldeias, mas só chegou a um resultado parcial.
Segundo o administrador do posto, Walmir Torres, o contato com as aldeias mais afastadas só é feito quando os agentes vão a Tabatinga receber os salários.

Motivos
Dos dez casos constatados pela Funai, oito foram por enforcamento e dois por ingestão de timbó -veneno extraído da raiz de uma planta, que leva à morte por asfixia. Sete dos dez suicidas eram homens, com predominância de jovens.
Baseada no relato dos índios, a Funai aponta como ""motivo aparente" para cinco suicídios brigas com pai, com namoradas e com marido.
No final de julho, houve uma ""festa da moça nova" na aldeia Nova Galiléia (vizinha à de Nova Itália) para comemorar a primeira menstruação de três jovens índias. Ludovico Pereira, 70, era pai de uma delas e dias depois da festa se suicidou tomando timbó.
Segundo os índios, a moça teria fugido do ""curral " (local onde ficam confinadas enquanto a festa está sendo preparada) e mantido relações sexuais. O pai teria se matado por vergonha.

Levantamento
A antropóloga Regina Erthal, pesquisadora do curso de pós-graduação em antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que estudou o suicídio entre os ticunas de 90 a 97, diz que por trás das causas aparentes dos suicídios citadas pelos índios podem estar conflitos entre clãs e até problemas como a depredação ambiental.
O fato é que ainda não se tem explicação exata para os suicídios dos ticunas. Até agora, os antropólogos trabalham com hipóteses, afirma Regina Erthal.
Um dos problemas enfrentados pelos pesquisadores é a falta de precisão dos dados. A Funai não tem estatísticas sistemáticas dos óbitos por suicídio. Os números aparecem só quando há pesquisador interessado na informação.
Regina Erthal fez levantamento de 57 suicídios de ticunas de 90 a 97, mas ela própria adverte que, assim com os da Funai, seus dados são parciais. Os casos estão concentrados entre 93 e 97, sendo que as maiores incidências foram em 93 (13 casos), 96 (12) e 97 (11).
Embora parciais, os dados levantados pela pesquisadora mostram alta incidência de suicídios. Segundo Regina Erthal, os suicídios representaram 16% dos óbitos entre 93 e 95 e 28% entre 94 e 96. As maiores incidências foram nas faixas de 16 aos 18 anos (47,2% dos casos) e dos 19 aos 25 anos (27,3%).


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